Bolt lança trotinetas elétricas em Portugal. Para já, só no Algarve

A Bolt vai lançar esta terça-feira um serviço de trotinetas elétricas em Portugal, para já, apenas no Algarve. É um "teste", mas a ambição é chegar a mais cidades portuguesas.

Depois dos carros, também as trotinetas. A Bolt seguiu as pisadas da Uber e também vai partilhar trotinetas elétricas para além das boleias, um negócio que tem ganhado expressão em Portugal no último ano. Estes veículos da Bolt vão ser colocados no Algarve, uma primeira fase de um plano mais alargado para expandir o negócio a mais cidades portuguesas.

A intenção já tinha sido revelada numa entrevista ao ECO pelo fundador da Bolt, Markus Vilig. Um sinal de que as ambições da plataforma estoniana para o país serão de expansão para novas áreas, além do transporte privado: “Só faz sentido ter trotinetas elétricas se fizerem parte de uma plataforma maior. Ou seja, ter uma aplicação com trotinetas, ou bicicletas, ou boleias, tudo no mesmo sítio”, revelou, em novembro.

O serviço de trotinetas elétricas da Bolt no Algarve começa a funcionar esta terça-feira, 4 de fevereiro, com um custo de desbloqueio de um euro, mais 15 cêntimos por minuto de utilização. É ainda aplicada uma “tarifa máxima” de 19 euros por dia.

Depois do Algarve, seguir-se-ão outras cidades em Portugal, admite ao ECO o diretor-geral da Bolt Portugal, David Ferreira da Silva: “Assim que tivermos a operação totalmente estabelecida no Algarve, o nosso objetivo é expandir o serviço para outras cidades do país”, admite. “O lançamento das trotinetas elétricas em Portugal sempre foi um dos nossos objetivos. É um serviço muito importante para as cidades porque é mais flexível, económico e sustentável”, garante.

A escolha do Algarve surge em contraciclo com as opções que têm sido tomadas por outros players que exploram a mesma atividade. Em 2019, mais de uma dezena de empresas dispuseram trotinetas elétricas na cidade de Lisboa, sendo que uma parte significativa delas acabou por abandonar o mercado.

“Escolhemos a região do Algarve para a apresentação das trotinetas por ser a zona do país com um clima mais ameno nesta altura do ano e, por isso, mais indicado para andar de trotineta. Além disso, o facto de ser uma cidade com baixa densidade populacional e ter um município envolvido e aberto a receber-nos, são fatores importantes para testarmos o serviço no país”, justifica David Ferreira da Silva. Ao mesmo tempo, a empresa “escapa” a um mercado saturado, como é o de Lisboa.

É, por isso, um “teste” que a empresa quer fazer no Algarve, sendo ponto assente que o foco poderá não ser o de fazer dinheiro, pelo menos enquanto as viagens nos carros da Bolt permitam à empresa gerar receitas. “Não significa que tenhamos de ser lucrativos em todas as viagens que realizamos. Temos serviços em que podemos reduzir consideravelmente os preços, como é o caso das trotinetes, e outros, como as viagens de carro, que são lucrativos para nós e asseguram o negócio”, diz o diretor-geral.

Esta posição segue em linha com a de Markus Vilig, que disse ao ECO, na entrevista em novembro, que a empresa pode apostar neste serviço sem que o mesmo se pague a si próprio: “Não creio que tenhamos de ganhar dinheiro. (…) O que vemos é que existem vários serviços que podemos oferecer gratuitamente, sem termos de gerar lucros, e outros, como as boleias, a serem lucrativos para nós enquanto negócio”, afirmou o empreendedor estoniano, por ocasião do Web Summit.

Certo é que o setor tem assistido a algumas dinâmicas. Os suecos da Voi saíram de Portugal em 2019, pouco depois de terem entrado, enquanto a Lime desistiu da cidade de Coimbra, poucos meses depois de aí ter lançado o serviço. Mais recentemente, a Bird chegou a um acordo para a compra da Circ, depois de ter suspendido o negócio em Portugal, onde a Circ também está presente.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Portugueses gastam 200 milhões de euros em plataformas como a Uber. Contribuição deu 2,3 milhões ao Estado

Uber, Bolt, Kapten e Cabify geraram um volume de negócios de, pelo menos, 200 milhões de euros em 2019. O Estado, através da contribuição definida na lei, arrecadou 2,3 milhões, menos que o previsto.

