Mercado de arrendamento em estado de alerta com hipótese de englobamento de rendimentos no IRS
Há proprietários que já não estão interessados em continuar a arrendar as suas casas, contou ao ECO, o presidente da Associação Lisbonense de Proprietários, Luís Menezes Leitão.
A opção de englobar os rendimentos prediais no IRS está a deixar o mercado de arrendamento em estado de alerta. No debate parlamentar sobre o programa do Governo, o primeiro-ministro abriu a porta à possibilidade de os rendimentos que são atualmente tributados com taxas liberatórias passem a ser englobados no IRS, sem dar detalhes, ou referências. Foi quanto bastou para deixar os proprietários com casas arrendadas em sobressalto.
“Temos associados que já não estão interessados em continuar a arrendar as suas casas”, contou ao ECO, Luís Menezes Leitão. O presidente da Associação Lisbonense de Proprietários considera que o eventual englobamento vai “agravar mais o mercado de arrendamento” e acusa o Governo de estar a enveredar por esta opção para tentar forçar mais proprietários a aderir ao programa de renda acessível disponibilizado pelo Executivo que na sua avaliação é “um flop total”. “Isto parece uma birra do Governo para ver se mais gente adere ao arrendamento acessível“, diz.
Temos associados que já não estão interessados em continuar a arrendar as suas casas.
“Os proprietários sentem-se perseguidos e vistos com desconfiança“, continua Menezes Leitão, acrescentando que, de acordo com as regras atuais já “entregam um terço das rendas ao Estado”, seja através da taxa liberatória de 28%, seja do IMI ou do AIMI“. “A oferta no mercado de arrendamento vai ter a tendência de desaparecer cada vez mais”, vaticina o responsável, que também é candidato à Ordem dos Advogados.
“Acredito que a intenção do Governo seja boa, em prol da dinamização do programa de arrendamento acessível e da promoção da celebração de contratos de maior duração, mas o efeito que terá no mercado será perverso, como aliás pude confirmar nos imensos testemunhos que tenho recebido”, corrobora o presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária, Luís Lima, em comunicado.
“O resultado do englobamento destes rendimentos acabará por ser o aumento do despejo, dos preços, e das dificuldades dos cidadãos em encontrar casa, devido ao decréscimo da oferta”, acrescenta.
O resultado do englobamento destes rendimentos acabará por ser o aumento do despejo, dos preços, e das dificuldades dos cidadãos em encontrar casa, devido ao decréscimo da oferta.
Para Luís Lima, “os proprietários preferem vender os seus ativos do que disponibilizar as suas casas no mercado de arrendamento nestas condições”. “Esta é uma medida que refletirá uma quebra de confiança no mercado”, alertou, frisando que se está a dar um sinal de que “o imobiliário não é confiável” e de que “as regras estão constantemente a mudar a meio do jogo”.
A falta de previsibilidade fiscal e os sinais errados que são enviados ao mercado são também um dos pontos negativos que o antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais sublinhou ao ECO. Não se pode “passar num ano de 28% para 50%” de tributação. Isto porque caso o englobamento dos rendimentos prediais passe a ser obrigatório, pode, no limite, estar sujeito a uma taxa de IRS de 53%”, explicou Sérgio Vasques. “Seja qual for a opção ela tem de durar”, defende o antigo membro da equipa das Finanças de Teixeira dos Santos, que, no entanto, considera que aplicar uma taxa liberatória de “28% aos rendimentos prediais é extremamente generoso” e englobar estes rendimentos da categoria F no IRS é um simples regressar ao passado.
Na pureza dos princípios, tudo deveria ser englobado. Mas isso nunca foi opção na raiz do nosso código [fiscal].
Mas, para outro antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Carlos Lobo, também de um Governo socialista, optar por este regresso ao passado — só desde 2013, após a reforma do arrendamento urbano, é que os rendimentos prediais passaram a beneficiar de uma taxa autónoma de 28%, sendo que os contribuintes podem escolher a opção que lhes seja mais favorável — vai “destruir o mercado de arrendamento, as rendas vão disparar porque os encargos para os proprietários aumentam”. Para o agora partner da EY, a melhor opção seria “o Executivo não fazer nada”, “não mexer no equilíbrio alcançado, garantindo que se gerem mais rendimentos prediais” e “não “sobrecarregar os proprietários com encargos e maior instabilidade”.
Em declarações ao ECO, Carlos Lobo sublinhou a importância de o Estado “fiscalizar mais” e não ceder ao facilitismo do englobamento que facilita o controlo eletrónico através dos sujeitos passivos e das retenções na fonte. “A ilusão que tudo deve ser tributado tem sempre um efeito pernicioso”, alerta o antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, recordando que a “melhor forma de incentivar a poupança é através do investimento imobiliário”.
Paulo Núncio também já tinha alertado para os efeitos negativos de englobar todos os rendimentos em sede de IRS. O antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais durante o último Governo PSD/CDS-PP, em entrevista ao Jornal de Negócios e à Antena 1, afirmou que se “o Governo avançar para o englobamento total dos rendimentos que hoje em dia estão sujeitos a taxas especiais, muitos milhares de famílias portuguesas poderão vir a sofrer um acréscimo significativo de IRS, isso é evidente”.
A ilusão que tudo deve ser tributado tem sempre um efeito pernicioso.
O Executivo não é alheio a estes alertas e, no primeiro debate quinzenal da legislatura, António Costa disse estar divertido com “especulações” e com relatórios de consultoras que “fazem jeitinhos à direita”, numa referências às simulações feitas que apontavam para um perda de rendimentos mesmo para os contribuintes com rendimentos médios.
O primeiro-ministro sublinhou que nunca foi dito que o englobamento avançava já em 2020, apesar de o Programa do PS prever esse caminho, e que a medida “será tomada no devido tempo”. Fontes governamentais citadas pelo Jornal de Negócios (acesso pago), esta sexta-feira, garantem que a medida não está a ser trabalhada pelo Ministério das Finanças e que apesar de a decisão não estar tomada sobre se é para avançar já ou só para o próximo ano, também não está afastada a hipótese dessa “proposta concreta” surgir ainda no Orçamento do Estado de 2020. Mas terá sempre caráter simbólico, será o reflexo de outra medida não fiscal e terá um impacto limitado na receita.
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