Maioria dos empresários diz que aumentar salário mínimo “seria ridículo”. Mas a Bosch é a favor
Barbot, Carlos Santos Shoes, Crafil e Quinta do Crasto consideram que "é difícil, neste altura, pensar em aumentos do salário mínimo". Para a Bosch o aumento é "ajustado e necessário".
Numa altura em que o país, e o mundo, estão a enfrentar uma crise sem precedentes, o aumento do salário mínimo nacional volta a estar em discussão, tendo em conta que o BE, PCP e PAN querem ver este assunto discutido nas negociações deste mês. A grande maioria dos empresários não concorda com esta medida, pois consideram que é altura de “salvar postos de trabalho” e que um aumento seria completamente “desajustado”.
As empresas ouvidas pelo ECO dão nota negativa a esta proposta avançada pelo Expresso, medida que até o Presidente da República disse preferir “esperar para ver” o resultado das negociações. O ECO foi questionar a Barbot, Carlos Santos Shoes, Crafil, Quinta do Crasto e a Bosch sobre a possibilidade de se voltar a subir a remuneração mínima e apenas a multinacional alemã considera a proposta ajustada. Todas as outras são contra.
“É completamente desajustado fazer aumentos do salário mínimo nesta altura do campeonato. As empresas estão a sobreviver para conseguirem manter os postos de trabalho, pagar as despesas e os salários”, sublinha Ana Santos, diretora de marketing/sales manager da Carlos Santos Shoes, que emprega 86 colaboradores. “Aumentar o salário é completamente incoerente e não há margem. Noutra altura sim, mas agora é impensável”, assegura.
Também Carlos Barbot, presidente executivo da empresa de tintas com o mesmo nome, defende que “aumentar o salário mínimo não faz muito sentido nesta altura e não vai ajudar nada as empresas”. “É difícil, neste altura, pensarmos em aumentos do salário mínimo quando temos tantos problemas de lay-off“, recorda.
É completamente desajustado fazer aumentos do salário mínimo nesta altura do campeonato. As empresas estão a sobreviver para conseguirem manter os postos de trabalho, pagar as despesas e os salários. Aumentar o salário é completamente incoerente e não há margem.
O Governo arrancou esta legislatura com os olhos postos numa meta: atingir o salário mínimo de 750 euros até 2023, mas a pandemia do novo coranavírus pode ter trocado as voltas a este plano. A meta indicativa seria chegar aos 670 euros em 2021. Mas o primeiro-ministro defende que o valor anual deve ser fixado tendo em conta a “dinâmica do emprego e do crescimento económico”. Tudo aponta para que a recessão este ano chegue quase aos 10%, como antecipa a Comissão Europeia e, por isso, as pretensões da esquerda podem estar comprometidas. No entanto, não é inédito que o aumento do salário mínimo aconteça em anos de queda do PIB.
O ministro da Economia também veio acalmar os ânimos nesta discussão ao considerar que “não é uma questão que se coloque agora”. Em entrevista à Rádio Observador (acesso pago), Siza Vieira disse que “o tema não foi sequer objeto de discussão entre o Governo, o PCP, o Bloco de Esquerda, o PEV, o PAN”. O número dois do Governo recordou a posição do António Costa de avaliar, ano a ano, a trajetória, defendendo que é isso que é necessário fazer. “É isso que temos de avaliar. É uma decisão que não tem que ser tomada agora”, em declarações que ajudam de alguma forma a tranquilizar as preocupações dos empresários.
Vítor Alves, presidente da empresa têxtil Crafil, que emprega 16 colaboradores em Portugal, conta que, neste momento, o que estão “a fazer é tentar salvar postos de trabalho”. “Nesta fase, 90% dos nossos trabalhadores entendem isso e vão compreender o nosso ponto de vista. A preocupação deles é não serem despedidos”. Por isso, “nesta altura, é prematuro falar em aumentos salariais”, defende. “É preciso é ajudar as empresas a manter os postos de trabalho“, apela.
A importância da valorização dos salários não é negada pelos empresário. Mas, “não é positivo, nem oportuno, ouvir os nossos representantes, em tempos de crise, falarem em aumentar o salário mínimo”, sublinha o administrador da Quinta do Crasto. “Existem muitas empresas que não sabem como vão dar a volta à situação e é ridículo uma questão destas neste momento. Algumas empresas estão desequilibras, esse tipo de decisões vai antecipar o fim de algumas empresas”, prevê Justino Soares, cuja empresa emprega atualmente 81 pessoas.
O custo de vida não vai baixar devido à pandemia e as pessoas vão ter mais dificuldades em sobreviver, por isso mesmo o salário mínimo deve aumentar para que as pessoas terem uma vida digna.
João Vieira Lopes, administrador de várias empresas no mercado da distribuição alimentar e presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), também está contra este aumento. “Esses objetivos tinham um conjunto de pressupostos de evolução económica que, neste momento, se alteraram”, ou seja, o comportamento da economia, das exportações e do emprego, refere ao ECO.
Contrariamente à grande maioria dos entrevistados pelo ECO, o representante da Bosch Portugal, Carlos Ribas, concorda com o BE e PCP e diz que o salário mínimo deve ser “ajustado”. “As pessoas têm de viver com dignidade e o salário mínimo dever ser aumentado. O custo de vida não vai baixar devido à pandemia e as pessoas vão ter mais dificuldades em sobreviver, por isso mesmo o salário mínimo deve aumentar para que as pessoas terem uma vida digna”, explica ao ECO, o represente da Bosch em Portugal, uma multinacional alemã, país onde o aumento do salário mínimo para 2021 já está acertado.
“Se vamos aplicar outra vez a mesma receita que foi aplicada no tempo da troika com redução de retribuições e de direitos dos trabalhadores, o que vamos fazer é afundar ainda mais a economia e os trabalhadores ficarão em situações de exploração e de pobreza, que são completamente inaceitáveis”, defendeu a secretária-geral da Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP), em declarações ao ECO, na altura do dia do trabalhador. O salário mínimo esteve congelado durante quatro anos, voltando apenas a ser aumentado em 2015.
Com a crise pandémica “a ganhar ainda mais força existe a necessidade do aumento generalizado dos salários, do aumento do salário mínimo nacional — e mantemos a consideração de que o objetivo deverá ser os 850 euros no mais curto prazo –, de acabar com a imensa precariedade“, conclui Isabel Camarinha.
Para o secretário-geral da União Geral de Trabalhadores (UGT), “nada está fora da mesa”. “É entendimento da UGT que o salário mínimo, no seu aumento ou evolução, deve ser intocável. A UGT insiste que o salário mínimo deverá ser aumentado, em 2021”, destacava Carlos Silva na mesma data. “Vamos exigir o aumento do salário mínimo nacional em função da realidade do país. Vamos ter de ser muito pragmáticos, conscienciosos e ter a noção de que a evolução deste ano em que em vez de ser 50 ou 60 euros, como gostaríamos, porventura terá que ser mais baixa, mas isso vamos aguardar”, reconhecia, contudo, Carlos Silva.
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