Uber, Bolt ou Kapten têm conquistado muitos portugueses desde que chegaram às estradas portuguesas. Fazem, diariamente, centenas ou mesmo milhares de viagens, tendo, desde que a atividade foi legalizada, gerado mais de 200 milhões de euros em receitas, com a empresa norte-americana fundada por Travis Kalanick sido responsável pela maior “fatia” do negócio. O Estado, com a contribuição cobrada ao setor, encaixou 2,3 milhões de euros.

203,7 milhões de euros, mais concretamente, foi o valor gasto pelos portugueses neste serviço, de acordo com cálculos realizados pelo ECO com base nos valores das contribuições feitas pelas plataformas de Transporte de Passageiros em Viaturas Ligeiras Descaracterizados (TVDE) divulgados pela Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT), em resposta a questões colocadas pelo PCP.

Os dados datados de 3 de janeiro de 2020 referem-se ao ano de 2019, apesar de a lei só ter entrado em vigor para os motoristas em março — para as plataformas, começou a aplicar-se a 1 de janeiro do ano passado. Mas poderão mesmo ser superiores quando estiver apurado todo o valor arrecadado com a contribuição em dezembro: o ECO sabe que as plataformas podem liquidar esta contribuição até ao fim do mês seguinte, neste caso, até 31 deste mês de janeiro.

A maior parte deste “bolo” foi gerada pela Uber. Segundo os cálculos do ECO, o valor gasto em viagens na Uber foi de, pelo menos, 154,7 milhões de euros, com os motoristas, que ficam com 75% do valor das viagens, a “arrecadarem” cerca de 116 milhões.

A empresa norte-americana conseguiu, ainda assim, gerar para si 38,67 milhões de euros — a comissão cobrada aos motoristas é de 25% do valor total das viagens –, tendo entregado 5%, como prevê a lei, ao Estado. Ou seja, pagou 1,9 milhões de euros, por autoliquidação mensal, de contribuição de regulação e supervisão que é cobrada pela AMT.

Estes 38,67 milhões representam o valor bruto de receitas da Uber com o negócio do transporte de passageiros, cobrado em comissões, mas o valor não inclui as receitas com outros negócios, como a entrega de refeições da Uber Eats. Também não é líquido de eventuais impostos, como o IVA ou impostos sobre o rendimento.

As contas das plataformas de transporte

Dados de 2019 apurados a 3 de janeiro de 2020, com base na informação da AMT e em cálculos do ECO. A rubrica “Contribuição” diz respeito aos dados oficiais dos montantes entregues à AMT. “Comissões” diz respeito ao montante bruto faturado pelas plataformas e calculado pelo ECO. “Receitas totais” é o valor total das viagens nestas plataformas e inclui as receitas dos motoristas, calculado pelo ECO. A Uber cobra uma comissão de 25%, a Bolt de 15%, a Kapten de 15% e a Cabify cobrava 20%. Não foi possível apurar a comissão cobrada pela It’s My Ride. Em alguns casos, pode faltar o mês de dezembro, que poderá ser liquidado até 31 de janeiro de 2020.

Uber lidera nas receitas, seguida pela Bolt

As diversas plataformas de transporte a operar em Portugal cobram comissões diferentes aos motoristas e têm mecanismos distintos de faturação, pelo que não é possível apurar as quotas de mercado exatas de cada uma das plataformas. Ainda assim, é possível verificar que a Uber lidera nas receitas, seguida da Bolt.

Em 2019, segundo valores apurados, a plataforma da Bolt gerou um volume de negócios de, pelo menos, 37 milhões de euros com as viagens solicitadas pelos utilizadores em Portugal. Através da comissão de 15% cobrada aos motoristas, a empresa de origem estoniana conseguiu faturar 5,56 milhões de euros aos condutores, sem contar com impostos. Deste montante, entregou quase 277,8 mil euros ao Estado através da contribuição, que é cobrada pela AMT.

A terceira a faturar mais foi a Kapten. No ano em análise, a empresa francesa gerou um volume de negócios com o transporte de passageiros na ordem dos dez milhões de euros. “Ficou” com 1,5 milhões de euros brutos através de uma comissão de 15% e entregou ao Estado 75,1 mil euros.

