Os números estão todos ao lado, mas o défice continua a baixar

  • Margarida Peixoto
  • 24 Novembro 2016

As principais metas da execução orçamental estão todas aquém. Contudo, o valor do défice está mais baixo que em 2015. Contribuintes já pagaram mais 1.279 milhões de euros em impostos indiretos.

A dois meses do final do ano, o ministro das Finanças, Mário Centeno, não cumpre nenhuma das metas fundamentais que compõem a execução orçamental. A receita e a despesa totais ficam aquém do esperado, os gastos com pessoal sobem acima do previsto, o IVA devolve menos que o antecipado, as receitas fiscais desiludem. Mesmo assim, Centeno candidata-se a fechar 2016 com um défice abaixo do limite definido por Bruxelas. As contas não têm nada que ver com o que foi projetado no Orçamento do Estado para este ano mas, por enquanto, o saldo final continua a bater certo.

Os dados revelados esta quinta-feira pela Direção-geral do Orçamento mostram que o défice das administrações públicas, registado em contabilidade de caixa (a ótica do Orçamento aprovado na Assembleia da República), ficou em 4.430,4 milhões de euros em outubro.

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O número fica 356,9 milhões de euros abaixo do registado no mesmo período de 2015 e permite ainda uma margem de mil milhões face à estimativa implícita no Orçamento do Estado para este ano, que corresponde a uma meta de 2,2% em contabilidade nacional, a que importa para a Comissão Europeia. Entretanto, o Executivo já reviu a meta, projetando agora o défice nos 2,4%, uma décima a menos do que a meta definida por Bruxelas em julho. Mas o boletim da DGO não atualizou os números tendo em conta o pressuposto da nova meta.

Ainda assim, a informação disponível permite verificar que face às metas iniciais, as principais rubricas da execução orçamental (e as que dependem da decisão direta do Governo) ficam todas aquém. Do lado da receita o efeito para a melhoria do défice orçamental é negativo, do lado da despesa é positivo.

Principais indicadores da execução orçamental

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Fonte: DGO

Impostos indiretos seguram receita fiscal

Os números da DGO mostram que a receita total está a crescer 1,7% quando deveria aumentar 5%. Para este resultado contribui, em parte, o comportamento aquém do esperado da receita fiscal. E aqui, são os impostos indiretos que estão a salvar a execução: até outubro os contribuintes pagaram mais 1.279,2 milhões de euros só por esta via, ao Estado. Enquanto o IRS e o IRC caem a pique, os impostos sobre os combustíveis, o tabaco, o imposto de selo, o imposto sobre veículos têm um comportamento positivo.

De entre os impostos indiretos que mais contribuíram para a receita fiscal até agora destacam-se os impostos sobre os combustíveis, que permitiu arrecadar 852 milhões de euros a mais, e sobre o tabaco, que rendeu mais 241 milhões de euros.

As contas da DGO permitem ver que, do lado dos impostos diretos, a redução da sobretaxa verificada já em 2016 permitiu poupar 281,1 milhões de euros aos bolsos dos contribuintes. Já a revogação do regime dos fundos de investimento, decidida no ano passado mas com impacto nas contas deste ano, tirou 270 milhões de euros ao orçamento.

Em contrapartida, as contribuições extraordinárias pedidas à banca e ao setor energético permitiram compor os cofres públicos. A contribuição das energéticas arrecadada até outubro foi de 87,5 milhões de euros (por comparação com os 53,6 milhões registados em igual período de 2015) e a contribuição extra pedida aos bancos atingiu 204,1 milhões de euros (o que compara com 182,2 milhões até outubro do ano passado).

Este ano, o IVA, o imposto com mais peso, está a ter um contributo discreto: estagnou face a 2015. Contudo, aqui importa frisar que a comparação está influenciada por um nível anormalmente baixo de reembolsos efetuados no primeiro semestre do ano passado, devido à entrada de legislação nova para combater a fraude. Por outro lado, o efeito da redução da taxa dos 23% para 13% na restauração ainda só deverá ser sentido na totalidade em novembro, quando as empresas que se encontram no regime trimestral efetuam pagamentos ao Estado.

Despesa cai com corte no investimento

Para compensar uma receita aquém do esperado, a despesa também tem ficado abaixo do previsto. A contribuir para este desempenho continua o baixo nível de investimento público. O boletim da DGO explica que a queda de 12,7% se deveu sobretudo ao corte do investimento “no âmbito do Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva pela EDIA, que se concentrou na vigência do quadro financeiro plurianual da União Europeia para o período de 2007-2013, bem como o efeito de base associado ao investimento com a construção do Túnel do Marão em 2015”.

Face ao valor que tinha sido registado até setembro, a queda ainda mais abrupta do investimento agora explica-se pela “desaceleração dos encargos com concessões e subconcessões de infraestruturas rodoviárias, os quais têm associada uma cadência de pagamentos própria resultante dos respetivos contratos”, adianta ainda o boletim.

Nos resultados deste mês a despesa com a aquisição de bens e serviços também contribuiu para a diminuição da despesa, mas a DGO explica que se trata sobretudo de um efeito de base, provocado pelo pagamento da ADSE de verbas à Madeira.

Do lado das prestações sociais, a diminuição dos encargos com prestações de desemprego, a par da melhoria do mercado de trabalho, continua a ser outro contributo relevante: estes gastos caíram.

Contudo, o desempenho da despesa poderia ser ainda melhor, não fossem os gastos com pessoal estarem a crescer a cima da meta. É que não é só o efeito da reposição dos salários aos funcionários públicos que se está a verificar. Tal como explica a DGO, há outra razão que está a fazer a despesa crescer: a admissão de novos funcionários, “designadamente o aumento do número de efetivos no Serviço Nacional de Saúde”, bem como “o impacto associado da decisão do Tribunal Arbitral quanto aos concursos de 2004 do IEFP.” A estes fatores soma-se ainda o “efeito associado ao pagamento das compensações por caducidade do contrato do pessoal docente contratado, que passaram a ser devidas em 2016”, lembra a DGO.

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