Carlos Silva sai da UGT sob críticas e com menos 43 mil sindicalizados
UGT perdeu 43 mil filiados durante liderança de Carlos Silva, que fundador Torres Couto classifica como “um desastre”. Sucessor insiste em aumentos intercalares e está preparado para "ir para a rua".
Carlos Silva prepara-se para abandonar este fim de semana a liderança da UGT, cedendo o lugar a Mário Mourão, presidente do Sindicato dos Trabalhadores do Setor Financeiro de Portugal (SBN), que será eleito durante o 14.º congresso, que arrancou este sábado em Santarém, depois de sucessivos adiamentos por causa da pandemia.
O relatório que o secretariado nacional leva à reunião, citado pelo Público, dá conta de 435 mil trabalhadores filiados nos sindicatos da central, o que significa um recuo de 43 mil em comparação com a situação que “herdou” em 2013, quando assumiu o cargo e ambicionava até ultrapassar a CGTP — que em 2020 reportou 556.363 sindicalizados.
O percurso de nove anos de Carlos Silva é criticado pelo fundador, José Manuel Torres Couto, que liderou a central sindical desde a criação, em 1978, até 1995. Numa entrevista ao Expresso em que diz que o argumento da espiral inflacionista, usado pelo Governo para travar o aumento dos salários, “não tem pés nem cabeça”, e classifica a liderança de Carlos Silva como “um desastre” e desabada que “a sua saída é eugenismo sindical”.
“Se, quando andei nas lutas terríveis de 1974 a 1976 para fundar a UGT, imaginasse que, um dia uma pessoa assim chegava à liderança, não tinha fundado a UGT. (…) Não me posso esquecer que antes de assumir a liderança da UGT, Carlos Silva foi pedir uma reunião ao Ricardo Salgado para saber se estava autorizado a ser líder. (…) E termina o seu mandato como testemunha de defesa de Ricardo Salgado, neste processo monstruoso do BES. Isto não é compatível com um sindicalista. E tem custos brutais para a afirmação de uma central sindical”, critica.
Já visando o próximo líder, Mário Mourão, Torres Couto afirma ao semanário que “na atual conjuntura, depois de uma crise sanitária e agora com a guerra e todas as suas consequências económicas, uma central sindical tem de ter uma posição agressiva”. “Não pode ter um papel pacífico, de braços caídos. Um Governo de maioria absoluta exige dos parceiros sociais e, nomeadamente, da UGT respostas e proposições que os partidos na Assembleia da República não conseguirão levar avante”, acrescenta.
UGT não pode ter um papel pacífico, de braços caídos. Um Governo de maioria absoluta exige dos parceiros sociais respostas e proposições que os partidos na Assembleia da República não conseguirão levar avante.
Esta manhã, o secretário-geral cessante surpreendeu os quase 800 congressistas e a centena de convidados, ao transformar o discurso de abertura, em que era esperada uma intervenção político-sindical, numa homenagem à revolução de 25 de Abril de 1974 e ao capitão Salgueiro Maia, em Santarém. E que, segundo a Lusa, terminou com os congressistas de pé, empunhando cravos vermelhos ao som da canção Grândola Vila Morena, de Zeca Afonso.
Na Resolução Programática, que define as linhas de ação da central sindical para os próximos quatro anos, a UGT refere que as apostas passam pelo crescimento económico, criação de emprego, aumentos salariais, melhor qualificação dos trabalhadores, adoção do princípio de trabalho e de salários dignos, ou o aumento da competitividade, equidade social e económica, ambicionando ainda o reforço da concertação social e da negociação coletiva.
Apesar de essa possibilidade já ter sido afastada esta semana pelo Governo, pela voz da ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, o próximo líder da UGT insiste em aumentos intercalares no Estado que se aproximem, pelo menos, da inflação efetivamente registada no ano passado — mais próxima de 1,3% do que dos 0,9% que serviram de base às atualizações salariais.
Em declarações à Antena 1 e Jornal de Negócios, Mário Mourão reclama que “o Estado tem de dar o exemplo para poder depois exigir [o mesmo] às empresas” e advertiu que, embora queira que a UGT continue a ser uma central de diálogo, os sindicatos estão preparados para “ir para a rua”.
Presente em Santarém, Francisco Assis, que o PS quer reconduzir na presidência do Conselho Económico e Social (CES), considerou positiva a capacidade que o PS e o PSD têm para se entender ao nível sindical, através das respetivas tendências organizadas na UGT e representadas nos seus órgãos sociais. Ainda assim, defendeu a necessidade de se “projetar esse entendimento para novos planos” de colaboração.
Governo pede “movimento sindical forte e dinâmico”
Já a ministra do Trabalho deixou neste congresso um “caderno de encargos” ao futuro secretário-geral da UGT, defendendo a concertação e a negociação coletiva como “pedra basilar” do crescimento inclusivo e pedindo-lhe para trazer “novas dimensões” que são atualmente decisivas no mercado de trabalho.
Em particular, referiu Ana Mendes Godinho, em declarações reproduzidas pela Lusa, as novas formas e novas relações de trabalho, desafios que, disse, “necessitam de um movimento sindical forte, dinâmico, em permanente reinvenção, e que seja também fator de inovação e de coesão social”.
A governante quer um acordo de médio prazo em sede de concertação social, que garanta “uma melhor redistribuição da riqueza, a valorização dos salários e o aumento da produtividade”. “Queremos que o diálogo social seja mesmo a base e a chave para este crescimento, que só acontece se for inclusivo”, frisou.
(Notícia atualizada às 15h45 com declarações da ministra)
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