Siza diz que turistas regressam na Páscoa. Setor desconfia
O ministro da Economia preparou o país para o regresso do turismo na Páscoa. Mas o setor ainda tem dúvidas e quanto a essa previsão e lança alertas.
O ministro da Economia está confiante na recuperação do turismo. Se há menos de dois meses estava “muito otimista” com o setor a médio prazo, a semana passada antecipou o regresso do turismo na Páscoa. Mas as empresas do setor não pensam da mesma maneira. As certezas são muito poucas e o futuro mostra-se incerto. Do lado da hotelaria, as expectativas apontam para uma Páscoa com “pouco movimento”. Se a recuperação do setor se iniciar nessa altura, será muito “lenta” e “gradual”.
“A minha perspetiva para o turismo a médio prazo é muito otimista”, disse Pedro Siza Vieira no final de outubro, durante uma conferência sobre imobiliário. “Agora temos uma procura retraída, o que significa que as pessoas estão em casa. Mas o turismo vai voltar”, completou.
Cerca de um mês e meio depois dessas declarações, as expectativas do ministro da Economia estão focadas na Páscoa, que no próximo ano se celebra em abril. “As empresas devem preparar-se para o regresso do turismo a partir da Páscoa”, disse na semana passada, após um encontro com o presidente da Organização Mundial de Turismo (OMT). As últimas previsões da OMT apontam para a recuperação do turismo internacional em 2021, com especial incidência no terceiro trimestre.
Se no início da pandemia o setor acreditava que a recuperação iria acontecer de determinada maneira, essas previsões acabaram por se mostrar falhadas. “Esperávamos que a recuperação tivesse começado mais cedo e que o verão tivesse sido mais positivo”, diz ao ECO José Theotónio, CEO do Grupo Pestana, referindo que esta segunda vaga da pandemia provocou um novo recuo. O setor “andou para trás a partir de novembro e não temos expectativas nenhumas até março”, continua.
O presidente da Confederação do Turismo de Portugal (CTP) diz que o desempenho do turismo “está a ser pior do que se previa porque a pandemia está a prolongar-se no tempo”. Em declarações ao ECO, Francisco Calheiros afirma mesmo que “as perspetivas iniciais já estão completamente desatualizadas” e que, se em abril se apontavam perdas entre os 50% e os 52%, neste momento as estimativas apontam para quedas a rondar os 70%.
O responsável da CTP alerta para as necessidades que as empresas do setor estão a atravessar, assim como a Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP), que cita os sucessivos inquéritos que tem vindo a fazer, e que “denotam um degradar do tecido empresarial”, com “cada vez mais empresas a recorrer à insolvência ou a manifestar essa intenção”.
O mais recente inquérito da AHRESP, referente a novembro, mostra que sem apoios diretos à tesouraria, 48% dos restaurantes e 32% dos hotéis não irão resistir aos próximos meses. Mas estes números foram divulgados antes de o Governo anunciar mais apoios para as empresas, nomeadamente ajudas para o pagamento das rendas, o alargamento do programa Apoiar a médias empresas e uma nova linha de crédito para grandes empresas.
Mas, afinal, o que esperar dos próximos meses?
O presidente da CTP diz que a “pandemia está longe de terminar, pelo que o futuro ainda é muito incerto”. Francisco Calheiros reitera que não é possível fazer uma “previsão exata porque ainda há muita incerteza”, contudo, está confiante de que após o início da vacinação, “e a correr bem”, a partir do segundo semestre de 2021 poderá dar-se início a alguma recuperação.
“Poderá existir alguma atividade na Páscoa, mas apenas se houver uma evolução positiva da pandemia até lá e (…) se a vacinação em massa se concretizar e se recuperarmos a segurança e confiança”, nota o presidente da CTP.
Por sua vez, no setor hoteleiro, as previsões são mais pessimistas. “A recuperação ainda não existe. Irá ocorrer quando houver a eficácia da vacina”, diz o presidente da AHP, afirmando que “no segundo trimestre de 2021 começará a haver algum movimento de turistas e melhorará a partir de meados de 2021 quando cerca de 50% das pessoas estiverem vacinadas”. Contudo, afirma: “2021 será no seu total ainda negativo”.
Contudo, relativamente às expectativas do ministro da Economia, Raul Martins mostra-se pouco confiante. “Na Páscoa haverá muito pouco movimento”, afirma, antecipando, eventualmente, a chegada de “turistas mais novos”. O presidente da AHP defende a obrigatoriedade de um teste negativo antes de ser feita qualquer viagem de avião, caso contrário, “a Páscoa vai ter muito pouco movimento e a recuperação só começará a partir de meados de 2022”.