No fundo da tabela ficou a Cabify, que saiu de Portugal no final de novembro, após vários meses de dificuldades em atrair motoristas e clientes. Os dados refletem o menor volume de negócios, com a extinta Cabify Portugal a gerar viagens no valor total de 1,99 milhões de euros e a gerar 398,8 mil euros em receitas brutas com uma comissão de 20%, um valor muito abaixo da Kapten e das demais. Ainda assim, pagou quase 20 mil euros em contribuições ao Estado.

Nas contas entra ainda a It’s My Ride. Bem menos conhecida, só tem operações em Albufeira, pelo que os números são bem menos expressivos. Gerou receitas brutas de 6.772,20 euros, pagando pouco mais de 338 euros ao Estado português.

As novas regras para este negócio entraram em vigor a 1 de janeiro de 2019 para as plataformas e em março para os motoristas, legalizando este tipo de aplicações em Portugal. Ficou conhecida por “lei da Uber” e obrigou estas plataformas a pagarem ao Estado uma contribuição de 5% do valor das comissões cobradas aos motoristas. Uma espécie de “imposto” que incide, de forma efetiva, sobre as receitas destas empresas com o negócio do transporte individual de passageiros e cujos números acabaram detalhados pela AMT.

“Receita” do Estado abaixo do previsto. AMT queria mais 1,2 milhões

A contribuição paga pelas aplicações de transporte foi um dos temas polémicos das negociações da “lei da Uber”. Chegou a motivar o “chumbo” do Presidente da República à primeira versão da lei, por o valor ser relativamente baixo. À segunda tentativa, lá foram aprovados os 5%, por proposta do PSD e do PS (apesar de a primeira versão da lei publicada no Diário da República estar errada).

Em maio, pouco mais de um mês depois da chegada da nova lei ao terreno, o Jornal de Negócios (acesso pago) revelou que a AMT tinha inscrito uma estimativa que apontava para que as contribuições gerassem 3,5 milhões de euros para o Estado. O valor ficou um terço aquém dessa previsão, nos 2,3 milhões de euros.

“O valor arrecadado pela AMT, em 2019, relativo à contribuição em referência, foi de 2.306.580,63 euros. Dos oito operadores de plataforma eletrónica que se encontram licenciados à presente data [3 de janeiro de 2020] para desenvolver a atividade, refira-se que nenhum reportou qualquer intenção de não proceder ao pagamento da contribuição de regulação e supervisão”, refere a AMT na nota enviada ao PCP.

A resposta ao requerimento sublinha ainda que os montantes referidos foram efetivamente pagos — isto é, os valores foram liquidados “até 31 de dezembro” do ano que terminou. Assim, “atendendo a que não houve operadores de plataforma eletrónica que se recusaram a pagar a contribuição em referência, e que […] não foram identificadas situações em que o pagamento realizado por autoliquidação fosse abaixo dos valores devidos, não foram adotados quaisquer procedimentos de regularização”, informa, por fim, o regulador da mobilidade e dos transportes.

Segundo a lei, a contribuição “visa compensar os custos administrativos de regulação e acompanhamento das respetivas atividades e estimular o cumprimento dos objetivos nacionais em matéria de mobilidade urbana”. Dos 2,3 milhões arrecadados, 30% ficam na AMT, outros 30% deverão ser transferidos para o Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT), e 40% ficam afetos ao Fundo para o Serviço Público de Transportes. Desconhece-se a forma exata de como é que estes capitais vão ser investidos.

Correção: Uma versão anterior indicava que os dados diziam respeito ao período entre março e dezembro. Na verdade, para as plataformas, a lei entrou em vigor logo a 1 de janeiro de 2019. Por isso, os dados dizem respeito a todo o ano de 2019. Aos leitores e visados, as nossas desculpas.

(Notícia atualizada às 14h44 para clarificar que os valores finais poderão ser superiores, uma vez que as plataformas têm até ao próximo dia 31 de janeiro para liquidar a contribuição referente a dezembro de 2019).

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Uber dá bónus aos motoristas para compensar descida de preços. Pode exigir 75 horas de trabalho por semana

A Uber Portugal criou um plano de "incentivos personalizados" para compensar temporariamente os motoristas pela descida dos preços do serviço. Em alguns casos, exige 75 horas de trabalho por semana.

A Uber Portugal criou um programa de “incentivos personalizados” para compensar os motoristas pela descida dos preços do serviço, uma tentativa de assegurar a transição suave para o novo tarifário, que entrou em vigor este ano. Este apoio, em vigor até fevereiro, assegura que os motoristas podem obter o mesmo rendimento médio dos últimos meses, mediante algumas condições que variam de motorista para motorista. Ao que o ECO apurou, em alguns casos, poderão ter de trabalhar 75 horas numa semana, caso queiram aceder ao bónus.

