Com o comércio físico restringido pelo estado de emergência, os portugueses vão comprar online na Black Friday. CTT, DPD e Correos esperam dias de pico com centenas de milhares de encomendas.
É certo que a Black Friday começou como uma campanha de compras em loja. Mas, de ano para ano, esta mega promoção tem crescido e cativado cada vez mais o mundo online. Em 2020, a pandemia pode dar um toque final nesta transição, depois de o impacto nos hábitos de consumo ter atirado o comércio eletrónico para valores impensáveis ao longo dos últimos meses, marcados por restrições e pelo confinamento.
Enquanto milhares de portugueses vão fazendo compras a partir do sofá lá de casa, do outro lado, empresas como os CTT CTT 0,00% , DPD e Correos aceleram o passo para dar resposta à chuva de pacotes nos centros de distribuição. Onde a internet tramou o negócio do correio, as entregas de encomendas geraram um novo filão de receita. Sobretudo nesta temporada de pico da Black Friday e da Cyber Monday, entre 27 de novembro e 1 de dezembro, altura ideal para as compras do Natal.
Estas três empresas de distribuição assumem o crescimento do nível de encomendas para valores estratosféricos neste período do ano. Isto depois de vários meses de volumes muito acima daqueles que eram registados em termos homólogos. Quando o pico for atingido, algures nos próximos dias, o registo será significativamente acima do pico da Black Friday do ano passado, que, em alguns casos, poderá ter sido atingido logo em abril, o mês em que os portugueses se fecharam em casa para travar a primeira vaga do coronavírus.
Mas falemos em números. No caso da DPD, a empresa preparou-se para o cenário que considera “mais provável”. “Sendo a nossa previsão um crescimento na ordem dos 50%, e então praticamente tocar nas 200 mil encomendas em dias de pico, temos um reforço neste momento superior a 300 pessoas para este final do ano”, diz ao ECO o presidente executivo, Olivier Establet. O reforço incide mais sobre “as equipas de motoristas e de quem recolhe e entrega encomendas”, mas também para as plataformas logísticas, onde ajudarão na triagem dos pacotes.
A transportadora também se preparou “para algo diferente” do que é a sua “maior previsão”. “Criámos duas novas estações em Lisboa e no Porto, com caráter temporário, precisamente para não haver nenhum estrangulamento da nossa capacidade de triagem“, revela o gestor da DPD em Portugal.
Sendo a nossa previsão um crescimento na ordem dos 50%, e então praticamente tocar nas 200 mil encomendas em dias de pico, temos um reforço neste momento superior a 300 pessoas para este final do ano.
Também o grupo CTT está a contar com volumes de encomendas muito significativos nesta sexta-feira de Black Friday, mas também ao longo do fim de semana e, ainda, na terça-feira de 1 de dezembro, que é feriado nacional e muitas pessoas serão forçadas ao recolhimento obrigatório a partir das 13h00. Muito do tempo livre pode, por isso, ser ocupado a fazer compras na internet.
Alberto Pimenta, diretor de e-commerce dos CTT, recorda que a tendência do comércio online “tem sido crescente ao longo dos últimos anos”. Mas 2020 será naturalmente diferente: “Este ano temos dois efeitos, o efeito estrutural de um crescimento que era mais ou menos sustentado, e agora um efeito conjuntural da pandemia, e alguma incerteza, pois não sabemos quando isto vai acabar. Há, claramente, estes dois efeitos conjugados”, aponta em conversa com o ECO.
O responsável recorda como, em 2019, a Black Friday representou um volume de encomendas de 60% acima da média dos dez meses anteriores. Mas, em abril, a empresa postal já registava volumes “praticamente” 50% acima da média. Seguiu-se um “abrandamento” na fase do desconfinamento, entre maio e junho, período em que algumas pessoas voltaram às lojas físicas. Mas a pandemia não acabou, e voltou em força numa segunda vaga que teve início em setembro. Nesse mês, os CTT já estavam a registar volumes 30% acima a média. “Quer dizer que, quando chegarmos à Black Friday deste ano, vamos chegar aos 50% a 60% acima”, remata Alberto Pimenta.
Em meados deste mês, o grupo CTT realizou o seu e-commerce day, uma iniciativa destinada à promoção deste tipo de negócio. Por essa ocasião, divulgou um estudo que analisou o mercado português, um mercado que, no ano passado, cresceu 20% em valor, para 5,9 mil milhões de euros. Se dúvidas haviam quanto ao efeito da pandemia nas vendas pela internet, veja-se a previsão do grupo: estima um crescimento entre 40% e 60% para este ano de 2020, para um valor muito próximo dos 10 mil milhões de euros.
Já os espanhóis da Correos, que entraram em Portugal em abril do ano passado com a compra de 51% da Rangel Expresso, confirmam também o crescimento da atividade com o impacto da pandemia. “Esperamos um crescimento da nossa atividade superior aos anos anteriores, motivados pelo crescimento da nossa carteira de clientes e pelos novos acordos comerciais recentemente celebrados”, começa por dizer ao ECO o diretor da Correos Express Portugal, Juan Bautista.
O responsável aponta ainda que verificou-se um “crescimento significativo do consumo através do canal online”, tendência que explica com as alterações nos hábitos de consumo. “Nesse sentido, as últimas pesquisas apontam para um crescimento de 25% em termos de frequência de compras online por usuário”, acrescenta. Concretamente para a Black Friday, a Correos em Portugal aponta para “os dados mais recentes”, que indicam que “36% dos consumidores portugueses pretendem fazer as compras da Black Friday e do Natal através do canal online, o que representa mais 22% do que em 2019″.
