Tancos, Rui Pinto e Rangel. Casos mediáticos fazem rentrée no palco da Justiça
Com o fim das férias judiciais, os juízes voltam para resolver os casos mais mediáticos da Justiça portuguesa. Desde o Football Leak ao caso de Tancos, tribunais retomam julgamentos.
Com a pandemia Covid-19 e consequente Estado de Emergência a que Portugal esteve sujeito, vários foram os processos acumulados nas secretárias dos juízes. Ainda assim, isso não impediu que os magistrados tirassem as habituais férias, entre 16 de julho e 31 de agosto.
Após umas semanas a “meio gás” devido às férias judiciais, os tribunais regressam em força com vários processos mediáticos nas mãos dos juízes. Desde o caso Football Leaks, no qual Rui Pinto é arguido, passando pelo caso Tancos, Operação Lex ou caso EDP, a justiça portuguesa vai retornar ao banco dos tribunais os arguidos dos processos.
O primeiro a voltar a discussão é o do hacker Rui Pinto, a 4 de setembro, mas ainda neste mês são esperados desenvolvimentos na Operação Lex, que coloca Rui Rangel no banco de arguidos. Também Ricardo Salgado e Amílcar Morais Pires vão conhecer esta semana a sentença do recurso que interpuseram à coima aplicada pelo supervisor por violação de normas de prevenção de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo.
Em novembro, Azeredo Lopes e os restantes arguidos do processo Tancos regressam ao Tribunal de Santarém para serem julgados. Já nos casos BES, EDP e Operação Marquês não é certo o seu regresso, mas a qualquer momento pode haver outro desenlace.
Rui Pinto em julgamento a 4 de setembro
O hacker Rui Pinto, recentemente libertado após ter estado mais de um ano em prisão preventiva e quatro meses em domiciliária, vai ser o primeiro protagonista na rentrée da Justiça portuguesa.
Com julgamento marcado para dia 4 de setembro, o criador do Football Leaks vai defender-se dos 90 crimes de que está acusado: 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por tentativa de extorsão ao fundo de investimento Doyen.
A defesa de Rui Pinto considerou, na contestação apresentada junto do Tribunal Central Criminal de Lisboa, que é “inadmissível” que o hacker esteja a ser acusado por 90 crimes, ao invés de dez que foram identificados no mandato de detenção europeu e no seu posterior alargamento.
Entre as 45 testemunhas arroladas pelo arguido estão a antiga eurodeputada Ana Gomes, o diretor nacional da PJ Luís Neves, o antigo administrador de sistemas da Agência de Segurança Nacional (CIA) dos Estados Unidos Edward Snowden, o ex-ministro Miguel Poiares Maduro, o ex-presidente do Sporting Bruno de Carvalho, o treinador do Benfica Jorge Jesus, e Octávio Machado.
Atualmente Rui Pinto encontra-se em liberdade e está inserido no programa de proteção de testemunhas em local não revelado e sob proteção policial, por questões de segurança.
Operação Lex: acusação para breve
Também de volta ao palco da Justiça está a Operação Lex. A acusação do processo, que coloca do lado dos arguidos o ex-juiz Rui Rangel, a sua mulher Fátima Galante, o antigo presidente do Tribunal da Relação de Lisboa Orlando Nascimento, e o presidente do Benfica Luís Filipe Vieira, deverá sair ainda no mês de setembro.
O envolvimento de Rui Rangel neste processo levou à sua suspensão provisória de funções no Tribunal da Relação de Lisboa, em 2018, e posteriormente à sua demissão, em 2019. Também Fátima Galante foi sancionada pelo Conselho Superior de Magistratura (CSM) com aposentação compulsiva.
Rangel ainda recorreu ao Supremo Tribunal de Justiça da decisão do CSM por violação dos deveres e integridade, retidão e probidade, mas viu o seu recurso ser julgado improcedente.
O processo Operação Lex tem 14 arguidos e investiga suspeitas de corrupção/recebimento indevido de vantagem, branqueamento de capitais, tráfico de influências e fraude fiscal.
Salgado e Morais Pires conhecem sentença
Ainda no decorrer desta semana, Ricardo Salgado e Amílcar Morais Pires, ex-presidente e ex-administrador do BES, devem conhecer a sentença do recurso que interpuseram à coima aplicada pelo supervisor por violação de normas de prevenção de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo.
A sentença do processo em que os arguidos contestaram as coimas de 350.000 e 150.000 euros será lida no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, em Santarém. A defesa de Ricardo Salgado acusou o BdP de ter sido “desleal e desonesto” na forma “como construiu o processo”, tendo a mandatária de Morais Pires pedido ao Tribunal para “fazer justiça”.
Na decisão do BdP, de maio de 2017, Ricardo Salgado, Amílcar Morais Pires, António Souto e o BES foram condenados pela não aplicação de medidas de prevenção de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo nas sucursais e filiais do banco em Angola, Cabo Verde, Miami e Macau, decisão de que apenas os dois primeiros recorreram.