A 2 de janeiro, a Uber anunciou uma descida nos preços do serviço básico de transporte Uber X, que ficou 10% mais barato, segundo cálculos da plataforma. A medida, positiva na ótica do passageiro, gerou desconforto entre os motoristas, que temem a pressão adicional sobre os rendimentos e criticam a decisão da empresa de manter inalterada a comissão de 25% aplicada ao valor das viagens. Foi, inclusivamente, marcado um protesto para o fim de semana que passou, mas que não gerou impacto na operação da Uber em Lisboa.

O ECO sabe que, a somar à preocupação dos motoristas em Portugal está o novo plano de “incentivos personalizados”, anunciado pela empresa num email enviado aos motoristas e parceiros, em simultâneo com o anúncio da descida dos preços. Num desses emails enviado a um motorista, a que o ECO teve acesso, a plataforma exige “tempo online igual ou superior a 75 horas” numa semana, assim como um mínimo de 47 viagens ao serviço da aplicação.

“Entre 6 de janeiro e 2 de fevereiro, garantimos no mínimo 388,49 euros por semana, o mesmo rendimento semanal que recebeu, em média, entre 18 de novembro a 15 de dezembro. Para que seja elegível, terá que cumprir” com os requisitos, informa a empresa, na mesma mensagem enviada a um dos motoristas — o valor varia em função do perfil do condutor. Para além das horas de trabalho e do mínimo de viagens, a Uber exige uma “taxa de aceitação e de cancelamento” em linha com o previsto na nova lei.

Os motoristas são livres para estar online na aplicação da Uber onde, quando e durante o tempo que quiserem. Podem escolher trabalhar as horas que entenderem, dentro dos limites previstos na lei, ou mesmo não trabalhar de todo.

Fonte oficial da Uber Portugal

Motoristas podem “trabalhar as horas que entenderem”

Nem todos os motoristas estão a ser “empurrados” para as 75 horas semanais de trabalho, sendo este um valor que, ao que foi possível apurar, está acima da média pedida no âmbito deste programa. Num outro caso consultado pelo ECO, a Uber exige um mínimo de 58 viagens e 53 horas de trabalho para garantir um rendimento igual à média de 410,92 euros semanais. E, num terceiro caso, são pedidas 21 horas semanais de trabalho e 24 viagens mínimas por 162,24 euros por semana.

“É surreal”, comentou um motorista da Uber, que pediu para não ser identificado. Contactada, a presidência da Associação Nacional de Parceiros das Plataformas Alternativas de Transporte (ANPPAT), que representa alguns parceiros de plataformas como a Uber, não respondeu a tempo da publicação deste artigo.

No entanto, fonte oficial da Uber Portugal lembrou que nenhum motorista é obrigado a aceder ao incentivo e justificou ao ECO, com mais detalhe, a decisão de avançar com este plano, bem como a de descer preços.

“Este plano de incentivos tem como objetivo permitir que os motoristas que viajam com a aplicação experimentem os novos preços durante quatro semanas sem comprometer os seus rendimentos esperados. Garantimos que, nas quatro semanas entre 6 de janeiro e 2 de fevereiro, todos os motoristas elegíveis irão receber os mesmos rendimentos que receberam nas quatro semanas entre 18 de novembro e 15 de dezembro, se fizerem uma utilização equivalente da aplicação da Uber nestes dois períodos”, disse fonte oficial da Uber Portugal.

A mesma porta-voz da empresa assumiu acreditar “que esta redução de preços será positiva tanto para utilizadores como para motoristas, mas também que deve ser a Uber e não os motoristas a suportar o risco imediato dessa mudança”. “Após estas quatro semanas, compete-nos a nós continuar a merecer a preferência dos motoristas pelo nosso serviço”, frisou.

A plataforma garante ainda que os “incentivos personalizados”, calculados com base no trabalho que cada motorista já fazia ao serviço da aplicação, estão abertos a todos os que tenham feito “pelo menos uma viagem e estado online, em média, pelo menos dez horas por semana” nas quatro semanas entre novembro e dezembro, acima indicadas. Confrontada com as 75 horas que foram exigidas a um motorista, fonte oficial da Uber garantiu, assim, que esse foi o tempo médio de trabalho desse mesmo motorista no período usado para o cálculo.

