O que querem os lobbies que estão sentados à mesa do Orçamento?
Dos sindicatos aos mediadores imobiliários, passando pelos municípios até aos patrões, vários são os lobbies sentados à mesa com o Governo. O ECO agrupou as suas reivindicações para o Orçamento.
O Orçamento do Estado para o próximo ano só cruza as portas do Palácio de São Bento no dia 15, mas até lá há muito que discutir. Além das propostas adiantadas pelo Governo e pelos partidos, há ainda que colocar na balança as exigências e sugestões dos muitos lobbies sentados à mesa com António Costa e Mário Centeno: dos patrões aos sindicatos, passando pelos senhorios e municípios.
Depois de um verão salpicado por polémicas, a educação, a saúde e o arrendamento são alguns dos temas mais fortes deste debate, não esquecendo o salário mínimo nacional e as pensões. Para que não se perca no meio de tantas propostas, o ECO reuniu as principais reivindicações dos parceiros do Governo e das associações que querem ver as suas vozes refletidas no documento que servirá de guia às contas do próximo ano.
O que exigem os sindicatos?
Do lado dos sindicatos, a expressão de ordem é “valorizar o trabalho”. Como? Através de um “aumento geral dos salários”, no próximo ano.
Neste sentido, a Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP) defende a fixação do salário mínimo nacional nos 650 euros mensais, a partir de 1 de janeiro de 2019, que compara com os 580 euros atualmente em vigor. Já a União Geral de Trabalhadores (UGT) propõe a subida para 615 euros mensais.
O sindicato de Arménio Carlos pede também a subida de, pelo menos, 4% dos salários da Função Pública e “um acréscimo salarial não inferior a 40 euros por mês. Isto, diz o organismo na sua Política Reivindicativa para 2019, “no quadro de uma política de melhoria do nível de vida dos trabalhadores”.
Idênticas exigências são feitas pelo sindicato de Carlos Silva. “Vai sendo tempo de o primeiro-ministro perceber que as pessoas estão fartas de austeridade. Tem de haver uma nova política de rendimentos para os trabalhadores portugueses, em particular para os trabalhadores da administração pública”, disse o secretário-geral, na reentré.
No que diz respeito à contratação coletiva, a CGTP pede a reposição do princípio de tratamento mais favorável ao trabalhador, a “derrogação da norma relativa à escolha individual da convenção aplicável”, a anulação dos regimes de sobrevigência e caducidades das convenções e a eliminação da norma sobre a “delegação de poderes para negociar em nome da associação sindical”. Quer também que o Governo assegure e dinamize este tipo de contratação e defende a “efetiva negociação coletiva na Administração Pública”.
Ainda no tópico “contratação”, o sindicato de Arménio Carlos sublinha a necessidade de limitar os “fundamentos da contratação a termo”, de sancionar as entidades patronais que usem de modo indevido a contratação a prazo, de combater a utilização abusiva do trabalho temporário através da integração desses trabalhadores nos quadros das empresas utilizadoras “sempre que lhes estejam a prestar um serviço permanente” e de reforçar o pessoal do IEFP encarregue de captar e divulgar ofertas de emprego.
Da contratação ao trabalho efetivo, a CGTP exige a redução dos horários de trabalho para 35 horas semanais, a “garantia de dois dias de descanso semanal consecutivos” e a “consagração de, no mínimo, 25 dias úteis de férias”. Pede também a dispensa do trabalho noturno ou por turnos dos trabalhadores com filhos com menos de 12 anos. Isto, é claro, a requerimento dos pais. Mais, este sindicato defende o aumento das coimas aplicáveis por violação das normas de segurança e saúde no trabalho.
No capítulo das reformas e pensões, a CGTP e a UGT querem um aumento destas prestações, de modo a “melhorar o poder de compra” dos cidadãos. O sindicato de Arménio Carlos defende ainda a reposição dos 65 anos como idade legal da reforma; a eliminação do fator de sustentabilidade, e a possibilidade de todos os “trabalhadores com carreiras contributivas de pelo menos 40 anos terem acesso à pensão de velhice sem penalização”.
