Possibilidade de estagflação é “remota”, diz Vítor Constâncio
Antigo vice-presidente do BCE diz que as possibilidades de um cenário de alta inflação e recessão na Zona Euro "são remotas", por enquanto. Vai depender em grande medida do embargo à energia russa.
A guerra na Ucrânia colocou a Zona Euro sob a ameaça de um cenário perigoso de alta inflação e recessão económica, conforme já assinalaram vários responsáveis, incluindo Mário Centeno. Porém, o antigo vice-presidente do Banco Central Europeu e ex-governador do Banco de Portugal, Vítor Constâncio, considera que a possibilidade de estagflação é “por enquanto remota”, enquanto vê Portugal a ser menos atingido pelo conflito dada a menor dependência comercial com a Rússia.
“A possibilidade de uma situação de estagflação, entendida como a simultaneidade de uma recessão e de inflação mais alta, é por enquanto remota no que respeita a uma recessão”, afirma Vítor Constâncio em declarações por escrito ao ECO.
Constâncio explica que o choque nos preços da energia tem um efeito duplo de aumentar a inflação interna e de reduzir o poder de compra das famílias, o que resultará numa “quebra do crescimento económico”. Ainda assim, mesmo prevendo um “menor crescimento económico na área do euro em cerca de menos 1,5 pontos percentuais”, o economista que deixou o BCE há quatro anos adianta que a região manteria uma “progressão da atividade económica de cerca de 2% a 2,5%”, escapando ao cenário de recessão.
Quanto à inflação, com os preços do petróleo e do gás natural, subirá acima de 6%, de acordo com Vítor Constâncio. Apesar da alta dos preços da energia, ainda estamos longe do choque energético de 1973 e 1974, quando a cotação do barril de crude quadruplicou e a economia mundial entrou em recessão no ano seguinte. “O aumento dos preços energéticos desta vez é por enquanto menor”, assinala.
"A possibilidade de uma situação de estagflação, entendida como a simultaneidade de uma recessão e de inflação mais alta, é por enquanto remota no que respeita a uma recessão.”
O preço do barril de Brent atingiu os 139 dólares esta segunda-feira, o valor mais alto desde 2008, e o gás natural superou os 300 dólares no mercado holandês, com a possibilidade de a Europa e os EUA proibirem compras de energia à Rússia. Embora as sanções a Moscovo por causa da invasão militar na Ucrânia ainda não se apliquem ao setor da energia, há já um boicote internacional às matérias-primas e produtos energéticos russos, que está a impulsionar os preços.
O Goldman Sachs já apontou para uma escalada do ouro negro até aos 185 dólares, uma evolução que seria motivada pela dificuldade da Rússia em exportar o seu petróleo. “Cerca de dois terços da oferta de petróleo russo a não encontrar atualmente compradores”, contextualiza Constâncio.
“Com estas previsões, longínquas dos aumentos de 1974, apenas a existência adicional de reduções significativas de abastecimento de petróleo e gás natural à Europa, poderia colocar a previsão de uma recessão na Europa no campo das possibilidades”, observa o antigo vice-presidente do BCE.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) já avisou que a guerra vai ter “um impacto severo” na economia global e que, apesar da incerteza, as consequências económicas “já são muito sérias”. A Comissão Europeia assegurou que a retoma económica vai continuar, mas vai travar por causa do conflito.
Portugal menos afetado pela guerra
Se o conflito militar na Ucrânia, que vai já no 13.º dia e sem fim à vista, vai afetar toda a economia europeia, juntamente com as duras sanções Rússia, Portugal será menos afetado, de acordo com Vítor Constâncio. “Os impactos serão sobretudo nos domínios do menor crescimento económico e maior inflação, mas ambos numa escala menor do que a média europeia”, diz.
Constâncio explica que o comércio de Portugal com a Rússia e a Ucrânia tem um peso reduzido no produto nacional e que o país tem uma dependência menor do gás natural russo do que o resto da Zona Euro, conferindo maior grau de proteção à economia nacional.
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