“A Uber não exige, nem nunca exigiu, nenhum valor mínimo de horas aos motoristas. Pelo contrário, os motoristas são livres para se ligarem à aplicação onde, quando e durante o tempo que quiserem”, recordou. E sublinhou: “Podem escolher trabalhar as horas que entenderem, dentro dos limites previstos na lei, ou mesmo não trabalhar de todo.”

A lei é omissa quanto a um limite de horas de trabalho semanal, referindo apenas que os motoristas não podem “operar” os veículos por “mais de dez horas dentro de um período de 24 horas”. Ou seja, este limite diário de dez horas aplica-se à “condução efetiva”, como tem sido interpretado pela empresa. Ultrapassado este limite, os motoristas são forçados a ficar offline.

A descida dos preços da Uber apanhou o setor de surpresa, mas acontece num mês tradicionalmente de menor procura pelo serviço. O ECO sabe que outras plataformas estão a analisar a hipótese de também reverem as suas tarifas, mas nenhuma decisão foi anunciada até ao momento.

A Bolt não quis comentar uma eventual descida de preços, enquanto a Kapten não respondeu a tempo de publicação deste artigo. A Cabify já não se encontra a operar em Portugal desde dezembro.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Alvarás de táxi à venda na internet disparam desde entrada da Uber. Preço médio atinge 45.630 euros

Dados do número de alvarás de táxi à venda na internet expõem um mercado impactado pela entrada das empresas como a Uber em Portugal. O número disparou desde 2015 e o preço médio pedido cresceu 36%.

O número de alvarás de táxi à venda na internet disparou desde 2015, uma evolução que se registou um ano depois da entrada da Uber em Lisboa. Dados obtidos pelo ECO mostram ainda que o preço médio pedido por estas licenças tem aumentado ano após ano, chegando aos 45.630 euros, mais 36,4% do que em 2015. Uma destas licenças pode ultrapassar os 85.000 euros em Lisboa.

Estes números baseiam-se apenas na plataforma OLX, um dos locais mais usados para a compra e venda deste tipo de licenças, não permitindo tirar conclusões globais. Além disso, representam unicamente os anúncios publicados e o preço médio pedido pelos vendedores, não discriminando quais deles se traduziram, efetivamente, numa transação. No entanto, permitem medir o pulso ao mercado secundário dos alvarás e oferecem um olhar inédito sobre o impacto que as plataformas eletrónicas têm tido neste negócio paralelo ao do táxi.

Em 2015, tinham sido publicados 31 anúncios de venda de alvarás, com um preço médio de 33.444 euros. Porém, em 2016, ano da primeira grande greve dos taxistas contra as plataformas eletrónicas, foram postos à venda 333 alvarás, uma subida que reflete o menor interesse neste tipo de atividade na altura e espelha a queda das receitas no setor, devido à concorrência mais apertada. O preço médio aumentou para 38.704 euros.

Evolução do mercado secundário de alvarás no OLX

Dados obtidos pelo ECO.

Ao contrário das plataformas eletrónicas Uber, Bolt e Kapten, o número de táxis em circulação está sujeito a um contingente municipal. Este mecanismo permite às autarquias controlar a oferta deste tipo de transporte no respetivo município, pelo que quem pretende entrar no negócio tem de obter uma licença municipal, válida para um automóvel que preencha os requisitos legais, por uma de duas vias: concurso público lançado pela Câmara Municipal ou aquisição de um alvará já existente, numa negociação entre privados que, muitas vezes, começa em sites de classificados, como o OLX.

“As licenças municipais são associadas a um único veículo. Ou seja, um prestador que possua vários táxis terá que possuir um número de licenças municipais idêntico ao número de táxis que prestam serviços com origem nesse município”, explica a Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT), num extenso relatório sobre o setor, publicado em abril de 2017. O regulador indica ainda que “as licenças podem ser obtidas quer por meio de concurso público lançado pelos municípios, quer pela sua aquisição no mercado secundário (a quem já as tenha)”.

Na realidade, não são os alvarás que são vendidos mas sim a empresa de táxi que possua uma ou mais licenças. Ao ECO, o Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT) explica que “nada impede que haja alterações ao pacto social das empresas” detentoras de licenças de táxi, apesar de as licenças serem “intransmissíveis”. Ou seja, o que acontece é que estas empresas e sociedades, detidas pelos taxistas, podem sempre mudar de gerente, desde que as atualizações sejam devidamente comunicadas ao IMT.

