Apoio à TAP não é equitativo e desvirtua concorrência com privados, diz CEO da euroAtlantic Airways
O presidente executivo da euroAtlantic Airways nota que na Europa os países estão a dar apoio ao setor, mas que em Portugal apenas as empresas do Estado estão a receber ajuda.
O presidente executivo da euroAtlantic Airways, Eugénio Fernandes, disse esta quinta-feira à Lusa que a falta de equidade entre os apoios que o Estado está a dar à TAP e às companhias privadas desvirtua a concorrência no setor.
“Em qualquer setor, em qualquer situação, se os players que estão a ser apoiados concorrem com aqueles que não estão a ser apoiados, naturalmente – e parece-me obvio – há uma clara afetação do que é uma concorrência sã”, afirmou o presidente executivo (CEO) da euroAtlantic Airways, companhia fundada em 1993 na Madeira e que concorre diretamente com a TAP nas rotas de São Tomé e de Bissau.
“Se temos um concorrente nosso que está a ser apoiado e nós não estamos a ser apoiados, indiretamente isto está a desvirtuar a concorrência, isto a nós deixa-nos extremamente preocupados”, sublinhou o responsável.
Eugénio Fernandes ressalvou que a companhia que dirige não se opõe à ajuda que o Governo está a dar à TAP, que, em 2020, voltou a ser controlada maioritariamente pelo Estado, porém não entende “a falta de equidade para com o setor privado”.
“Nos restantes países da Comunidade Europeia os Estados estão a dar apoio a este setor, que é dito estratégico e que é fundamental que esteja em posição de iniciar a sua operação quando houver a tal retoma do mercado e do turismo, e o que nós assistimos em Portugal é exatamente o contrário, o apoio é apenas direcionado às empresas do Estado e isso é que nos deixa muito preocupados e desagradados”, explicou.
Na semana passada, o Jornal Económico avançou que o Governo estaria a negociar com a Comissão Europeia uma injeção estatal imediata na TAP, que pode ser superior a 200 milhões de euros, para fazer face às necessidades de tesouraria da companhia área, que só estão asseguradas até ao fim de março.
Para a euroAtlantic Airways, trata-se de “mais uma ajuda que ainda vem aumentar mais o fosso entre o apoio que está a ser dado às empresas públicas e não está a ser dado de uma forma equitativa às empresas privadas”.
“Eu diria que, se dão 200 milhões nesta fase à TAP, deviam dar, proporcionalmente à dimensão do setor privado, o apoio ao setor privado”, defendeu Eugénio Fernandes, salientando que as companhias aéreas que não estão a ser ajudadas também estão há um ano a sofrer os efeitos da pandemia no setor.
O CEO da transportadora que atua em nichos de mercado como transporte de carga e voos charter lamentou ainda que a TAP consiga ajudas adicionais que as transportadoras privadas não conseguem, nomeadamente no que diz respeito a garantias de extensão já anunciada por mais um ano e meio das moratórias de crédito bancárias.
Companhia pode dispensar 20 a 30 dos 200 trabalhadores
Perante a crise provocada pela pandemia, a empresa poderá não renovar os contratos a prazo de 20 a 30 dos seus 200 trabalhadores, depois de ter dispensado 150 no ano passado, admitiu à Lusa o CEO.
“Nós acreditamos que, continuando o mercado a não recuperar e com estes sucessivos fechos da economia, proibições de voos, etc, é natural que – não por despedimentos nem por acordos – tenhamos ainda mais uma redução de 10% a 15% dos quadros, por não renovações contratuais”, disse o responsável, em declarações à Lusa.
No ano passado, a companhia aérea reduziu o número de trabalhadores de 350 para 200, sobretudo através da não renovação de contratos a prazo.
“Está a fazer agora um ano que fizemos muitos contratos válidos por um ano, para fazer face ao verão de 2020, esses contratos que estão a acabar agora, não havendo expectativa que o mercado vá recuperar, é natural que não sejam renovados”, acrescentou.
