Quem decidiu na Caixa que “assuma as suas responsabilidades”, defende ex-diretor de risco
Antigo diretor de risco da Caixa Geral de Depósitos sugere que houve interferência política na concessão de crédito. E diz que os decisores do banco devem "assumir as suas responsabilidades".
Houve interferência política na concessão de crédito na Caixa Geral de Depósitos (CGD)? “Olhem para o crescimento do crédito nos anos em que começou a crise. E veja o que aconteceu na altura. O crédito cresceu. Quando começou a crise, houve uma política pública de injetar dinheiro”, disse esta quinta-feira o antigo diretor de risco do banco público Vasco d’Orey.
O responsável falava na II comissão de inquérito à recapitalização da CGD e aos atos de gestão. Logo a seguir, Vasco d’Orey acrescentou: “Não estou a dizer que a CGD cumpria ordens [do Governo]. O que estou a dizer é que pode haver uma certa relação entre o crescimento do crédito e aquilo que eram as políticas públicas”.
Vasco d’Orey rejeita que o tenham tentado tirar do banco, dado que era visto como “um pessimista” ou “arauto da desgraça”, sendo ele o responsável pelos pareceres de risco que muitas vezes se mostravam contra operações de financiamento do banco público. “Acha que ia deixar a direção geral de risco naquela altura? Nem pensar”, disse Vasco d’Orey ao deputado Duarte Marques, do PSD. “Acho extraordinário porque não conseguiram. E mais extraordinário é que estive lá dez anos”, notou o responsável.
O antigo diretor de risco entre 2001 e 2010 voltou a dizer que “não era um jarrão” que tenha sido posto de lado nas reuniões que decidiam os grandes empréstimos. “A direção de risco fazia o seu papel. Não podia mandar na CGD. E depois houve pessoas que decidiram sobre ela. As pessoas têm de ter a responsabilidade pelas decisões que tomaram. Que assumam as responsabilidades pelas suas decisões”, exclamou Vasco d’Orey.
"Não estou a dizer que a CGD cumpria ordens [do Governo]. O que estou a dizer é que pode haver uma certa relação entre o crescimento do crédito e aquilo que eram as políticas públicas.”
Lembrou, ainda assim, que “é fácil à segunda-feira decidir quais as substituições o treinador devia ter feito no Benfica”. “O problema é decidir durante o jogo”, considerou ex-diretor do banco público.
“Quem decidiu, decidiu seguramente no interesse da CGD. Pode haver decisões tomadas por motivos que são desconhecidos do risco”, referiu ainda. Isto antes de recordar um episódio que esteve na origem dos Estaleiros de Viana, em Viana do Castelo, uma cidade muito afetada pelo desemprego, quando o Estado decidiu avançar, em 1941, para o projeto e chamou duas pessoas para o executarem.
“O projeto foi financiado em 10 mil contos pela CGD. Foi dado em garantia a hipoteca dos estaleiros e todo equipamento. Era preciso mais? Talvez mais. Queremos a hipoteca dos bens dos dois promotores. Mais? Talvez mais: hipoteca dos bens das mulheres dos dois promotores. Isto para lhe dizer que pode haver operações que têm um outro desígnio e que a CGD pode ter de financiar estas operações”, contextualizou Vasco d’Orey.
“Agora podem perguntar-me como é que eu sei desta história. Foi o senhor de Viana João Cerqueira e o meu avô e as mulheres deles que puseram tudo o que era seu em jogo nos Estaleiros de Viana”, contou.
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