Cortiça, calçado e vinhos verdes esperam reforço das exportações
A vitória do democrata Joe Biden nas eleições presidenciais dos EUA é encarada com “expectativa” pelos setores portugueses da cortiça, calçado e vinho verde.
A vitória do democrata Joe Biden nas eleições presidenciais dos EUA é encarada com “expectativa” pelos setores portugueses da cortiça, calçado e vinho verde, para quem o mercado norte-americano assume particular relevância e poderá agora ganhar novo fôlego.
“É bom termos hoje novamente alguém nos Estados Unidos que possa voltar a olhar para as relações com a Europa de uma forma aberta e que reinicie um diálogo histórico e de sucesso entre aqueles que são os dois maiores blocos de consumo e de comércio a nível mundial, com respeito pelas práticas ambientais e pela responsabilidade que os grandes países e nações têm na condução das grandes políticas internacionais”, afirmou o presidente da Associação Portuguesa da Cortiça (APCOR) em declarações à agência Lusa.
Segundo João Rui Ferreira, o desafio já assumido pelo presidente eleito Biden de inversão das políticas ambientais norte-americanas, após o seu antecessor Donald Trump ter decidido abandonar o Acordo de Paris, é “uma boa notícia para todo o mundo” e, em particular, para o setor português da cortiça.
“Os Estados Unidos ambicionam voltar a liderar o mundo no combate às alterações climáticas, trazendo o ambiente para a ordem do dia, e a cortiça, com todo o potencial e com todas as credenciais ambientais e de economia circular que transporta, será certamente um dos produtos ganhadores neste contexto global”, salienta.
Adicionalmente, o líder da APCOR nota que a escolha por parte de Joe Biden (que toma posse em 20 de janeiro) de nomes como Antony Blinken para secretário de Estado e de Linda Thomas-Greenfield para embaixadora nas Nações Unidas- em ambos os casos “políticos com uma perspetiva muito global de diplomacia e de relações globais” – evidencia a vontade de “uma abertura maior nas relações bilaterais nos EUA com outras regiões do mundo”.
“E eu olho com particular atenção para as relações bilaterais entre os Estados Unidos e a União Europeia e, sobretudo, com os países da União Europeia que têm forte produção vitivinícola”, salientou.
Segundo os dados da APCOR, as exportações portuguesas de cortiça para os EUA aumentaram 50% entre 2010 e 2019, passando dos 120 para os 180 milhões de euros, destacando-se este país “tradicionalmente como o segundo maior mercado para as exportações” do setor, a seguir à França, mas que em 2020 terá ascendido à primeira posição do ‘ranking’.
“A cortiça é o segundo maior exportador para o mercado [norte-americano], com cerca de 6 a 7% do total das exportações portuguesas de bens para os EUA nos últimos anos”, destacou João Rui Ferreira.
Não surpreende, por isso, que os Estados Unidos tenham captado a maior fatia do investimento em promoção feito pelo setor na última década e vão agora absorver um terço do orçamento da campanha internacional a iniciar este ano (1,1 milhões de euros de um total de três milhões de euros a investir em promoção entre janeiro de 2021 e meados de 2022).
Também para os vinhos verdes portugueses os EUA se destacam, há já mais de uma década, como o principal mercado de exportação, com compras de 14,5 milhões de euros em 2019 e uma subida percentual de dois dígitos prevista para 2020.
“Até outubro já tínhamos chegado aos 14 milhões de euros, estávamos com um aumento de 14% para o mercado norte-americano, portanto vamos terminar o ano bastante acima disso”, disse à agência Lusa o presidente da Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes (CVRVV).
Segundo Manuel Pinheiro, os vinhos portugueses foram passando “no meio dos pingos da chuva” de tarifas levantadas pela administração Trump sobre vários vinhos europeus, nomeadamente franceses e alemães, pelo que registaram até “alguns ganhos de mercado” face aos concorrentes no mercado norte-americano.
Convicto, por isso, de que a mudança de liderança nos EUA “não irá beneficiar ou prejudicar” diretamente a região dos vinhos verdes, o presidente da CVRVV considera, contudo, que a previsível alteração da “política estratégica” norte-americana face à União Europeia favorecerá as relações comerciais entre os dois blocos e, logo, também o setor.
“Parece-nos que o ambiente de diálogo União Europeia/EUA se vai favorecer, o que é importante para as tarifas e para a proteção nos Estados Unidos das denominações de origem europeias, que é um ponto muito relevante para nós. Portanto, vemos com expectativa positiva esta evolução, mesmo não tendo o nosso setor sido muito prejudicado”, afirmou.
Destacando-se como o maior importador mundial de calçado, os EUA foram há já alguns anos assumidos como “o mercado com mais potencial de crescimento para a indústria portuguesa de calçado e de artigos de pele”, conforme recordou à Lusa o diretor de comunicação da Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado, Componentes, Artigos de Pele e Seus Sucedâneos (APICCAPS).
“Esta radiografia mantém-se válida. Os Estados Unidos são o mercado mais relevante, onde todas as grandes marcas internacionais estão presentes”, reiterou Paulo Gonçalves.
Salientando que, nos últimos cinco anos, as exportações de calçado português para aquele país “quase que duplicaram”, Paulo Gonçalves precisou que as vendas para os Estados Unidos e Canadá se aproximam já dos 100 milhões de euros, dos quais cerca de 80 milhões para os EUA, o que traduz um crescimento de “quase cinco vezes” face aos 20 milhões de euros do início da década.
Esta “grande expectativa” do calçado face ao mercado norte-americano foi, contudo, refreada durante a presidência de Trump, dadas as “dificuldades adicionais” criadas com a suspensão do acordo de livre comércio entre a União Europeia e os EUA, designadamente “um conjunto de barreiras alfandegárias e não alfandegárias que impede as empresas portuguesas de serem mais competitivas naquele mercado”.
“Ainda que nos últimos quatro anos as nossas exportações para os Estados Unidos não tenham deixado de crescer, foram anos frustrantes, na medida em que as expectativas que tínhamos com a assinatura deste acordo de livre comércio e o desenvolvimento natural do mercado que esperávamos não aconteceu”, explicou o diretor de comunicação.
Com a tomada de posse de Joe Biden, a APICCAPS aguarda a retoma do acordo de livre comércio com a União Europeia, considerando que “pode ser uma excelente oportunidade para as empresas portuguesas”: “Devido à pandemia estamos numa fase completamente extraordinária das nossas vidas, mas, assim que tivermos condições de regressar aos mercados, um dos países onde vamos apostar vai ser certamente o norte-americano”, assegurou Paulo Gonçalves.
Nova Iorque, Boston, Atlanta, Chicago, San Francisco e Los Angeles são as seis cidades identificadas pela associação como podendo ser “muito interessantes para as empresas portuguesas de calçado”, pelo que serão o alvo direto do setor, avançou.
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