Julgamento do caso Tancos arranca em novembro
O início do julgamento dos 23 arguidos do processo sobre o furto das armas de Tancos está marcado para 2 de novembro. O antigo ministro da Defesa Azeredo Lopes, o ex-diretor da Polícia Judiciária Militar Luís Vieira, vários elementos da PJ, membros da GNR e o alegado grupo responsável pelo furto de Tancos voltam a falar em tribunal e vão responder perante a Justiça no Tribunal Judicial da Comarca de Santarém.
Azeredo Lopes, que se demitiu do cargo político no seguimento do processo, está acusado dos crimes de denegação de Justiça e prevaricação, favorecimento pessoal praticado por funcionário, abuso de poder e denegação de Justiça. Nove dos arguidos são acusados de planear e executar o furto do material militar dos paióis nacionais e os restantes 14, entre os quais Azeredo Lopes, e os dois elementos da PJM, da encenação que esteve na base da recuperação do equipamento.
O caso do furto das armas foi divulgado pelo Exército em 29 de junho de 2017 com a indicação de que ocorrera no dia anterior, tendo a alegada recuperação do material de guerra furtado ocorrido na região da Chamusca, Santarém, em outubro de 2017, numa operação que envolveu a PJM, em colaboração com elementos da GNR de Loulé.
Caso EDP: Interrogatório a Manuel Pinho é incerto
Outro dos casos mediáticos que tem “estrelado” a Justiça portuguesa nos últimos meses é o da EDP. Em julho, o juiz Carlos Alexandre apresentou o despacho de acusação e validou as medidas de coação propostas pelo MP a António Mexia, CEO da EDP, a João Manso Neto, CEO da EDP Renováveis, e a João Conceição, administrador da REN.
O despacho ditou que Mexia e Manso Neto ficassem suspensos das funções que exercem atualmente por oito meses. Entre as medidas de coação está ainda a proibição de contactar, por qualquer meio, com arguidos, e o pagamento de cauções. Enquanto para o presidente da EDP e da EDP Renováveis o valor da caução é de um milhão de euros, para João Conceição o valor é de 500 mil euros.
Mas a dúvida recai sobre Manuel Pinho, ex-ministro da Economia e da Inovação. Arguido também no processo, não se sabe se este irá ou não ser interrogado. Até que haja uma decisão do Tribunal Constitucional, o MP não pode ouvir o depoimento de Manuel Pinho.
O processo das rendas excessivas da EDP está há cerca de oito anos em investigação no DCIAP e tem sete arguidos: António Mexia, João Manso Neto, o ex-ministro Manuel Pinho, o administrador da REN e antigo consultor de Pinho, João Conceição, Pedro Furtado, responsável de regulação na empresa gestora das redes energéticas, a própria EDP, e Artur Trindade.
Caso BES e Operação Marquês sem data de regresso
O caso BES e Operação Marquês, os dois megaprocessos da história de Justiça portuguesa, estão sem data de regresso aos tribunais.
Apesar de em março ter começado o debate instrutório da Operação Marquês, que investiga factos que tiveram lugar entre 2006 e 2015 e coloca entre os 28 arguidos o ex-primeiro-ministro socialista, José Sócrates, a decisão final ainda não tem data.
Segundo a acusação deste processo ficou indiciado que os arguidos que exerciam funções públicas ou equiparadas, tendo em vista a obtenção de vantagens, agiram em violação dos deveres funcionais. Branqueamento de capitais e corrupção são alguns dos 188 crimes em causa.
Agora cabe ao juiz Ivo Rosa decidir o futuro deste processo que se tem arrastado há vários anos na Justiça. No final do debate instrutório, em julho, o magistrado justificou a sua impossibilidade de proferir uma decisão instrutória em dez dias, segundo estipula a lei, ou num prazo razoável, pelo que não irá marcar para já uma data para a leitura da decisão de quem vai ou não a julgamento.
Já no caso BES, que em julho o despacho de acusação viu a luz do dia, também não existe data marcada para a eventual fase de instrução. Com 25 arguidos, 18 pessoas singulares e sete empresas, no processo estão em causa 348 crimes. Entre eles de burla qualificada, branqueamento de capitais, associação criminosa, falsificação de documentos, fraude no comércio internacional e desvio de fundos e corrupção ativa e passiva.
Com início em 2014, o processo do Universo Espírito Santo conta com o ex-presidente do BES, Ricardo Salgado, como arguido, sendo acusado de 65 crimes. Foram várias as razões para imputar a Salgado a responsabilidade ao nível de uma rede organizada de crimes económicos que acabou a resultar na queda e colapso do GES, no verão de 2014.
Entre os arguidos estão ainda José Manuel Espírito Santo, Manuel Fernando Espírito Santo, Alexander Cadosch, líder da Eurofin, Jean-Luc Schneider, ex-administrador da Espírito Santo Financiére, Amílcar Morais Pires, administrador financeiro do BES, e Isabel Almeida, administradora do BES.
O inquérito deste processo visava o apuramento de um conjunto de alegadas perdas sofridas por clientes das unidades bancárias Espírito Santo.
(Notícia atualizada às 10h47)
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