Bolsa de Lisboa ganha 10% no ano. Ainda há espaço para subir mais?
Dinheiro barato dos bancos centrais tem impulsionado, mas surpresas positivas poderão aproximar-se do fim. Analistas esperam ganhos no PSI-20, mas subidas demasiado rápidas poderão levar a estagnação.
O arranque de 2019 trouxe os traumas do ano anterior. Os receios com a desaceleração da economia global pairavam sobre os mercados, mas as boas notícias acabaram por se sobrepor e as bolsas europeias fecharam o melhor primeiro trimestre em quatro anos. Após um ganho de 10% do PSI-20, os analistas veem riscos para o segundo trimestre, mas consideram que a história será a mesma: se os desenvolvimentos internacionais forem menos desfavoráveis que o esperado, ainda há espaço para mais valorizações. A época de resultados poderá dar um impulso adicional.
“A variação trimestral do PSI-20 para os primeiros três meses de 2019 é a mais elevada desde o primeiro trimestre de 2015, tendo anulado a quase totalidade das perdas observadas no último trimestre de 2018 (-11,7%)”, diz Albino Oliveira, analista da Patris Corretora. Lembra, no entanto, que a evolução fica abaixo do ganho de 12,3% do índice pan-europeu Stoxx 600.
“Realizando a mesma análise para o Stoxx 600, poder-se-á concluir que a variação é também a mais significativa desde o primeiro trimestre de 2015, tendo o índice conseguido mesmo anular a totalidade das perdas registadas nos últimos três meses do ano passado (-11,9%)”, nota, destacando a subida de 16,2% da bolsa de Itália, “provavelmente reflexo de alguma redução nas preocupações dos investidores quanto à situação política no país”.
Bolsa de Lisboa ganhou 10% no primeiro trimestre. Subiu menos que a Europa
Entre as cotadas portuguesas, quem mais ganhou foram as empresas que mais caíram no ano passado: a Jerónimo Martins com um disparo de 27% e a Mota-Engil com uma valorização de 26,71%, brilharam. “Os bons resultados apresentados por estas duas empresas em particular provaram aos investidores que o pessimismo demonstrado no ano passado terá sido algo excessivo“, afirma João Pisco, analista de mercados financeiros do Bankinter.
Tanto Oliveira como Pisco concordam que foram fatores externos a marcar as negociações, em especial a postura cautelosa dos bancos centrais nos EUA, Zona Euro e Japão. A Reserva Federal norte-americana alterou drasticamente o discurso tanto no que diz respeito às taxas de juro (sendo a expectativa atual dos membros do Comité de Política Monetária da Reserva Federal que não seja necessário realizar subidas este ano, face à expectativa anterior de dois aumentos), como no que se refere à redução da folha de balanço.
Bancos centrais não deverão trazer surpresas positivas
O Banco Central Europeu (BCE), por seu lado, cortou as projeções económicas e garantiu estar pronto para manter políticas expansionistas bem como juros em mínimos históricos enquanto fosse necessário. Lançou ainda uma nova ronda de operações de refinanciamento de prazo alargado (TLTRO III) para estimular a economia. Se as ações celebraram a continuação da era do dinheiro barato, os bancos foram penalizados por um programa de TLTRO com um prazo mais curto que nas anteriores duas séries e juro variável.
"Será difícil que os bancos centrais continuem a surpreender pela positiva, o fator que poderá revelar-se decisivo será ver até que ponto os dados económicos divulgados ao longo das próximas semanas irão permitir expectativas mais favoráveis por parte dos investidores para a evolução da economia global.”
Apesar de terem fechado o trimestre no verde, os bancos europeus estiveram entre os piores performers e o português BCP não escapou, tendo subido apenas 0,35% entre janeiro e março. O fraco desempenho foi apenas melhor que o das duas cotadas portuguesas que desvalorizaram no acumulado dos três meses: Ibersol (-2%) e CTT (-12,4%).
