Mexia vai para o penta na EDP. Quanto deu a ganhar (e ganhou) nos primeiros quatro mandatos
António Mexia será hoje indicado para um novo mandato (o quinto) à frente da EDP. Já deu muito a ganhar aos acionistas e recebeu de volta uma remuneração sem paralelo em Lisboa nos últimos 12 anos.
Mais depressa chegou António Mexia ao penta do que o Benfica, o clube do seu coração que procura esse objetivo esta época e foi motivo de polémica para o gestor. É esta quinta-feira que verá o seu nome confirmado para um quinto mandato à frente da EDP. E os números que tem para apresentar são estratosféricos: desde que chegou à elétrica, em abril de 2006, acumulou lucros de mais de 12 mil milhões de euros, sete mil milhões dos quais foram para os bolsos dos acionistas. Mas essa generosidade foi retribuída: entre salários e prémios, Mexia recebeu 20 milhões em 12 anos. É o CEO mais bem pago da praça portuguesa.
Foi com este comunicado em abril 2006, há 12 anos, que se oficializou a entrada de António Mexia na EDP como presidente da Comissão Executiva. Vinha de uma experiência curta enquanto ministro das Obras Públicas do Governo (também ele curto) de Pedro Santana Lopes. O cargo que ocupou nesse ano de 2004 ainda hoje é notícia por causa da história dos CMEC. Mas já lá vamos.
Principal novidade nos novos órgãos sociais da EDP que são eleitos em assembleia-geral de acionistas para um mandato entre 2017-2019: Luís Amado, ex-ministro socialista, será o novo presidente do Conselho Geral de Supervisão, em substituição de Eduardo Catroga (ex-ministro social-democrata), numa transição que acompanha o ciclo político em Portugal — o que se percebe dado aquele conselho ser uma espécie de lóbi de defesa dos interesses da empresa junto do poder político.
Mas não deixa de ser também uma novidade a reeleição de António Mexia. Ele chega à assembleia geral alguns meses depois de o seu nome ter sido colocado em causa pelos acionistas, agastados com as polémicas que foi colecionando no último ano. Foi constituído arguido na investigação do Ministério Público no caso das rendas dos CMEC atribuídas à EDP e onde há suspeitas de corrupção. E não estavam a ajudar também o finca-pé com o regulador que pretende cortar estas rendas em 167 milhões por ano e o seu alegado envolvimento numa operação de fusão da EDP com a Gas Natural.
Mas as dúvidas ficaram dissipadas logo nos primeiros dias deste ano: China Three Gorges, Oppidum Capital, Senfora, Fundo de Pensões do BCP e Sonatrach, os principais acionistas da utility nacional, anunciaram ao mercado a continuidade de Mexia por mais três anos — e mais algumas mudanças nos órgãos de governo da cotada.
Mil milhões de lucro por ano
Em média, a EDP lucrou mil milhões de euros por ano entre 2006 e 2017. Pode-se pensar que não era difícil obter um registo desta magnitude tendo em conta o perfil da empresa que tem atividade num mercado muito regulado e com muitas rendas garantidas. Mas foi com Mexia que a EDP se virou definitivamente para a área das energias renováveis e para o mercado norte-americano, decisões de risco que estão hoje a ser devidamente recompensadas.
Hoje em dia, a EDP Renováveis é um dos principais players mundiais no setor das energias limpas — atingiu lucros de 276 milhões de euros no ano passado e deverá continuar a ser a galinha dos ovos de ouro da EDP. E por isso se percebe a razão pela qual a EDP tentou resgatar no ano passado a totalidade do capital da subsidiária, numa oferta pública de aquisição que resultou num flop tremendo para Mexia, que não estava disponível para abrir os cordões à bolsa. Mas o interesse na EDP Renováveis mantém-se.
Para os acionistas, Mexia é sinónimo de dividendos. Todos os anos foram parar aos bolsos dos investidores uma média de 600 milhões de euros sob a forma de dividendos. Isto corresponde a um payout anual a rondar os 60%. Já todos se habituaram a ver a EDP como a rainha dos dividendos na bolsa nacional. Não há empresa em Lisboa que dê tanto dinheiro aos acionistas.
