Instalações de onde a TAP quer sair têm hipotecas de 92,5 milhões
Instalações da companhia aérea junto ao aeroporto foram avaliadas em 146 milhões pela Parpública em 2014. A TAP contabiliza agora um valor inferior. Edifícios e terrenos têm duas hipotecas.
A administração da TAP pretende deixar as instalações ao lado do aeroporto de Lisboa, devido à degradação dos edifícios, mas a mudança também abre a porta a um valioso negócio imobiliário. As hipotecas de 92,5 milhões de euros podem baralhar as contas.
A intenção foi comunicada à Comissão de Trabalhadores (CT) na semana passada e confirmada pela administração, que justificou a possibilidade de mudança de instalações com “o levantamento de custos para a manutenção indispensável devido à deterioração dos atuais edifícios que a empresa ocupa junto ao aeroporto Humberto Delgado e que se revelam muito elevados face à antiguidade das instalações”. À Comissão de Trabalhadores, a CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener, quantificou as obras em 40 a 50 milhões, sendo por isso “mais económico arrendar um edifício” noutro local.
Além de poupar nos encargos com a manutenção, a transportadora aérea poderá ter um encaixe substancial com a venda dos terrenos e edifícios do chamado “Reduto TAP”. De acordo com o relatório e contas do primeiro semestre de 2014 da Parpública, então a única acionista, o valor líquido dos terrenos e edifícios cifrava-se em 146 milhões de euros. Ainda que não se esgotem naquela área, os ativos imobiliários cingem-se “essencialmente” a ela, conforme é referido pela empresa que gere as participações do Estado.
Num comunicado divulgado esta quarta-feira, o Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos (SITAVA) recorda aquele número e acrescenta que ele “dá bem a dimensão do valor que a especulação imobiliária estará hoje disposta a pagar por estes 23 hectares de terreno”. E acrescenta: “talvez multiplique por dez esse valor”. Acrescentando o zero, seriam 1.146 milhões.
O último relatório e contas da TAP indica um valor líquido de 105,74 milhões no final de dezembro de 2021, repartido entre 41,13 milhões para os terrenos e 64,61 milhões para os edifícios. Uma soma inferior à de 2014, devido aos 95,33 milhões contabilizados em depreciações e perdas por imparidade nos edifícios desde a aquisição, inscrita com a soma de 159,94 milhões.
Os 29 edifícios e terrenos circundantes, que ocupam uma área de 22,45 hectares (ou 224,5 mil metros quadrados) servem de garantia a dois empréstimos. “Para garantia do pagamento dos montantes devidos ao abrigo de um contrato de mútuo, com instituição nacional, no montante de 75 milhões de euros, foi constituída uma hipoteca sobre um prédio urbano da TAP S.A., composto por vinte e nove edifícios para escritório, oficinas de material de construção e outros, sito no Aeroporto de Lisboa”, pode ler-se no relatório e contas. Em fevereiro de 2020, um mês antes da pandemia chegar a Portugal, foi efetuada uma segunda hipoteca de 25 milhões. Segundo a TAP, no final de dezembro o montante relativo aos dois contratos mútuos ascendia a aproximadamente 92,5 milhões de Euros.
A TAP precisa de mais capital para, por exemplo, tapar o escandaloso buraco do negócio do Brasil. E onde parece querer ir buscá-lo é exatamente com a venda dos terrenos que são património da companhia.
A TAP mudou-se para as atuais instalações em junho de 1971 (há uma reportagem da RTP sobre a inauguração), em regime de licenciamento. Só em 1989 os terrenos e edifícios passaram a fazer parte do património da empresa, através de um Decreto-lei aprovado pelo Governo de Cavaco Silva, que os desafetou do domínio público aeroportuário. Na altura, a integração destes ativos tangíveis nas contas da TAP ajudou a robustecer o balanço. “O valor a atribuir aos terrenos que serão integrados no património da TAP será traduzido em correspondente aumento do capital estatutário”, lê-se no diploma.
Para o SITAVA, a mudança de instalações tem agora o mesmo propósito. “A TAP precisa de mais capital para, por exemplo, tapar o escandaloso buraco do negócio do Brasil. E onde parece querer ir buscá-lo é exatamente com a venda dos terrenos que são património da companhia. Vão-se os anéis e os dedos também”, afirma o sindicato no comunicado.
A mudança de instalações, que a acontecer não abrangerá os hangares e áreas ocupadas pela manutenção das aeronaves, é contestada pela Comissão de Trabalhadores e sindicatos. Uma das principais preocupações é o estacionamento, já que os trabalhadores recorrem ao espaço que existe no reduto. Outras são o refeitório e a creche.
O SITAVA recorda que quando em 1989 o Governo de então integrou as instalações no património da TAP, foi considerado uma grande e importante vitória dos trabalhadores, que há muito o reivindicavam. “Jamais abdicaremos dos poucos direitos que temos, de entre eles do direito ao infantário e ao refeitório, por exemplo”, afirma o sindicato, que escreve mesmo ser “falso que os edifícios estejam em ruínas”. O SITAVA pediu já mesmo uma reunião com o Ministério das Infraestruturas e Habitação.
Não é a primeira vez que a venda dos terrenos e edifícios se coloca. O Dinheiro Vivo noticiou em novembro de 2015 que os então novos acionistas da TAP, David Neeleman e Humberto Pedrosa, estavam a preparar a alienação, de forma a reduzir o passivo e racionalizar os ativos do grupo. A Vinci, proprietária da ANA, era apontada como uma das interessadas.
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