O mundo de Isabel dos Santos está a mudar
Isabel dos Santos abandona o BPI por força da OPA do CaixaBank, mas sai em grande. Fica com a fatia de leão do lucrativo negócio do BFA. E mantém protagonismo na banca portuguesa com BIC e BCP.
Isabel dos Santos pode ter saído do BPI na sequência da Oferta Pública de Aquisição (OPA) do CaixaBank, mas continua a manter bem vivo o interesse no sistema financeiro nacional. Ao mesmo tempo que vendia a sua posição de 18,5% aos espanhóis, a empresária angolana via a Sonangol (empresa estatal que lidera) reforçar o seu protagonismo no rival BCP. Se a OPA espanhola foi inicialmente encarada como um revés à estratégia de Isabel dos Santos, a própria fez questão de virar o tabuleiro a seu favor no decorrer do processo: a sua Unitel ficou com a maioria do lucrativo negócio do BPI em Angola (o BFA) e abandona agora o capital do BPI, onde entrou em 2009, com um ganho de 80 milhões de euros.
Em Portugal, Isabel dos Santos detém ainda uma participação importante no BIC Portugal — também através da Santoro, com 42,5%. Aliás, o BIC Angola, criado em 2005 por Fernando Teles e que contou também com a participação de Américo Amorim, marcou o início do percurso da filha do presidente angolano na atividade bancária. Mas qual o interesse da empresária no setor financeiro?
“Estes movimentos de ligações financeiras, comerciais, económicas pós-coloniais têm objetivos estratégicos para os angolanos. Com a participação nos bancos em Angola têm acesso ao crédito, e com as conexões financeiras acedem aos circuitos financeiros internacionais através de bancos europeus”, refere o jornalista Filipe S. Fernandes, autor do livro “Isabel dos Santos – Segredos e poder do dinheiro”.
"Estes movimentos de ligações financeiras, comerciais, económicas pós-coloniais têm objetivos estratégicos para os angolanos. Com a participação nos bancos em Angola têm acesso ao crédito, e com as conexões financeiras acedem aos circuitos financeiros internacionais através de bancos europeus.”
Foi em outubro de 2007 que o BIC teve autorização para operar em Portugal. Um negócio que ainda hoje levanta dúvidas aos supervisores. No início deste ano, respondendo a questões colocadas pelos eurodeputados, a Autoridade Bancária Europeia (EBA, na sigla em inglês) defendeu um maior controlo do Banco de Portugal em relação aos interesses da empresária angolana no sistema financeiro nacional.
Em concreto, a EBA pediu ao supervisor português “a adoção de todas as medidas necessárias para a supervisão específica da instituição de crédito e para assegurar a eficácia das regras adotadas sobre a governança corporativa e a luta contra a lavagem de dinheiro no contexto dos acionistas do banco BIC“. Da instituição liderada por Carlos Costa, a EBA recebeu a garantia de que estava a resolver “algumas deficiências”.
"[Cabe ao Banco de Portugal] a adoção de todas as medidas necessárias para a supervisão específica da instituição de crédito e para assegurar a eficácia das regras adotadas sobre a governança corporativa e a luta contra a lavagem de dinheiro no contexto dos acionistas do banco BIC.”
Mais mudanças na vida de Isabel dos Santos deverão acontecer já este ano. Os angolanos vão às urnas e José Eduardo dos Santos não é candidato a prolongar uma presidência que dura há 37 anos. Os analistas acreditam que será a oportunidade de o MPLA retirar poder e influência à família dos Santos. Algo que deverá ter impacto imediato na vida profissional empresária angolana, já que admite antecipar a sua saída da petrolífera Sonangol para se dedicar exclusivamente à sua atividade privada.
Mas, aconteça o que acontecer, o BCP deverá escapar mesmo à gestão direta da Sonangol e da própria Isabel dos Santos. Está em curso uma reestruturação profunda na petrolífera estatal que prevê uma separação dos diferentes negócios da empresa. A participação no maior banco português, que deverá aumentar nos próximos meses, será transferida para uma subholding que passará a responder diretamente ao Estado angolano. E dos Santos e a Sonangol passam a centrar atenções na sua atividade principal: o petróleo.
“Não estávamos a controlar os nossos ativos — os nossos ativos no petróleo — tanto quanto queríamos e, principalmente, faltava-nos visão estratégica. (…) A minha visão é tornar a Sonangol muito rentável”, declarou a angolana ao Financial Times em dezembro passado, a propósito do plano de recuperação que está a empreender na petrolífera estatal.
Isabel dos Santos chegou ao BPI justamente por via do BCP, em dezembro de 2008, quando o Itau vendeu a sua participação ao La Caixa que, depois, alienou uma fatia a Isabel dos Santos. O reforço no BIC é feito via BIC Angola, e faz subir para mais de 20%, mas indiretamente porque parte pertence a Fernando Teles.
No decorrer da OPA do CaixaBank, a empresária angolana chegou a propor uma mega fusão entre o BPI e o BCP, como forma de contrariar o domínio espanhol. A proposta não convenceu, mas Isabel dos Santos não ficou por aqui. Para aprovar a venda do BPI ao grupo catalão, o banco português teria de dar o controlo maioritário a Isabel dos Santos — por esta altura, também o Banco Central Europeu (BCE) pressionava a venda como forma de reduzir a exposição do BPI ao mercado angolano.
A 5 de janeiro deste ano, a Unitel oficializava a compra de 2% do Banco de Fomento de Angola (BFA) ao BPI por 28 milhões de euros, passando assim a controlar 51,9% do capital do banco. Um negócio que muitos consideraram uma “pechincha” — e uma vitória — para Isabel dos Santos em face da rentabilidade do BFA. Percebe-se. O BPI registou em 2016 lucros de 313,2 milhões de euros, com o BFA a dar um contributo de 162,7 milhões, o mais elevado de sempre.
A empresária angolana sai do BPI mas não abandona o protagonismo na banca portuguesa. O mundo da Isabel dos Santos está a mudar.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
O mundo de Isabel dos Santos está a mudar
{{ noCommentsLabel }}