EDP lucra e dá a lucrar
Fonte: EDP e Reuters
Em termos acumulados, cada ação deu direito a dividendos no valor de dois euros (incluindo o dividendo 19 cêntimos que prevê distribuir este ano). Isto num período de 12 anos em que os títulos apresentaram uma performance ligeiramente negativa. Quando Mexia chegou à EDP, em abril de 2006, cada título da elétrica valia 3,25 euros. Hoje em dia, cada ação transaciona nos 3,105 euros, traduzindo uma desvalorização de 4,5% — já descontando os dividendos distribuídos.
Ação perde quase 5% em 12 anos
Fonte: Reuters
Mas se não há empresa em Lisboa que dê tanto aos investidores, também não há gestor no PSI-20 tão bem remunerado como António Mexia. Entre prémios e salários, já acumulou 20 milhões de euros, segundo detalham os relatórios de governo que a EDP publicou na última década. Dá uma média de 1,6 milhões de euros por ano. É muito? “O meu salário equivale ao de um defesa direito de um clube do meio da tabela. Não me considerando eu um jogador desses”, disse Mexia numa entrevista à Sábado.
Mexia recebeu em média 1,6 milhões por ano
Fonte: EDP e Reuters
Do Benfica à China
É difícil dissociar o nome de António Mexia à história recente da EDP. E aquilo que o CEO da maior elétrica nacional diz tem amplo impacto a nível financeiro, político e social.
Lembra-se quando Mexia disse que ter o Benfica campeão fazia bem à economia portuguesa? “Acho que era bom para Portugal que o Benfica saísse de lá [do jogo decisivo com o FC Porto] campeão, acho que isso teria um efeito positivo no PIB“, afirmou numa entrevista dada ao Diário Económico em 2014. Ainda hoje adeptos de clubes rivais não esquecem a relação afetiva entre Mexia e Benfica.
"Acho que era bom para Portugal que o Benfica saísse de lá [do jogo decisivo com o FC Porto] campeão, acho que isso teria um efeito positivo no PIB.”
Terá sido Mexia quem levou à queda do antigo secretário de Estado da Energia Henrique Gomes, do Governo de Passos Coelho. Henrique Gomes estava em clima de guerra com a indústria elétrica, a quem queria cortar os subsídios — e que tinha a EDP como alvo principal. No braço-de-ferro, o governante perdeu com Mexia e apresentou a demissão em março de 2012.
Jorge Seguro, atual secretário de Estado com a pasta da Energia, já veio dizer que não tem medo de ninguém, muito menos da EDP. “Eu não tenho medo de ninguém, desde logo porque pago todos os meses a fatura e portanto não estou à espera que me cortem a eletricidade”, disse o (ainda) governante em junho passado à TSF, antes de se saber que a ERSE se prepara para cortar as rendas à elétrica no âmbito dos CMEC. Como vai terminar este processo?
Não se sabe ainda mas a verdade é que Mexia é um gestor com forte presença na vida política. Em 2011, esteve ao lado dos chineses quando o Governo português avançou para a última fase da privatização e alienou uma posição de 21,35% da EDP à China Three Gorges, por 2,7 mil milhões de euros.
Com o atual Governo, Mexia também tem mantido uma relação pouco amigável. Tão pouco amigável que por mais do que uma vez o primeiro-ministro veio a público queixar-se do comportamento da EDP.
“A EDP tinha posição dócil e passou a ser hostil desde que o Governo mudou.”
António Costa, 8 de junho de 2017
“Só lamento a atitude hostil que a EDP tem mantido e que representa, aliás, uma alteração da política que tinha com o anterior Governo.”
António Costa, 6 de janeiro de 2018
Duas frases tiradas a papel químico e que demonstram a relação de forças entre poder político e empresa. Será Luís Amado a fazer agora a ponte entre Costa e Mexia. Já foi ministro dos Negócios Estrangeiros e está habituado a lidar com questões de diplomacia.
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