Na saúde, os representantes pedem o fim das taxas moderadoras e a garantia de que “todos têm acesso médico e enfermeiro de família”, exigindo ainda o reforço do Sistema Nacional de Saúde.
No polémico setor da educação, a CGTP apoia a “contabilização integral do tempo de serviço prestado” pelos professores (ou seja, nove anos, quatro meses e dois dias e não os dois anos, nove meses e 18 dias propostos pelo Governo) de modo a valorizar estes profissionais e a conseguir a “normalização” das suas carreiras. “É uma reivindicação justa”, corrobora a UGT.
Quanto à fiscalidade, é exigido por ambos os sindicatos o reforço da progressividade dos impostos e o alargamento dos escalões do IRS. A CGTP acrescenta como exigência o englobamento obrigatório de todos os rendimentos (independentemente da sua fonte) e a descida do IVA para 6% sobre todos os bens e serviços do “cabaz básico”, isto é, eletricidade, gás, bens alimentares, vestuário e calçado, produtos de higiene pessoal e doméstica e bens culturais ainda não sujeitos à taxa reduzida.
O que defendem os patrões?
Se no lado dos sindicatos o foco está na valorização dos rendimentos, no lado dos patrões as exigências passam sobretudo pela promoção do investimento, o estímulo das condições de capitalização e financiamento, a melhoria do ambiente de negócios, a adequação do mercado de trabalho e a redução da carga fiscal.
“É tempo de o Governo deixar de olhar para as empresas como meras fontes de receita, mas antes como o motor de crescimento da economia portuguesa. A redução da carga fiscal é necessária, mas a previsibilidade do enquadramento fiscal é igualmente importante”, já notou, nesse sentido, o presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), António Saraiva.
Nas mais de 50 propostas desta associação para o Orçamento do próximo ano exige-se, por isso, o aumento da possibilidade de dedução à coleta para 50% dos lucros retidos que sejam reinvestidos “em aplicações relevantes”, a eliminação do limite máximo do investimento (atualmente fixado nos 7,5 milhões de euros), o alargamento do prazo de obrigatoriedade de exercício da opção de compra (de cinco para dez anos) e a subida de 15 mil euros para 50 mil euros do limite de “matéria coletável para efeitos de aplicação às PME da taxa reduzida de 17%, em sede de IRC”.
Os patrões pedem ainda a aplicação da taxa de IRC de 12,5% a todas as empresas que operem no interior, a eliminação das derramas e o alargamento do regime de Dedução de Lucros Retidos e Reinvestidos a todas as empresas, até 50% da coleta de IRC.
No que diz respeito à capacitação das empresas, a CIP sugere a criação de mecanismo de prestação de serviços de rating e de research para as PME.
Quanto à capitalização e financiamento, o organismo liderado por António Sarava propõe a eliminação do limite de dois milhões de euros do regime de fomento dos capitais próprios e o estabelecimento da possibilidade de amortizar, para efeitos fiscais, o goodwill financeiro nas operações de investimento em participações sociais em empresas (até 5% ao ano). Quer também que se crie uma linha de financiamento público às empresas que tenham sido reestruturadas e um fundo de investimentos com recursos públicos para empresas em situação económica difícil.
No capítulo dedicado à mão-de-obra, a CIP exige que se aloque uma parcela da Taxa Social Única (TSU) a uma conta específica de cada empresa, que poderia ser usada para financiar a formação profissional dos trabalhadores.
A confederação de Saraiva sugere ainda criação de um mecanismo que “permita às empresas cujo volume de faturação não ultrapasse os 200 mil euros anuais” pagar o IRC em três parcelas, com o objetivo de “atenuar as pressões de tesouraria”.
Por fim, a CIP quer garantir que a tributação que incide direta ou indiretamente sobre as empresas não será agravada e que não serão criados novos impostos que afetem as empresas.
Por sua vez, a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) defende que é preciso que o Orçamento para o próximo ano introduza medidas que “reduzam o atual clima de asfixia fiscal das empresas”, nomeadamente a redução da taxa de IRC e das tributações autónomas.
