Onde é que a Anacom cedeu à pressão do setor no 5G? E em que partes resistiu?
Alguns dos apelos das operadoras foram ouvidos pela Anacom, mas outros não. O fim dos descontos é um primeiro exemplo, mas a reserva de espetro e os preços iguais estão a merecer críticas.
Já são conhecidas as regras do leilão do 5G. Cerca de nove meses depois de anunciar o regulamento preliminar, a Anacom deu a conhecer ao público o documento final esta semana, que era altamente antecipado no setor. Meo, Nos e Vodafone têm aumentado a pressão sobre o regulador em busca de alterações às regras, ameaçando com boicotes, desinvestimentos e até ações em tribunal.
Aliás, depois de anunciadas as regras, a Nos emitiu um comunicado onde admite recorrer à justiça e à Comissão Europeia para “travar” o regulamento do leilão do 5G, que considera ser “ilegal”. Para a empresa presidida por Miguel Almeida, as alterações introduzidas pela Anacom são apenas “malabarismos para ludibriar” as empresas de telecomunicações já instaladas no mercado português.
Face a isto, vale a pena analisar o que exigiam as operadoras, onde cedeu a Anacom, e em que partes resistiu o regulador liderado por João Cadete de Matos.
Onde resistiu a Anacom
Preços de reserva
Quando a Anacom apresentou o projeto de regulamento em fevereiro, previa preços de reserva dos 58 lotes num total de quase 238 milhões de euros. Já nessa altura, a diferença de expectativas entre as operadoras e o regulador era de quase 50 milhões de euros. Com a pandemia, mais reticentes ainda ficaram as empresas quanto aos investimentos que terão de fazer na quinta geração. Por isso, um dos principais apelos ia no sentido de reduzir os preços de reserva do leilão.
Porém, esta quinta-feira, o presidente do regulador, João Cadete de Matos, disse em alto e bom som que decidiu manter os preços de reserva do leilão do 5G, igualmente em 238 milhões de euros, por considerar que, apesar da pandemia, as empresas de telecomunicações “beneficiam” de “condições de mercado” que lhes permite ter uma “recuperação mais rápida” do que o resto da economia.
Reserva de espetro
As operadoras Meo, Nos e Vodafone são contra a reserva de espetro para “novos entrantes”. Isto significa que a compra de uma parte do espetro que vai a leilão lhes é vedada, promovendo-se a entrada de um quarto operador no mercado nacional.
Aqui, a Anacom resistiu. O leilão do 5G prevê a reserva das faixas dos 900 MHz (limitada a 2 x 5 MHz) e dos 1.800 MHz para novas entidades que entrem no setor.
Licenças da Dense Air
As operadoras são fortemente contra a decisão da Anacom de não expropriar as licenças de 5G antigas que são detidas pela Dense Air. Estas licenças são válidas até 2025, sendo que o regulador tomou a decisão final de proceder apenas a uma reconfiguração do espetro desta empresa, encurtando-o. Há já processos em tribunal contra a Anacom por causa disto, mas o regulador não deu o braço a torcer: a Dense Air pode manter as licenças e começar a operar no mercado grossista.
Onde cedeu a Anacom
Flexibilização do pagamento
Apesar de manter os preços, as operadoras vão beneficiar de uma “flexibilização” na forma de pagamento. “Para atenuar o potencial impacto relativo ao pagamento dos preços finais do espetro disponibilizado no leilão, a Anacom introduziu uma maior flexibilidade face ao inicialmente projetado”, indicou o regulador.
Nesse sentido, “permite agora o diferimento do pagamento de metade do preço final de todas as faixas de frequências e o escalonamento do pagamento diferido por um período de sete anos”. Além disso, “o prazo da caução a apresentar pelos candidatos foi igualmente encurtado, com vista à redução do seu ónus”.
Antes, previa apenas a “possibilidade do pagamento diferido, até cinco anos, de um terço dos preços finais do espetro atribuído nas faixas dos 700 MHz, dos 3,6 GHz e dos 900 MHz”.
Descontos para “novos entrantes”
Inicialmente, a Anacom pretendia dar 25% de desconto aos “novos entrantes”, uma decisão que esteve na base das críticas do setor à Anacom. Este desconto caiu por terra e já não está previsto no regulamento final. Numa conferência de imprensa na quinta-feira, o presidente do regulador explicou que o mesmo, afinal, não é necessário, dado já haver uma reserva de espetro.
Obrigações de cobertura
Outro ponto de pressão da Meo, Nos e Vodafone incidiu sobre a inexistência de obrigações de cobertura para os “novos entrantes”. As empresas temiam a entrada de um novo operador em condições “injustas” face àquelas a que estão sujeitas.
A Anacom ouviu o setor e decidiu a implementação de obrigações de cobertura de rede para uma nova entidade que entre no mercado, caso adotem a modalidade de roaming nacional e/ou adquiram espetro na faixa dos 700 MHz.
Além disso, como estava previsto, as operadoras já instaladas no mercado serão obrigadas a dar acesso aos chamados operadores móveis virtuais — empresas que, não tendo adquirido espetro, pretendem lançar ofertas comerciais sobre a rede das demais operadoras.
Adaptação à estratégia do Governo
O setor criticava a Anacom por ter apresentado um projeto de regulamento desalinhado com a resolução do Conselho de Ministros que veio a determinar a Estratégia Nacional do 5G. Em causa, as obrigações de cobertura para as operadoras que já prestem serviços no setor em Portugal.
Face a isto, a Anacom optou por adaptar o documento aos pressupostos da estratégia nacional, prevendo a cobertura do país em várias fases, até 2025, ano em que 95% do país já deverá ter acesso a redes de quinta geração.
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