Das telecoms à energia, passando pelo crédito à habitação. Tudo o que pode renegociar e poupar
Todos os consumidores têm um poder: o de renegociar os contratos de serviços. É um poder que pode gerar "centenas de euros" de poupanças ao fim de um ano. Saiba onde há margem para cortar.
Muitos portugueses não sabem que é possível tentar renegociar os contratos que assinaram com empresas prestadoras de serviços. Outros até já ouviram falar, mas não sabem por onde começar. Esta quinta-feira assinala-se o Dia Mundial da Poupança, efeméride ideal para recordar a matéria e descobrir algumas dicas que podem gerar boas poupanças e aliviar as despesas familiares.
O exemplo mais flagrante são as telecomunicações, mas não é o único. Também pode tentar renegociar a fatura da energia ou até o seguro do carro. Noutros casos, mudar de prestador também pode gerar uma boa poupança. Certo que nem sempre é uma tarefa fácil, mas também “não é assim tão difícil”, garante Susana Albuquerque, especialista em educação financeira da Associação de Instituições de Crédito Especializado (ASFAC).
Em algumas áreas, “não é descabido pensar em poupanças de centenas de euros”, diz a especialista. Mas, como em qualquer negociação, o resultado depende sempre da posição em que se encontra o negociador, assim como do valor que tem gerado para a empresa com a qual vai negociar. E aqui poderão pesar fatores como há quanto tempo é cliente, ou mais importante ainda, se está ou não sujeito a um período de fidelização.
Renegociar as telecomunicações
Há formas de poupar na fatura das telecoms, desde que esteja fora do período de fidelização, ou caso este esteja a aproximar-se. Nesse caso, a melhor altura para tentar baixar o valor que paga mensalmente é fazê-lo cerca de um mês antes de acabar o vínculo contratual.
Atualmente, no caso dos pacotes, é possível pedir gratuitamente a “fatura com o detalhe mínimo da Anacom”, na qual a operadora contratada é obrigada a indicar o fim da fidelização. Mais: a empresa tem de indicar quanto é obrigada a pagar caso queira pôr fim antecipado ao vínculo. Isto são novidades no setor, que podem ser úteis caso não saiba até quando está “amarrado” ao contrato.
Vamos supor que a fidelização está perto de chegar ao fim. A primeira coisa a fazer é “apalpar” o mercado. Visite o site da sua operadora e os das empresas concorrentes e faça um levantamento dos preços praticados no momento. A maioria das fidelizações duram dois anos, e muita coisa pode mudar nestes 24 meses. Por exemplo, pode haver uma nova operadora com cobertura de fibra na sua zona, o que teoricamente faz baixar o valor do serviço nessa região, como dita a mais básica regra económica da oferta e da procura.
Caso encontre uma oferta mais barata e com serviços em linha com os que tem atualmente, parabéns. Acabou de encontrar a sua moeda de troca. Ligue para a sua operadora e exponha a situação. Junte-lhe alguns ingredientes, como eventuais falhas no serviço que tenha sofrido recentemente, por exemplo. Mas lembre-se: o objetivo é poupar. Tente não ser influenciado a sair do processo a pagar mais por mês por ter contratado uma série de serviços adicionais que, no fim de contas, não são mesmo necessários.
Nenhuma empresa gosta de perder clientes, muito menos os que lhe trazem mais receita. Por isso, quanto mais serviços tiver no seu pacote, em melhor posição fica para negociar. Mas mesmo que não queira avançar para uma negociação, saiba que nunca é tarde demais para fazer uma autoavaliação: passe os serviços que tem a pente fino e veja onde é possível cortar. Por exemplo, aquele hotspot móvel que incluiu no pacote há dois anos pode já não fazer falta numa altura em que há Wi-Fi em cada esquina (e os smartphones já permitem partilhar internet).
Outra dica: muitos portugueses ainda têm uma operadora para o serviço fixo lá de casa (TV, internet e telefone) e uma diferente para os tarifários de cada telemóvel. Alguns pacotes permitem englobar vários números de telefone e poupar nesta fatura ao fim do mês, até porque muitos smartphones são desbloqueados e permitem ter cartões de muitas operadoras. Mas cada caso é um caso. O melhor mesmo é pegar no papel e na caneta e fazer algumas contas.
E se estiver vinculado a um período de fidelização, acabou-se a poupança? Não, porque se não poupar agora, pode vir a conseguir poupar mais tarde. É fácil esquecer quando se abre a janela de oportunidade. Por isso, mal saiba quando termina o vínculo, Susana Albuquerque recomenda “agendar de imediato”, pondo uma “nota na agenda”. Até lá, vá sondando as propostas das outras operadoras.
Renegociar fatura da energia
Seguindo a lógica das telecomunicações, também é recomendável fazer um check up periódico às suas despesas com energia, nomeadamente eletricidade e gás. “Vale a pena em qualquer momento perceber se consegue melhores condições. É um exercício que devemos fazer uma vez por ano”, aconselha a especialista da ASFAC.
Uma vez mais, a primeira coisa a fazer é sondar as empresas concorrentes por ofertas mais vantajosas. E munir-se de bons argumentos. A Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) pode ser uma ajuda. O regulador disponibiliza ao público um conjunto de simuladores com “todas as ofertas do mercado liberalizado em Portugal continental”, tanto para eletricidade como para gás natural e até para a modalidade dual.
