Altice Portugal pressiona Governo a dissolver administração da Anacom
A Altice Portugal invocou um artigo dos Estatutos da Anacom para pressionar o Governo a dissolver a administração do regulador, liderada por João Cadete de Matos.
A Altice Portugal invocou um artigo dos Estatutos da Anacom para pressionar o Conselho de Ministros a dissolver a administração do regulador, uma decisão que faz subir de tom o diferendo entre as duas entidades. Num comunicado, a dona da Meo considera que “estão verificadas as condições” para afastar o presidente João Cadete de Matos e respetiva equipa do Conselho de Administração da Anacom.
Esta notícia representa um raro passo para uma operadora de telecomunicações, uma vez que a liderança da Anacom, à semelhança do que acontece nos demais reguladores, é considerada inamovível. João Cadete de Matos foi nomeado para o cargo em 2017 e aprovado para um mandato de seis anos. Mas, em linhas gerais, só pode sair por sua própria decisão ou por dissolução justificada do Governo. É este último cenário que a Altice Portugal vem agora exigir, por causa do processo do lançamento do 5G.
“A Altice Portugal considera que, não obstante o estatuto de independência do regulador, estão verificadas as condições previstas nos seus Estatutos (artigo 24.º) que justificam a dissolução do Conselho de Administração da Anacom”, lê-se num comunicado. O ECO contactou a Anacom, mas ainda não foi possível obter uma reação.
O artigo em causa prevê que “o Conselho de Administração só pode ser dissolvido e a destituição de qualquer dos seus membros só pode ocorrer por resolução do Conselho de Ministros fundamentada em motivo justificado”. A lei clarifica que “existe motivo justificado sempre que se verifique falta grave, responsabilidade individual ou coletiva, apurada em inquérito instruído por entidade independente do Governo, e precedendo audição da comissão parlamentar competente”.
Ora, a Altice Portugal acredita existirem motivos para avançar com o processo. Em causa, o calendário para o 5G, que abrange um processo de migração da frequência da Televisão Digital Terrestre (TDT) e um leilão de frequências com início marcado para abril de 2020. Nos últimos meses, a operadora (que é responsável pela TDT) e o regulador têm protagonizado um pingue-pongue de críticas e acusações, o que levou a empresa a dizer basta, partindo agora para uma tentativa de afastar a liderança do regulador.
A Altice Portugal considera que, não obstante o estatuto de independência do regulador, estão verificadas as condições previstas nos seus Estatutos (artigo 24.º) que justificam a dissolução do Conselho de Administração da Anacom.
“Sobre as declarações proferidas pelo presidente da Anacom relativas à migração do serviço TDT e consultas relativas ao 5G em Portugal, elas consistem apenas numa tentativa de maquilhar a total incompetência e descontrolo na gestão de todo o processo, refletindo um irrealismo absolutamente assustador. É impensável que alguém com a responsabilidade de regulação neste setor venha a público garantir o que é impossível de garantir, demonstrando um desconhecimento absoluto das áreas em apreço”, critica a Altice no comunicado onde pede a dissolução.
Assim, para a operadora liderada por Alexandre Fonseca, chegou-se “a uma situação incomportável, que já ultrapassa o âmbito do setor e o contexto das telecomunicações, onde todos os limites são ultrapassados e onde impera uma ausência de verdade, com declarações vagas e vazias, que apenas pretendem esconder a realidade que, infelizmente, já muito prejudica o país”. A empresa considera ainda que esta oposição à postura da Anacom “é já merecedora de amplo consenso na esmagadora maioria dos agentes económicos envolvidos, direta ou indiretamente”.
Esta não é a primeira vez que a Altice Portugal pede a demissão do presidente da Anacom. A empresa já o sugeriu no passado. No entanto, este é o primeiro passo assumido e concreto de embate com a entidade que policia as telecoms, mais concretamente através da pressão que é exercida sobre o Conselho de Ministros, o órgão que pode desencadear o processo para tentar demitir a liderança da Anacom.
Para além dos jornais, a “guerra” entre Altice Portugal e a Anacom tem sido combatida nos tribunais. No episódio mais recente, a dona da Meo avançou para o Tribunal Administrativo para tentar impugnar juridicamente o calendário da Anacom para a migração da TDT. Este processo é importante na medida em que a faixa do espetro que vai ser libertada é necessária ao desenvolvimento do 5G na Europa.
Face às acusações de que tem sido alvo, a Anacom, reiteradamente, tem recusado ser um obstáculo ao desenvolvimento do setor. Pelo contrário, o regulador tem vindo a justificar as medidas com o interesse público e a defesa dos direitos dos consumidores. Por exemplo, numa das propostas mais recentes, a Anacom obrigou as operadoras a fornecerem gratuitamente aos clientes um novo tipo de fatura, onde é indicado, com detalhe, o período de fidelização a que o cliente está sujeito e quanto tem de pagar se quiser quebrar o vínculo.
Além disso, João Cadete de Matos tem vindo a introduzir no debate uma nova medida, chamada roaming nacional, através da qual se prepara para obrigar as operadoras de 5G a partilharem infraestruturas no interior do país, de forma a acelerar o lançamento da tecnologia em localidades mais remotas. Por sua vez, esta medida tem sido duramente criticada pelas empresas de telecomunicações.
(Notícia atualizada pela última vez às 12h59)
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