“Na Correos Express Portugal, preparámo-nos ao longo do ano para enfrentar esta época de maior movimento, a Black Friday e o Natal, que consideramos pela proximidade das datas, serem uma continuação uma da outra. Contamos com uma estrutura sólida em termos de recursos humanos, com experiência e compromisso”, destaca. Mas a empresa antecipou-se também com um reforço em algumas áreas: “Está previsto que, ao nível das plataformas e entregas last mile, sejam incorporados mais colaboradores para fazer face ao pico de encomendas esperadas nas campanhas da peak season“, revelou o diretor.
Quando preparamos as operações, temos sempre de nos preparar para o pico. Mas depois temos de saber gerir um intervalo de 15%, quer para baixo, quer para cima.
Black Friday em estado de emergência
Os portugueses entraram na semana da Black Friday com mais uma renovação do estado de emergência em Portugal. Com o país a registar em torno de 5.000 novos casos diários e cerca de 70 mortes por Covid-19 a cada 24 horas, o Governo viu-se obrigado a avançar com restrições escalonadas por quatro níveis de riscos, onde se insere cada um dos mais de 300 municípios portugueses.
A pesar mais neste período estará, uma vez mais, o recolher obrigatório às 13h00 nos concelhos de risco muito elevado e extremamente elevado, no sábado e no domingo, assim como no feriado de 1 de dezembro, terça-feira. Municípios que representam, como apontou a Marktest esta semana, mais de dois terços do poder de compra do país. A estas medidas soma-se o encerramento dos estabelecimentos comerciais às 15h00 na segunda-feira de 30 de novembro.
“O que acreditamos que vai acontecer é uma época de Natal, independentemente do Black Friday, com recorde total de atividade. E isso tem mais a ver com a falta de confiança da população para voltar às compras tradicionais offline e o estado em que nos encontramos, estado de emergência, com as medidas que são tomadas, que também reforçam esse clima e acrescentam constrangimentos e limitações às compras offline“, resume Olivier Establet, do grupo DPD.
Assim, o pior cenário para as empresas que distribuem seria o de colapso da cadeia de distribuição. Mas nenhum dos responsáveis contactados pelo ECO quer, sequer, pensar nisso. Questionado acerca desse risco, caso as encomendas na Black Friday superem mesmo as estimativas mais elevadas, Alberto Pimenta, do grupo CTT, salienta que a empresa está a preparar-se para esta temporada “desde agosto”, incorporando já uma margem sobre os níveis estimados para esta temporada de pico. “Quando preparamos as operações, temos sempre de nos preparar para o pico. Mas depois temos de saber gerir um intervalo de 15%, quer para baixo, quer para cima”, destaca o gestor.
A contribuir para estas perspetivas está ainda outra tendência: a da diluição da Black Friday ao longo do mês de novembro. Várias marcas estão com campanhas agressivas há já várias semanas. Não há números concretos, mas os vários responsáveis reconhecem essa possibilidade de diluição: “Estou de acordo com essa ideia de que a Black Friday está relativamente diluída ao longo dos últimos dois meses”, diz, desde logo, Alberto Pimenta.
Já Olivier Establet estima que, “apesar de haver esse reflexo de diluição ao longo destas três, quatro ou cinco semanas, não deixará de haver dois dias de pico”. Nomeadamente, na ordem das 200 mil encomendas por dia, “anunciadas para o dia 30 de novembro e o dia 2 de dezembro”.
Todos concordam também que a tendência de crescimento do comércio eletrónico veio para ficar. “É evidente que, durante a pandemia, principalmente durante o confinamento, os hábitos de compra mudaram. Esse facto tem contribuído para o mercado online atingir um nível de maturidade que se esperava apenas nos próximos anos. Neste sentido, é previsível, portanto, que uma percentagem significativa desta atividade se consolide devido aos novos utilizadores do comércio eletrónico e ao aumento da frequência de compra dos existentes”, aponta Juan Bautista, da Correos.
"É evidente que, durante a pandemia, principalmente durante o confinamento, os hábitos de compra mudaram. Esse facto tem contribuído para o mercado online atingir um nível de maturidade que se esperava apenas nos próximos anos.”
Confrontado com a possibilidade de abrandamento em 2021, com uma Black Friday de 2021 inferior até à de 2020 se a pandemia for controlada durante o primeiro semestre, o diretor da Correos não acredita que venha a ser assim. “Não acreditamos que possa ser inferior, o crescimento poderá abrandar se, a nível social, recuperarmos os nossos hábitos diários anteriores à pandemia. Uma alta percentagem de novos consumidores experimentou e verificou os benefícios do canal online e irá continuar a utilizá-lo em maior ou menor grau”, aponta.
“A dúvida poderá ser a capacidade de consumo que a sociedade poderá ter, dependendo do impacto da pandemia na economia global, e isso terá muito a ver com a duração da pandemia”, admite, no entanto, o responsável.
Para já, não é absurdo assumir que o comércio online é também um proxy da economia, que, apesar das restrições à atividade que vieram paralisar alguns setores, continua a registar alguma procura. Com muitos comerciantes a apostarem na internet como canal de vendas, e cada vez mais portugueses dispostos a arriscar uma compra online pela primeira vez, a Black Friday poderá mesmo ser a salvação de alguns negócios neste final de um ano que ficará para a história.
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País em estado de emergência. Empresas de encomendas antecipam loucura da Black Friday
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