As criptomoedas são atualmente uma das formas de realizar transações financeiras em crescimento por todo o mundo. Mas o que acontece às moedas digitais quando o seu detentor morre?
A moeda digital foi uma das inovações tecnológicas que surgiram com o novo milénio e a sua realidade ainda não é bem compreendida por todos.
As criptomoedas são um dos tipos de moedas digitais e são utilizadas numa rede descentralizada, com o intuito de realizar transações financeiras. Apesar de não serem moedas materiais, possuem várias caraterísticas em comum com o dinheiro tradicional, pois são usadas como reserva de valor ou meio de troca.
Estas moedas digitais ainda não são reguladas no nosso ordenamento jurídico e o Banco de Portugal (BdP) não prevê regular nos próximos tempos, admitindo ser competência europeia.
Tiago Correia Moreira, associado coordenador da área de bancário & financeiro da Vieira de Almeida (VdA), partilha da posição do BdP. “Há um papel que nos parece que o Banco de Portugal tem vindo a assumir, bem como, de resto, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) que é o de lançar alguns alertas e prestar alguns esclarecimentos acerca dessas realidades pela circunstância de existir alguma confusão de conceitos sobre a mesma realidade”, nota.
Para João Lima da Silva, associado da Morais Leitão, tanto o BdP como a CMVM “não devem afastar a possibilidade de regulação das criptomoedas ao nível nacional, considerando a sua necessidade ou utilidade para o mercado português”.
Já relativamente ao papel da União Europeia, o associado da VdA referiu que a abordagem tem sido a de “não assumir um papel pró-ativo na regulação destas matérias numa lógica de neutralidade tecnológica”.
Os rendimentos provenientes das criptomoedas apenas serão tributados se forem “auferidos no âmbito de uma atividade da categoria B, com relação às pessoas singulares e em sede de IRS”, explica João Lima da Silva. O advogado relembra ainda que a situação pode sofrer alterações a “médio-prazo” devido a mudança de posição da Autoridade Tributária ou até mesmo da legislação.
Sem regulação e sem perspetivas de discussão desta matéria, Tiago Correia Moreira afirmar não ser necessário regular este tema neste momento, “porque há uma profusão de conceitos e de matérias que não devem ser todos tratados da mesma forma e que, a serem regulados, deixarão sempre aspetos específicos por disciplinar”.
Mas para Mariana Albuquerque, associada da Morais Leitão, a regulação é uma “questão de oportunidade”. Para a advogada é necessário que o mercado evolua para que a matéria seja regulada. Ainda assim, nota que “a não regulação das criptomoedas cria incertezas para quem quer desenvolver este tipo de ativos, o que pode ser contraproducente, e, ao mesmo tempo, desprotege os utilizadores e investidores em Portugal”.
O que acontece às criptomoedas?
Mas o que acontece aos ativos digitais após a morte do seu detentor? Será que ficarão perdidas no mundo digital?
As criptomoedas podem ser transmitidas uma vez que são património de uma pessoa singular, mas essa transmissão nem sempre é acessível.
“Na prática, não será fácil assegurar que isso acontece porque as criptomoedas e a sua titularidade são registadas em plataformas eletrónicas que requerem um ou mais elementos de acesso únicos e pessoais e essas plataformas estão, em muitos casos, registadas no estrangeiro sem outra conexão ao território português”, explica João Lima da Silva.
As criptomoedas e a sua titularidade são registadas em plataformas eletrónicas que requerem um ou mais elementos de acesso únicos e pessoais e essas plataformas estão, em muitos casos, registadas no estrangeiro sem outra conexão ao território português.
Mas caso os sucessores consigam contactar a entidade que gere a plataforma, os ativos do cliente devem ser transmitidos para os sucessores, mediante a apresentação da “habilitação de herdeiros e demais documentação relevante”.
E caso o detentor queira deixar as moedas digitais em testamento, será que é possível? Mariana Albuquerque afirma que sim, desde que as criptomoedas configurem “um direito com valor pecuniário”, porque não deixam de ser um ativo.
Mas o problema está na complexidade da configuração das moedas digitais e da incerteza que se está perante um direito ou não e se tem valor. “As condições das criptomoedas podem determinar os termos ao abrigo dos quais estas podem ser transmitidas, podendo no limite essa transmissão ser restringida”, conclui a advogada da Morais Leitão.
Principais desafios do legislador português
A matéria das moedas digitais ainda é muito embrionária e ainda muitos problemas e soluções vão surgir.
“Aquele que vemos como sendo o maior desafio do legislador português é o de ser capaz de acompanhar as tendências mundiais sobre estas matérias, assegurando que a jurisdição portuguesa se mantém atrativa do ponto de vista dos investidores e das entidades que operam neste segmento”, assegura Tiago Correia Moreira.
Para João Lima da Silva, os principais desafios assentam na “necessidade de garantir o equilíbrio certo entre a não intervenção e a necessidade de regulação, por forma a assegurar que Portugal tire partido deste mercado e proporciona um ambiente atrativo para a emissão, detenção e/ou negociação de criptomoedas”
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As criptomoedas podem ser herdadas?
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