Greves desconfinaram, mas ainda estão abaixo dos níveis pré-pandémicos
O número de pré-avisos de greve quase duplicou, em junho face ao período homólogo, tendo ficado, ainda assim, abaixo do valor registado no período homólogo de 2019.
Desde que o país iniciou, em meados de março, o processo de desconfinamento progressivo que o número de pré-avisos de greve não tem parado de crescer. Só em junho foram entregues 91 avisos prévios, quase o dobro do que tinha sido registado há um ano. O número de pré-avisos está, ainda assim, abaixo dos níveis pré-pandémicos, mas a CGTP avisa que o resto do ano também será marcado por paralisações. “Os trabalhadores precisam de respostas”, salienta a central sindical.
O ano arrancou com um agravamento da crise pandémica e das restrições adotadas em resposta, o que ditou que os primeiros meses de 2021 acabassem por ficar marcados por um recuo significativo, tanto em cadeia, como em termos homólogos, dos pré-avisos de greve comunicados. Em dezembro, por exemplo, deram entrada 166 avisos prévios, enquanto em janeiro foram comunicados somente 36, número que ficou também abaixo dos 82 pré-avisos registados no mesmo mês de 2020.
Fevereiro foi sinónimo de um número ainda menor de paralisações, uma vez que o país continuava, então, em confinamento e com duras restrições à mobilidade e à atividade económica. Era, nessa altura, obrigatória, por exemplo, a adoção do teletrabalho, o que também ajudou a explicar o menor recurso à greve, nesse período, conforme já tinha indicado ao ECO fonte da CGTP.
A evolução da pandemia levou, contudo, o Governo a aliviar essas restrições e a iniciar, em meados de março, um plano de desconfinamento a “conta-gotas”, o que acabou por dar algum “gás” ao recurso à paralisação como meio de luta dos trabalhadores. “Naturalmente que [a evolução dos pré-avisos de greve] também tem a ver com o retomar de alguma naturalidade“, explica Ana Pires, da Comissão Executiva da CGTP, ao ECO.
Fonte: DGERT
Em março, o número de pré-avisos de greve subiu, assim, para 36 (mais cinco do que em fevereiro) e, em abril, cresceu para 43. O verdadeiro salto deu-se em maio, altura em que foram comunicados 71 pré-avisos. Isto num mês marcado pela saída do país do estado de emergência, pela comemoração do Dia do Trabalhador e pelo aviso deixado pela secretária-geral da CGTP, Isabel Camarinha, de que estavam em desenvolvimento muitas greves e outras ações de luta tanto na Administração Pública (onde se verificou uma paralisação a 20 desse mês), como no privado.
De acordo com os dados da DGERT, junho superou a marca de maio, confirmando a trajetória ascendente dos avisos prévios de greve. Nesse mês, deram entrada 91 pré-avisos, dos quais 81 no privado e dez no setor empresarial do Estado. Esse foi, de resto, o número mais elevado de avisos prévios comunicados nos meses de 2021 para os quais já há dados disponíveis. Aliás, face ao período homólogo de 2020, houve um crescimento de quase 94%. Ainda assim, este valor é inferior ao registado no mesmo mês de 2019, ou seja, as paralisações continuam abaixo dos níveis pré-pandémicos.
As estatísticas disponíveis deixam perceber, por outro lado, que metade dos pré-avisos de greve que deram entrada em junho foram relativos aos transportes e armazenagem, sendo, portanto, importante lembrar que o mês ficou marcado por várias paralisações dos trabalhadores da Infraestruturas de Portugal (IP), da Comboios de Portugal (CP) e também da Transportes Sul do Tejo.
Transportes e armazenagem destacam-se
Logo a 2 de junho, os trabalhadores da IP iniciaram uma greve em reivindicação pelo aumento dos salários, contratação de trabalhadores, cumprimento integral do clausulado no acordo coletivo de trabalho, atualização do valor do subsídio de refeição, integração do abono de irregularidade de horário com conceito de retribuição e a atribuição de concessões de viagem no operador de transportes CP a todos os trabalhadores da IP e participadas.
Os mesmos trabalhadores viriam a avançar com mais dois dias de greve (um deles já em julho), em função da ausência de respostas por parte do Governo, segundo explicaram, na ocasião, os sindicatos.
Em paralelo, os trabalhadores das bilheteiras e revisores da CP cumpriram uma greve nacional de três dias, também no início de junho, em protesto contra a proposta de regulamento de carreiras e reclamando aumentos salariais e o cumprimento do acordo de empresa. O Sindicato Ferroviário da Revisão Comercial Itinerante apontava, então, a greve nacional como a “última forma de luta” face à “recusa de diálogo e a inoperância, há vários meses, na resolução dos problemas dos trabalhadores por parte do Conselho de Administração da CP”.
E também em junho os trabalhadores dos TST – Transportes Sul do Tejo (que servem a Península de Setúbal) decidiram marcar dois dias de greve para exigir uma atualização salarial. “Os trabalhadores tinham suspendido qualquer reivindicação devido à pandemia de Covid-19 até 20 de maio, dia em que os trabalhadores fizeram um plenário e decidiram apresentar uma proposta à empresa de atualização salarial de 50 euros para o salário dos motoristas. Demos 15 dias à empresa para responder ou entregar uma contraproposta, mas até ao momento isso não aconteceu“, explicava, na altura, o recurso à greve João Saúde, da Federação dos Sindicatos de Transportes e Comunicações.
De modo geral, Ana Pires, da CGTP, salienta que “a questão dos salários tem sido central”. A sindicalista garante que a luta “nunca esteve adormecida”, mas houve um entendimento dos trabalhadores em relação à situação complexa pela qual o país atravessava, daí o recuo das greves em certos momentos. Agora que a normalidade está gradualmente a regressar, há “outro ânimo” para os protestos, explica a mesma fonte, salientando que aos problemas estruturais enfrentados pelos trabalhadores veio juntar-se agora um “conjunto de aproveitamentos” por parte dos empregadores proporcionados pela pandemia.
Por isso, Ana Pires crê que os próximos meses continuarão a ser marcados por greves e outras formas de luta. “Os trabalhadores precisam de respostas. Não havendo essas respostas, é natural que haja luta“, avisa a sindicalista.
Os dados de julho ainda não são conhecidos, mas já é possível indicar que este também foi um mês marcado por várias paralisações, nomeadamente dos trabalhadores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, da Groundforce, da Infraestruturas de Portugal e da Altice. E para agosto também já estão marcadas novas greves, nomeadamente na banca, na ferrovia e na Superbock.
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