Das videochamadas ao dress code, o trabalho será cada vez mais informal?
A pandemia mundial obrigou a um distanciamento físico por parte das equipas e originou novas formalidades ao nível do cumprimento de regras de higiene e prevenção.
A forma como trabalharmos transformou-se. Relacionamo-nos virtualmente, as ferramentas tecnológicas passaram a fazer ainda mais parte do nosso dia-a-dia, não nos vestimos para trabalhar como antes e os próprios escritórios já não podem cingir-se a quatro paredes.
A pandemia mundial obrigou a um distanciamento físico por parte das equipas e originou novas formalidades ao nível do cumprimento de regras de higiene e prevenção. Mas, por outro lado, e um pouco paradoxalmente, o atual contexto também tem trazido mais descontração e informalidade às relações humanas no trabalho e, ao mesmo tempo, tem criado escritórios mais humanos e flexíveis.
Num mundo em constante transformação, em que nada é garantido, os desafios do trabalho parecem ser cada vez mais paradoxais. Se teletrabalhar é sinónimo de escritórios dentro de casa, de videochamadas e de autonomia, como é possível que a distância física possa mesmo contribuir para “aproximar” equipas?
“A interação remota está mais descontraída e informal”
As reuniões diárias por videochamada já fazem parte da rotina de muitos colaboradores. Se, no início do teletrabalho obrigatório, comunicar através de plataformas como o Zoom ou o Google Meet podia parecer complicado e até formal, agora, ver os colegas através do ecrã do computador ou do telemóvel, conhecer o seu espaço de trabalho em casa, algumas das suas rotinas mais pessoais, o seu fato de treino ou até algum familiar que já tenha sido “apanhado” pela câmara em alguma meeting, já aconteceu a quase todos os profissionais.
“A interação remota está mais descontraída e informal. São poucas as organizações cuja interação remota entre colaboradores, antes da pandemia, fosse predominante”, começa por dizer Elísio Sousa, chief operating officer (COO) na Harpoon.jobs. “Após um período inicial de adaptação a essa nova realidade, os colaboradores começam a deixar entrar nestes momentos partes de si que normalmente estariam reservadas: um fundo com fotografias de família, um pedido inesperado para pausar a reunião e ir acudir a um dos filhos… são detalhes que podem até reforçar a relação com o interlocutor virtual”, afirma.
Um fundo com fotografias de família, um pedido inesperado para pausar a reunião e ir acudir a um dos filhos… são detalhes que podem até reforçar a relação com o interlocutor virtual.
Os bons gestores de pessoas e as organizações mais preparadas olham — agora — para as videochamadas como uma nova ferramenta, que tem o potencial de amenizar a distância social a que as equipas estão sujeitas. “Saber deixar entrar o ‘informal’ e abordá-lo de forma natural reduz a ansiedade por parte dos colaboradores e transmite a ideia de que o importante é o conteúdo e não a forma”, acrescenta o COO.
Para Fernanda Marmelo, people business partner na Sage, após tantos meses em casa — e já num misto entre ambiente familiar e ambiente profissional — “há momentos em que todos nos permitimos uma postura mais descontraída”. No entanto, ter em conta o contexto e os interlocutores é fundamental para saber quando é que, realmente, se pode permitir essa postura, salienta Fernanda Marmelo.
Estará o vestuário mais casual a invadir os escritórios?
O aumento da flexibilidade no escritório e da informalidade nas relações trouxe, também, alterações ao nível do vestuário. Mas, em algumas empresas, as mudanças começaram ainda antes da pandemia. Na Sage, Fernanda Marmelo diz que o lema sempre é “descontraídos, mas profissionais”.
“Nunca tivemos um código de vestuário e os nossos colegas nunca se sentiram pressionados a terem de se vestir de forma formal ou sem estarem confortáveis. Temos uma equipa muito jovem, também, o que acaba por ser um facilitador neste aspeto”, refere. Agora, a trabalhar remotamente a partir de casa, “já percebemos que, em algumas reuniões que se iniciam muito cedo, alguns colegas não ligam a câmara… Talvez porque ainda estão de pijama”, conta em tom de brincadeira.
Ainda que não seja esse o caso da multinacional britânica, a verdade é que os meses em teletrabalho levaram milhares de profissionais a deixarem de lado os fatos, as gravatas e outras peças de roupa mais formais que alternavam com vestuário mais casual para os fins de semana. A tendência para um vestuário mais casual tem-se sentido um pouco por todos os setores de atividade e levou mesmo alguns retalhistas à falência, como foi o caso da loja de fatos dos Estados Unidos Brooks Brothers, um dos mais antigos.
O escritório “não termina nas suas quatro paredes”
Flexibilidade e agilidade são as palavras de ordem para o escritório do futuro. “As exigências ao nível dos cuidados de higiene implicam escritórios mais amplos, menos pessoas em permanência simultânea no escritório e espaços preparados para colaborar de forma 100% remota e digital. Se antigamente se entendia o bom lugar para trabalhar como um sítio com espaços de lazer para os seus colaboradores, hoje a gestão de topo terá de construir um escritório que não termina nas suas quatro paredes“, afirma Elísio Sousa.
"Se antigamente se entendia o bom lugar para trabalhar como um sítio com espaços de lazer para os seus colaboradores, hoje a gestão de topo terá de construir um escritório que não termina nas suas quatro paredes.”
Os escritórios passam a ter de estar otimizados para que o tempo passado pelos colaboradores no escritório seja o mais eficaz e produtivo possível e, ao mesmo tempo, permita conciliar a vida pessoal e familiar de forma saudável.
Na Sage, não há dúvidas de que o futuro do trabalho é híbrido. A empresa está a transformar os seus escritórios em lugares mais colaborativos, tornando-os espaços onde se desempenha o trabalho de forma mais eficaz e eficiente. “Já não existem gabinetes nem mesas de trabalho específicas para determinadas funções. O trabalho em equipa e o bem-estar são a nossa principal prioridade”, diz Fernanda Marmelo.
Nos escritórios do futuro também as relações entre colegas “informalidade, proximidade e espírito de colaboração” são chave. Aliás, já são. “Nesta nova realidade, foram chave para a continuidade do negócio e para o trabalho eficiente e entre equipas”, remata.
E, ainda que o distanciamento social possa criar ansiedade naquilo que é o contacto humano natural, “se há aprendizagem retirada deste período complexo é que o ser humano e as organizações só prosperam quando colaboram, se respeitam e reconhecem. Este é o caminho a seguir para ter sucesso no ‘next normal'”, considera Elísio Sousa.
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