Mas os concursos públicos de emissão de licenças de táxi são escassos ou praticamente inexistentes em alguns concelhos. Por exemplo, de acordo com o mesmo regulatório, o número total de táxis licenciados em Lisboa em agosto de 2016 estava limitado a 3.600. Porém, nesta altura, existiam apenas 3.497 licenças ativas. E, analisando um período de dez anos, o número líquido de táxis licenciados no maior município do país subiu em apenas 56.

Lisboa foi, ainda assim, o concelho com o maior aumento entre 2006 e 2016, o que permite concluir que os alvarás representam um “ativo” que é limitado, que é necessário, e que pode ser transacionado. Estes fatores explicam a existência de um mercado secundário de alvarás com preços muito inflacionados, que podem chegar à centena de milhar de euros, o que compara com as poucas centenas de euros que custam estas licenças quando são lançadas pelas Câmaras Municipais. Mas não existem dados oficiais do número de alvarás que trocam de mãos.

Todos os táxis são obrigados a ter um alvará. O número é exibido numa placa branca, como mostra a fotografia.Paula Nunes / ECO

Em 2018, ano em que a “lei da Uber” entrou em vigor e estas plataformas passaram a ter enquadramento legal, o número de anúncios no OLX para a venda de alvarás de táxi caiu pela primeira vez desde a entrada da empresa norte-americana em Portugal e do início do braço de ferro entre os dois setores. Foram publicados 320 anúncios, uma redução de 11% face a 2017, ainda que o preço tenha disparado, de 36.530 euros para 45.612 euros, uma valorização potencial de quase 25% neste ano.

Contudo, a menor dinâmica no número de anúncios de licenças de táxi à venda foi apenas temporária. Em meados de outubro deste ano, o número de publicações no OLX para a alienação de licenças já chegava aos 461, ultrapassando, pela primeira vez, as quatro centenas de licenças à venda, uma subida de 44% face ao ano anterior. O preço médio pedido pelos vendedores também renovou máximos, fixando-se em 45.630 euros, mais 36% do que em 2015, de acordo com os dados obtidos pelo ECO.

Estas evoluções devem ser vistas à luz das novas regras para as plataformas eletrónicas de transporte. Mediante a lei aprovada no ano passado, todos os taxistas certificados ficaram habilitados a conduzirem automóveis descaracterizados ao serviço das aplicações como a Uber, enquanto os restantes motoristas passaram a ter de pagar e completar um curso de formação para poderem exercer a atividade. Empresas como a Uber ajudaram a pagar alguns destes cursos, tendo em conta que, antes da entrada em vigor da lei, o acesso à profissão era praticamente livre, mediante apresentação de registo criminal e documentos pessoais.

Taxistas admitem efeito das plataformas, mas destacam recuperação do setor

O ECO apresentou estes números aos líderes dos dois principais organismos que representam o setor do táxi. Ambos reconhecem, até dada medida, o impacto das plataformas eletrónicas no setor. E falam numa recuperação das receitas este ano, apesar de não desmobilizarem na luta contra as empresas como a Uber, que conquistaram uma legislação específica, ainda que explorem o mesmo mercado: transportar passageiros do ponto A ao ponto B.

Carlos Ramos, presidente da Federação Portuguesa do Táxi (FPT), não esconde que a entrada em Portugal de serviços como o da Uber explica parcialmente a subida no número de alvarás que são postos à venda em Portugal. “Naturalmente que é também efeito das plataformas, não posso negar isso”, afirma. Mas vê nestes dados um sinal positivo para o setor, se os anúncios se traduzirem, efetivamente, em negócios: “Se há gente no mercado a querer comprar, é bom para o setor”, acrescenta.

Quanto à subida do preço dos alvarás no mercado secundário, Carlos Ramos nota igualmente um bom presságio: “Se o valor também sobe, os potenciais compradores encontram no setor uma forma de valorizarem o seu capital”, diz. Mas são apenas indícios leves. Notícias ligeiramente positivas, que “não são por aí além, mas são sinais positivos para o setor”, remata.