No segundo trimestre, o espaço para a política monetária estimular os mercados acionistas poderá estar limitado. “Tendo em conta que será provavelmente difícil que os bancos centrais continuem a surpreender pela positiva, o fator que poderá revelar-se decisivo será ver até que ponto os dados económicos divulgados ao longo das próximas semanas irão permitir expectativas mais favoráveis por parte dos investidores para a evolução da economia global”, afirmou o analista da Patris Corretora.
Consoante evoluírem as expectativas, poderá haver espaço para um enquadramento mais favorável para “as áreas mais cíclicas do mercado (incluindo para o setor financeiro) ou para os segmentos mais defensivos“, na perspetiva de Albino Oliveira. A visão do Bankinter é semelhante e João Pisco avança que as ações prediletas, neste momento, são a Galp, o BCP, a Navigator, a REN e a Jerónimo Martins.
Além da política monetária, há outros fatores externos que influenciaram as bolsas no primeiro trimestre e deverão manter-se em foco. O menor confronto entre o Governo italiano e a Comissão Europeia, o afastamento de cenários mais negativos do Brexit e os sinais positivos nas negociações comerciais entre EUA e China ajudaram. Mas tanto o divórcio entre Reino Unido e UE como a guerra comercial continuam por resolver e os desenvolvimentos serão determinantes para as ações.
Estagnação pode seguir-se a aceleração demasiado rápida
A nível interno, a ocasião mais esperada pelos analistas é a próxima época de resultados. As contas das cotadas do PSI-20, relativas a 2018, foram “mistas, quando comparadas com as expectativas do mercado”, diz Oliveira, que considera que o efeito não terá sido “decisivo” para a evolução do índice. As grandes exceções foram os CTT — que assistiu a quedas nos lucros, cortou o dividendo, apresentou projeções mais negativas para a evolução do tráfego de correio postal e viu as ações renovarem mínimos históricos –, e a EDP.
Os lucros da empresa liderada por António Mexia tombaram 53% para 519 milhões de euros, em 2018 face ao ano anterior. A EDP atribuiu a queda ao impacto adverso da provisão de 285 milhões de euros devido às sobrecompensações dos CMEC. Mas o foco foi mesmo o plano estratégico 2019-2022, que prevê um investimento de sete mil milhões de euros para renováveis, três mil milhões de euros em dividendos e um corte na dívida de dois mil milhões de euros.
A elétrica somou 15% no trimestre e a EDP Renováveis ganhou 9,3%. No entanto, aproximam-se tempos incertos. A oferta pública de aquisição (OPA) lançada pelo China Three Gorges continua em “modo de espera” e ganhou um novo fator de incerteza: um acionista ativista. O fundo Elliott não só se pronunciou no início do ano contra a OPA e sobre a estratégia da EDP, como pediu na semana passada que seja votada, na assembleia-geral de dia 24 de abril, a limitação de 25% nos direitos de voto dos acionistas para por fim imediato à operação.
Embora continuemos a ver algum potencial de valorização no PSI-20, temos alertado para o risco de termos um ano rápido e curto.
Aparte deste tema de exceção, o analista da Patris Corretora considera que, a nível doméstico, “o período de apresentação de resultados do primeiro trimestre de 2019 poderá rapidamente colocar-se no centro das expectativas dos investidores” até porque permitirá perceber em que medida está a desaceleração da economia a afetar as empresas. Apesar de verem potencial de valorização, ambos os analistas mostram-se conservadores sobre quanto espaço terá ainda a bolsa de Lisboa para crescer.
“Embora continuemos a ver algum potencial de valorização no PSI-20, temos alertado para o risco de termos um ano rápido e curto. Ou seja, caso no início do segundo trimestre a tendência de ganhos se mantenha ao ritmo do primeiro trimestre, poderá cumprir-se o famoso Sell in May and go way, com os investidores a realizarem as mais-valias geradas até essa altura, levando a uma eventual estagnação ou até ligeira correção das bolsas”, acrescentou João Pisco, do Bankinter.
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