“Salário mínimo” da Função Pública arrisca pagar IRS
O Governo diz estar disposto a aumentar os funcionários públicos acima da inflação (0,3%), mas se a subida superar os 24 euros os salários mais baixos arriscam pagar IRS, pela primeira vez.
O Ministério de Alexandra Leitão chamou os sindicatos da Função Pública para negociar aumentos remuneratórios acima da subida de 0,3% já garantida, mas se o reforço acabar por ser superior a 24 euros os trabalhadores que recebem o “salário mínimo” do Estado passam a pagar IRS, algo que nunca antes aconteceu, garante ao ECO o dirigente da Federação de Sindicatos da Administração Pública (FESAP).
O Ministério das Finanças publicou, esta terça-feira, em Diário da República as novas tabelas de retenção na fonte de IRS, que estarão em vigor em 2020. É com base nesse despacho que se calculam os descontos mensais a aplicar aos rendimentos dos trabalhadores dependentes e dos pensionistas.
À semelhança do que aconteceu no último ano, este ano, o limite até ao qual os rendimentos estão isentos subiu, de 654 euros para 659 euros. Tal é resultado do aumento do mínimo de existência, que por sua vez decorre da atualização do Indexante dos Apoios Sociais (IAS) à boleia da inflação registada em 2019.
Tradicionalmente, o aumento do salário mínimo nacional também contribui para a fixação desse patamar, mas este ano tal remuneração subiu para o mínimo que já estava em vigor na Função Pública (635 euros), pelo que não deve ter tido grande influência no desenho destas tabelas.
A propósito, em 2019, o Governo garantiu ter tido em consideração o aumento da base remuneratória da Função Pública para 635 euros na definição do limite a partir do qual se aplica retenção na fonte. Isto porque, se se mantivesse o patamar mínimo anteriormente em vigor (632 euros), os trabalhadores do privado a receber o salário mínimo nacional (600 euros) continuariam isentos, mas funcionários públicos que auferiam o mínimo público passariam a ter de pagar IRS, todos os meses.
Este ano, o Governo decidiu aumentar em apenas cinco euros o limite mínimo a partir do qual se aplicam as taxas de retenção (de 654 euros para 659 euros). Resultado: os salários mais baixos do Estado (atualmente, 635,07 euros) só ficam isentos de IRS se subirem menos de 23,93 euros por mês, em 2020. Caso contrário, as remunerações mais modestas da Função Pública ficarão, pela primeira vez, sujeitas ao pagamento de IRS.
“Nunca a remuneração mínima na Administração Pública pagou IRS e esperamos que continue a não pagar, porque são rendimentos muito baixos”, diz José Abraão, da FESAP, ao ECO.
Depois de, em dezembro, ter dado por concluído o processo negocial com os sindicatos da Função Pública sobre aumentos salariais, o Ministério da Modernização do Estado e da Administração Pública decidiu marcar uma nova ronda negocial sobre a matéria para 10 de fevereiro.
Alexandra Leitão adiantou que, afinal, irá propor aos funcionários públicos um reforço remuneratório superior aos 0,3% já anunciados no final de 2019. De acordo com fontes citadas pela TVI, o Governo está disponível para reforçar os aumentos dados aos assistentes operacionais (que recebem atualmente os tais 635,07 euros) e aos assistentes técnicos (que recebem 683 euros), estando em cima da mesa um aumento de 37,5 euros para os primeiros. A estação de Queluz de Baixo sublinha, contudo, que esse aumento deverá ser feito de forma faseada.
Se tal se confirmar, os funcionários públicos que recebem o “salário mínimo” do Estado arriscam, pela primeira vez, a ver os seus rendimentos sujeitos a retenção na fonte. Com mais 37,5 euros, a remuneração mais baixa do Estado subiria para 672,57 euros, expondo estes trabalhadores a uma taxa de retenção de 0,1%, isto é, perderiam 0,67 euros do salário todos os meses e quase dez euros ao fim de um ano.
A FESAP defende, por sua vez, aumentos de 2,9%, o que se traduziria num acréscimo de 18,42 euros para estes trabalhadores, mantendo assim os seus rendimentos no escalão que beneficia da isenção.
O mesmo já não aconteceria se o Governo concretizasse a proposta da Frente Comum, que defende um aumento de 90 euros para todos os trabalhadores. Nesse caso, o “salário mínimo” do Estado passaria a estar sujeito a uma taxa de 7,3%, no caso, por exemplo, dos contribuintes solteiros e sem dependentes.
Em conversa com o ECO, Ana Avoila salienta que “não há nenhuma norma que diga” que os funcionários públicos com salários mais baixos não paguem IRS, não tomando a decisão tomada pelo Governo nas tabelas de retenção como qualquer indicação para a reunião com Alexandra Leitão marcada para 10 de fevereiro.
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