A Páscoa é em abril e é verdade que a partir daí pode haver alguma retoma da atividade. Mas outra coisa diferente é a que nível essa retoma vem. Aceitando que é a partir da Páscoa, acho que o nível de retoma vai ser muito lento e muito gradual, principalmente no segundo trimestre.
Dentro do setor hoteleiro, José Theotónio, do Grupo Pestana, diz que “até março vai estar tudo parado” e que, nesse ponto de vista, concorda com Pedro Siza Vieira. Contudo, mostra-se reticente quanto à forma como a retoma vai acontecer. “A Páscoa é em abril e é verdade que a partir daí pode haver alguma retoma da atividade. Mas outra coisa diferente é a que nível essa retoma vem. Aceitando que é a partir da Páscoa, acho que o nível de retoma vai ser muito lento e muito gradual, principalmente no segundo trimestre. Ainda vai ser muito fraco, como no fundo foram junho e julho“, diz.
Gonçalo Rebelo de Almeida, administrador da cadeia hoteleira Vila Galé, acredita ser possível começar um processo de recuperação a partir da Páscoa. Contudo, também afirma que será “de forma lenta”. “A nossa expectativa é que o mercado interno seja o primeiro a responder. Já os mercados internacionais deverão iniciar a retoma mais perto de maio/junho”, diz, ao ECO. Como alerta José Theotónio, o setor “não está à espera de um click e de tudo voltar ao que era no pré-pandemia”.
Do lado da AHRESP, que representa a restauração e a hotelaria, adota-se uma posição mais conservadora. “Penso que terá manifestado [o ministro da Economia] um desejo seu, que também é um desejo de todos nós, mais do que uma certeza que, obviamente ninguém nesta fase tem“, diz a secretária-geral da associação, Ana Jacinto, referindo que “essa é uma grande questão, saber quando irá acontecer uma recuperação do turismo”.
Quando voltará o turismo aos níveis de 2019?
Esta é, talvez, a one million dollar question. E, aqui, as opiniões são unânimes. O CEO do Grupo Pestana recorda como “2007 e 2008 foram os dois grandes anos do turismo” e que foram precisos oito anos para o setor recuperar. Só em 2016 se voltou a ter um ano tão bom. “Com esta crise não sei se será assim, mas vai com certeza ser muito gradual. Não creio que se consiga ter um ano tão bom como 2019 antes de 2024“, diz José Theotónio.
Gonçalo Rebelo de Almeida, do Grupo Vila Galé, admite que no verão de 2021 seja possível “iniciar a retoma e voltar a ter alguns fluxos turísticos que até agora ficaram totalmente suspensos”. Contudo, também este gestor hoteleiro acredita que “o regresso aos níveis de 2019 só deverá concretizar-se em 2023 ou em 2024”. As esperanças estão depositadas no processo de vacinação, mas há ainda o desafio de “reconquistar a confiança dos consumidores” e as “restrições às viagens”, bem como a “recuperação do transporte aéreo”.
Se a pandemia desacelerar, se a vacinação em massa existir e se recuperarmos a segurança e confiança, será possível assistirmos a uma recuperação antes de 2025.
A associação que representa a hotelaria, a AHP, antecipa desde já que “2022 vai ser positivo”. Contudo, Raul Martins alerta que se chegará aos níveis de 2019 só em 2024″. “Portugal, aliás, depende da aviação em mais de 90%. Por isso, antes de 2024 não estaremos nos níveis de 2019“, diz.
Depositando a maior parte das esperanças na vacinação, que deverá arrancar em Portugal no início de janeiro, com a vacina da Pfizer, o presidente da CTP, Francisco Calheiros, comenta: “Se a pandemia desacelerar, se a vacinação em massa existir e se recuperarmos a segurança e confiança, será possível assistirmos a uma recuperação antes de 2025”.
Mantendo a posição mais precavida, Ana Jacinto, da AHRESP, acredita que “ninguém estará hoje numa situação que permita antever quando se dará o regresso do normal funcionamento do turismo”. Para a representante da restauração e da hotelaria, isso dependerá de “muitas variáveis”.
Preferindo não adiantar “metas” para um regresso aos níveis do ano passado, Ana Jacinto reitera a necessidade de se darem os apoios necessários às empresas do setor para que estas possam manter as suas atividades, evitando mais falências e mais despedimentos. “As empresas irão necessitar de muito apoio, e durante mais tempo do que aquele que durará a pandemia”, remata.
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