Esta é uma das medidas adotadas pela transportadora aérea para reduzir os custos em 70%, face à queda de 70% nas receitas, devido aos efeitos da pandemia de Covid-19.
“Nós neste momento ainda estamos a ter uma perda líquida todos os meses, ou seja, estamos a ‘queimar’ caixa mensalmente, mas eu diria que, em valor absoluto, já conseguimos fazer uma redução de custo mensal de mais de dois milhões de euros. Para a nossa dimensão é bastante”, disse Eugénio Fernandes.
A transportadora com quase 30 anos de atividade pediu ao Governo, no ano passado, apoios para fazer face à crise causada pela pandemia, além dos apoios transversais acessíveis a todo o setor, mas não obteve ainda resposta. “Tivemos uma reunião [no Ministério das Infraestruturas], mas até agora não tivemos qualquer ação, nem temos qualquer evolução nos contactos. Continuamos a tentar falar com o Ministério da Economia, [mas] não somos recebidos e, pura e simplesmente, fomos deixados sozinhos e isto leva-nos a perguntar se, realmente, o setor privado é importante ou não para o nosso país”, apontou o responsável.
De acordo com Eugénio Fernandes, quando a euroAtlantic pediu ajuda ao Governo, há um ano, o objetivo não se prendia com a obtenção de apoios a fundo perdido, mas antes um apoio para os dois anos seguintes que rondaria os 40 a 50 milhões de euros em isenções e majorações.
“Precisávamos de isenções da taxa social única [TSU], precisávamos de isenções do pagamento do IRC por conta, precisávamos que os custos relevantes para as companhias de aviação, que têm a ver com a manutenção, com as aeronaves, fossem majorados, alargado o prazo para a recuperação dos prejuízos fiscais, etc., toda uma série de medidas que estão ao alcance do poder executivo, no fundo, para aliviar a saída de dinheiro da tesouraria das empresas”, explicou.
“Enquanto nós nos formos aguentando, não nos vão ajudar, quando nós já estivermos prontos para morrer é que nos vão ajudar. Temos de ir para a rua dizer que não temos dinheiro para pagar salários, para sermos ajudados? É isso que o nosso Governo espera das empresas?”, questionou.
Novo aeroporto: “não há luz ao fundo do túnel”
Na mesma entrevista, o presidente da euroAtlantic disse estar “muito preocupado” com o projeto de expansão aeroportuária de Lisboa e considerou importante que haja “uma decisão rápida”. “Isto deixa-nos muito preocupados, não a interrupção na decisão, mas é não haver prazos, não haver timings, não haver uma luz ao fundo do túnel e, por isso, custa-nos muito assistir a esta situação toda, em que, mais uma vez, vamos entrar num prazo de anos de discussão, de estudos disto, estudos daquilo”, disse.
Em causa está a decisão da Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC) de se recusar emitir um parecer prévio de viabilidade do aeroporto do Montijo, devido ao parecer negativo de duas das cinco câmaras municipais envolvidas, seguida do anúncio do Governo de que vai avançar para uma Avaliação Ambiental Estratégica e estudar três soluções, incluindo a construção no campo de tiro de Alcochete.
Eugénio Fernandes admitiu que para a companhia que dirige é importante que haja uma decisão rápida, uma vez que há alguns anos foram “quase expulsos” da sua base, o aeroporto de Lisboa, devido ao crescimento das companhias de baixo custo e do aumento da frota da TAP. “Temos uma necessidade urgente de ter instalações e vemos que andamos há 52 anos com esta discussão do aeroporto”, lamentou o responsável.
“Eu não sou especialista em aeroportos, nem tão pouco em custos desse tipo de infraestrutura, mas, pelo que eu tenho ouvido e lido, o Montijo seria a opção mais rápida e economicamente mais em conta para termos uma segunda infraestrutura [na região de Lisboa], por forma a estarmos preparados para a tal recuperação que toda a gente espera no prazo de três a quatro anos”, acrescentou.
(Notícia atualizada às 17h36 com mais informação)
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