Por sua vez, Florêncio de Almeida, presidente da Associação Nacional dos Transportes Rodoviários em Automóveis Ligeiros (ANTRAL), acredita que “o setor não se pode comparar de ano para ano”. “Há anos em que mais pessoas vão para a reforma e vendem licenças”, explica, apesar de não tirar uma ilação concreta a partir dos dados apresentados pelo ECO. “É muito oscilante”, frisa, destacando ainda assim que “há muita gente a querer comprar e muita gente a querer vender”.

Sobre a subida dos preços médios pedidos pelos alvarás à venda, Florêncio de Almeida desvaloriza a evolução e aponta para uma tendência natural. “Tudo vai aumentado. Tudo aumenta neste país”, aponta, deixando um exemplo aberto, meramente a título explicativo: “Dantes comprava uma loja no Chiado a 100 mil euros. Hoje, não o faço por menos de 300 mil.”

Em 2016, ano da primeira grande manifestação de taxistas, o número de licenças à venda no OLX disparou de 31 para 333.MARIO CRUZ / LUSA

Os dois responsáveis setoriais também alinham na ideia de que, hoje, depois do rombo provocado pela entrada das plataformas, o setor está a recuperar. “A Uber interferiu nas receitas, mas hoje está melhor. As pessoas mais atentas veem que o táxi é mais barato”, aponta Florêncio de Almeida, sem fundamentar esta consideração. Já Carlos Ramos aponta para uma degradação do serviço prestado pelas plataformas eletrónicas nos últimos meses. “A imagem de que andar num carro descaracterizado é cool está a cair pela base. Há cada vez mais reclamações”, diz.

Contactada, fonte oficial da Uber não quis comentar. Não foi possível obter respostas da Câmara Municipal de Lisboa a tempo de publicação deste artigo.

Número de táxis em Portugal “cresceu menos de 1%” na última década. Cai 9% em três anos

A subida do número de licenças de táxi à venda nos últimos anos significa uma maior oferta no mercado secundário. Mas, se fosse apenas assim, o preço tenderia a baixar.

É no relatório da AMT, publicado em 2017, que se encontra uma possível justificação para o facto de o preço médio pedido pelas licenças ter continuado a subir: “A oferta tem-se mantido estável [entre 2006 e 2016]. O número de táxis licenciados e o número de lugares nos contingentes cresceu menos de 1% na última década”, lê-se numa apresentação divulgada pelo regulador.

Além do mais, os dados atualizados cedidos ao ECO pelo IMT, datados de 19 de novembro de 2019, mostram uma queda no número de táxis atualmente licenciados em Portugal, comparativamente com os dados do relatório da AMT. Enquanto existiam 13.776 táxis licenciados em agosto de 2016, existem agora apenas 12.542, uma redução de quase 9% em três anos.

Perante este retrato de um setor do táxi em contração, sem alternativas, quem mesmo assim quer ter um táxi tem de desembolsar um montante avultado para obter um alvará, comprando-o a alguém que já não queira explorar a atividade, ou que esteja disponível para aproveitar a oportunidade de fazer negócio. Noutros casos, as licenças acabam à venda após a morte do proprietário.

Esta dinâmica é visível, sobretudo, em Lisboa e no Porto, os concelhos onde se encontra mais de 30% da oferta nacional, segundo os dados de 2016. A concentração é ainda maior olhando para os cinco concelhos com mais táxis licenciados: representavam cerca de 36% do número total de táxis licenciados em Portugal nesse ano, de acordo com a informação que foi disponibilizada pela AMT.

E uma vez que não existem dados oficiais do número de automóveis ao serviço das aplicações móveis, não é possível fazer uma comparação. Mas os dados do IMT, de 19 de novembro, mostram que existiam 25.789 pessoas com certificação válida para conduzir táxis e 9.951 empresas com licença válida para a atividade de táxi. Os números comparam com as 6.353 empresas com licença para terem carros ao serviço das plataformas como a Uber, bem como com os 20.024 motoristas com licenças para conduzirem ao serviço das aplicações.

Isto significa que, apesar de os números poderem ser cruzados, existem apenas mais 5.765 taxistas do que motoristas de empresas como a Uber. Mas é preciso ter em conta que as plataformas eletrónicas não cobrem todo o território nacional, mas sim os principais centros urbanos, ao contrário dos táxis, que existem em praticamente todos os concelhos. Dito isto, não faltará muito até a curva inverter-se. E mesmo nesta altura, a avaliar pela informação existente, o negócio das plataformas já deverá ser maior do que o do táxi nos principais mercados em Portugal.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.