Dependendo das condições previstas no seu atual contrato, é provável que possa tentar encetar uma negociação com a sua comercializadora de energia, numa tentativa de obter condições mais vantajosas. “O mercado dos fornecedores de luz está muito competitivo”, recorda Susana Albuquerque. Por isso, nada como ligar para a linha de apoio ao cliente para descobrir que ofertas alternativas existem para a sua situação.
Caso não consiga renegociar o contrato, não desanime. A DECO tem um simulador que lhe permite descobrir o seu perfil de consumo energético. Com base nesse dado, poderá ficar a saber que está a pagar por mais potência contratada do que aquela que necessita. E não se esqueça de que a potência mais baixa, de 3,45 kVA, paga IVA a 6% desde o início deste ano.
Renegociar crédito à habitação
Quem está a pagar o crédito da casa também pode ter espaço para poupanças. E, aqui, entram dois conceitos em jogo: transferência do crédito e spread do banco. Em relação a este último termo, representa a margem de lucro de um banco no negócio do crédito para a compra de casa. A “boa notícia” (para os consumidores, não para os bancos) é que os spreads têm vindo a cair a olhos vistos.
Por isso, alguns clientes podem conseguir poupar dinheiro se tiverem bons argumentos para apresentar à instituição de crédito. Por exemplo, caso seja um cliente de baixo risco de incumprimento. Ou se tiver uma proposta melhor de um banco concorrente.
Muitos portugueses ainda não sabem que podem transferir o crédito à habitação para outro banco. Sim, tem custos. Mas, em plena “guerra” pelo crédito, alguns bancos estão a oferecer-se para pagar as despesas processuais que possam vir a surgir. Uma estratégia de mercado para “roubar” clientes à concorrência, que pode jogar a favor dos devedores. Ora, como aqui explicou o ECO, transferir o crédito da casa pode significar poupanças de centenas de euros.
O sucesso da renegociação depende de quão bons são os argumentos que conseguir apresentar. E como nenhum banco quer créditos em incumprimento, que arriscam entrar para a folha do malparado, o argumento da taxa de esforço também pode ser uma ajuda. Tanto para si como para o banco.
Muitos especialistas de finanças pessoais recomendam que a taxa de esforço — a percentagem do rendimento mensal para pagar a mensalidade do crédito — não devem exceder os 45%. Acima desta percentagem, há um risco acrescido de incumprimento. A outra hipótese, em casos mais severos, é tentar consolidar todos os empréstimos em curso, diluindo a dívida no tempo, pagando um valor mais baixo todos os meses e de uma só vez por mês.
No entanto, no campo do crédito da casa, vale a pena ter atenção. “Dependendo da altura em que foi feito, o spread pode até ter sido muito melhor do que os spreads que estão a ser praticados. Há 15 anos havia spreads de 0,25%”, aponta a especialista em educação financeira da ASFAC. Mas também há casos que clamam por renegociação: “Imagine que quando o crédito foi feito, o spread era 4%, como acontecia no período da crise. Aí faz todo o sentido negociar”, diz Susana Albuquerque. Contas feitas, pode ser “uma diferença enorme”.
Renegociar os seguros
Em relação aos seguros, a especialista garante que muitos portugueses “têm duplicação de coberturas”. Por exemplo, acontece com alguns cartões de crédito com seguros associados. Vale a pena olhar para as apólices para saber se há espaço para “reduzir as coberturas” pagas, dando primazia a eventuais coberturas que possam vir incluídas na anuidade. “Tem de ver sempre as condições concretas do seu contrato. E ver se compensa mudar,” recomenda.
Poderá encontrar maior flexibilidade se negociar cara a cara com um mediador. Mas existem outros truques: se tiver vários seguros, é possível conseguir poupanças agregando-os numa mesma seguradora. Ganha margem que pode ser decisiva no momento de negociar.
No carro ou nos seguros multirriscos, tentar baixar o preço da apólice antes da renovação, renegociar as coberturas incluídas e o valor dessas mesmas coberturas são as três formas mais comuns com as quais pode obter poupanças. Teste cada uma delas.
Não sabe? Pergunte
Neste artigo ficou a conhecer alguns truques e dicas para tentar obter poupança com alguns serviços básicos. Mas não há melhor dica do que conhecer as linhas e entrelinhas do serviço contratado. “Vale sempre a pena ler muito bem o contrato. E, se não perceber, pergunte. Quando for negociar, pergunte tudo o que não sabe”, avisa Susana Albuquerque.
Caso não queira avançar por sua conta, também pode obter ajuda de profissionais nesta tarefa das renegociações: “No nosso país, em todas as Câmaras Municipais existem gabinetes de apoio ao consumidor que também estão equipados com conhecimentos para ajudar as pessoas nas decisões financeiras”, indica a especialista.
Poucos são os limites e o não é uma resposta garantida. Mas, de qualquer forma, não deixe de tentar negociar: “Por princípio, em regra, há espaço para negociar em todos os contratos. Enquanto consumidores, temos sempre força negocial, porque os prestadores de serviços não nos querem perder como clientes”, indica Susana Albuquerque.
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