Já a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal sugeriu ao Governo de António Costa que reduza a TSU para as empresas que aumentem a remuneração média dos seus trabalhadores, que elimine o Pagamento Especial por Conta (PEC), que diminua as taxas de tributação autónoma, que desça progressivamente o IRC e que imponha uma majoração em 120% dos encargos suportados com doutorados e ações de formação profissional.
Idênticas reivindicações apresentou a Confederação do Turismo de Portugal: apoia a eliminação do PEC e a redução do IRC, acrescentando a necessidade de se criar um IVA Turístico. Mais, pede a reposição da taxa de IVA de 6% para o golf e da taxa intermédia (13%) para o serviço de bebidas, bem como a abolição da Taxa Turística.
O que exigem os municípios?
Dos patrões às autarquias, a preocupação com a carga fiscal mantém-se. A Associação Nacional de Municípios Portugueses exige que passe a ser aplicada às refeições escolares e à iluminação pública a taxa mínima do IVA (6%).
De acordo com a associação, o agravamento da carga fiscal nesses serviços “foi introduzido no período de crise” como medida “temporária”, pelo que deve agora ser revertido “dado que se trata do cumprimento de tarefas essenciais ao bem-estar e segurança pública”.
As câmaras pedem ainda que as companhias de bombeiros municipais ou de sapadores beneficiem de um programa de financiamento permanente, à semelhança do que acontece com os voluntários. Tal medida justifica-se com a “missão de serviço público dos corpos de bombeiros da administração local”, defendeu o presidente da Associação, Manuel Machado, na apresentação das propostas.
O que exigem os mediadores imobiliários e os senhorios?
Do lado dos profissionais da mediação imobiliária, a prioridade é resolver os problemas habitacionais, especialmente ao nível do arrendamento urbano. “Todos sabemos que existem problemas habitacionais que têm que ser sanados e tal só acontecerá quando houver um mercado de arrendamento que dê resposta às necessidades dos cidadãos”, já salientou, nesse sentido, o presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP).
Entre as propostas apresentadas pela APEMIP, está, por isso, a atribuição de benefícios fiscais aos senhorios que arrendem as suas casas a preços acessíveis e a introdução de um seguro de renda popular.
Dos mediadores para os senhorios, a Associação Lisbonense de Proprietários (ALP) já pediu “tréguas” à ofensiva que, diz, tem sido lançada pelo Governo sobre o imobiliário e propôs “um pacote de medidas transversais de alívio fiscal”.
Entra essas reivindicações está a redução da taxa liberatória dos rendimentos prediais em três pontos percentuais por cada ano de vigência de um contrato de arrendamento (com duração até cinco anos) e a fixação de uma taxa liberatória de 10% para todos os contratos de arrendamento celebrados com prazo superior a seis anos.
Além disso, os senhorios pedem a dedução total do valor do IMI e das Taxas Municipais em sede de dedução à coleta e não ao rendimento, bem como “o aumento das deduções das despesas implicadas no mobiliário, eletrodomésticos e juros e amortizações de empréstimos para obras nos imóveis”.
Quanto ao IMI, a ALP exige também a fixação de uma taxa única de 0,1% a aplicar em todo o país e a eliminação do Adicional ao IMI. Por fim, os proprietários pedem que todos os contratos de arrendamento com rendas congeladas ou que se tenham tornados vitalícios desfrutem de “isenção total de IRS e IMI”.
O que exigem as empresas petrolíferas?
As associações das empresas do setor automóvel e petrolífero — Associação do Comércio Automóvel de Portugal (ACAP) e Associação Portuguesa de Empresas Petrolíferas (APETRO) — estão unidas numa meta comum: repor os incentivos ao abate de veículos em fim de vida, na troca por outros menos poluentes.
Na opinião dos responsáveis, o apoio deveria seguir o modelo espanhol, isto é, estar disponível até se esgotar o orçamento disponível.
Além disso, a APETRO pede a diminuição dos impostos exigidos, o reforço da estabilidade fiscal e o fim do adicional ao ISP. A ACAP, por sua vez, defende o reajuste das tabelas do imposto sobre veículos, bem como uma extensão à gasolina da dedução no imposto sobre o valor acrescentado já aplicada ao gasóleo.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
O que querem os lobbies que estão sentados à mesa do Orçamento?
{{ noCommentsLabel }}