Maioria absoluta ou geringonça? O que os empresários querem do próximo Governo é “estabilidade”
Cinco líderes explicam o que esperam da legislatura. Se, por um lado, uma maioria permitiria reformas mais profundas, por outro, o que importa é a capacidade governativa.
Estabilidade: é este o grande desejo dos empresários para o próximo Governo. Rumo às eleições legislativas e com as sondagens a atribuírem a vitória ao PS de António Costa, cinco líderes do setor empresarial falaram com o ECO sobre o que esperam da próxima legislatura.
“Qualquer que seja o próximo Governo, o ponto importante é que a economia portuguesa possa florescer, possa crescer no mundo e, sobretudo, que Portugal possa ser percebido como um país de bom investimento, onde a previsibilidade e estabilidade regulatória, mas também a atratividade para o investimento sejam bem-vindas“, diz o CEO da Galp, Carlos Gomes da Silva.
O que fomos vivendo [nos últimos quatro anos] foi em convergência para o caminho da estabilidade. Agora é preciso consolidá-lo.
A posição é partilhada por Mário Vaz. “O importante é que haja estabilidade, que haja Governo, que se tomem as medidas adequadas para a aceleração do crescimento e da competitividade da economia portuguesa”, sublinha o presidente executivo da Vodafone Portugal, em declarações ao ECO, à margem da entrega dos Investor Relations & Governance Awards (IRGAwards) da Deloitte.
“Enquanto gestor, interessa-me mais que haja estabilidade, acima de tudo”, corrobora o CEO da Impresa Francisco Pedro Balsemão. “Estabilidade económica, estabilidade para que o país possa continuar a crescer através da exportação, que é muito importante para a nossa área de negócio — a comunicação social”, pede o gestor de media, detentor da estação atualmente líder de audiências em Portugal.
Impostos: manter ou mudar?
No que os gestores não concordam é relativamente à forma como será conseguido o crescimento estável do país, numa altura em que o próximo Governo terá de lidar com uma economia em desaceleração. Gomes da Silva — gestor da indústria petrolífera que é especialmente permeável a possíveis alterações fiscais que o próximo Governo possa trazer — considera que a estabilidade deve ser “transversal a todas as áreas da economia”, incluindo a fiscal.
No Orçamento do Estado para 2019 dicou decidido que não haveria medidas no Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (ISP), mas o Executivo optou por eliminar, através de uma portaria, o adicional ao ISP, em vigor desde 2016, o que resultou numa descida de três cêntimos no preço da gasolina. Ainda assim, os impostos levam 60% do valor que os portugueses pagam na bomba no momento em que abastecem o carro.
Jorge Rebelo de Almeida, CEO do grupo Vila Galé, discorda, porque não foram tomadas as medidas que no seu entender são necessárias. “Diria que este Governo foi muito equilibrado, tomou algumas medidas no contexto em que governou com o equilíbrio relativamente instável, mas não tomou as medidas que devia ter tomado“, afirmou o gestor.
O importante é que haja estabilidade, que haja Governo, que se tomem as medidas adequadas para a aceleração do crescimento da economia e da competitividade da economia portuguesa.
A par das exportações, tem sido também o consumo, em especial de turistas, um dos principais motores da economia portuguesa nos últimos anos. O turismo é, aliás, um dos argumentos usados pelo Executivo para o aumento da carga fiscal, que está no valor mais alto de sempre (35,4%) — que sobe à boleia do aumento das contribuições, onde se inclui a Segurança Social, e não de uma alteração das taxas de imposto.
E é no turismo que Jorge Rebelo de Almeida opera. Fundador do segundo maior grupo de hotéis em Portugal considera que a descentralização e os impostos são os pontos-chave para as políticas de expansão do país. “Precisamos de uma reforma fiscal a sério e equilibrada. Não é para deixarmos de pagar impostos, mas sim para que os impostos sejam equilibrados”, sublinha. “Outra coisa que é fundamental é criar incentivos para o desenvolvimento do interior. O meu grande desejo para a próxima legislatura é que o país se expanda, porque ficar tudo concentrado no litoral é excessivo”, acrescentou Rebelo de Almeida.
Coligações vs maioria absoluta
As políticas a implementar pelo próximo Governo vão depender se o PS consegue atingir a maioria absoluta ou se terá de recuperar a geringonça com os partidos à esquerda. As sondagens deixam em aberto se António Costa conseguirá governar sozinho e os empresários não se alongam sobre se consideram que uma maioria absoluta seria ou não uma situação mais positiva.
No que concordam é no desejo de que sejam celebrados acordos que não criem entraves à governação. “Com maioria ou com coligações que permitam essa mesma estabilidade, bom para o país é ter uma maioria parlamentar que promova e tenha a coragem de, finalmente, fazer as reformas de que o país necessita para avançar”, diz António Saraiva, da CIP – Confederação Empresarial de Portugal.
Apesar disso, o representante dos patrões não desvaloriza a importância de uma maioria absoluta, lembrando que nos últimos quatro anos — em que o PS de António Costa liderou sem maioria absoluta graças ao acordo de incidência parlamentar com PCP e BE — houve entraves. Saraiva considera que as diferenças entre os três partidos não permitiram reformas mais profundas, que poderão ser levadas a cabo com uma maioria absoluta.
“O que o país necessita é de uma estabilidade parlamentar de partidos que tenham a mesma atitude perante a Europa, a mesma atitude perante a economia, que não ostracizem a economia e a iniciativa privada e, já agora, que dignifiquem os empresários deste país”, frisou, o responsável que já divulgou o seu caderno reivindicativo para as legislativas.
Nos últimos quatro anos, apesar de haver uma maioria parlamentar, as contradições e diferenças de cada um dos partidos promoveu não permitiram reformas. O que o país necessita é de uma estabilidade parlamentar de partidos que tenham a mesma atitude perante a Europa e a economia.
Balsemão também coloca o ónus mais na estabilidade governativa do que na maioria absoluta e diz que gostaria de ver maior proximidade entre o PSD (partido do qual o pai Francisco Pinto Balsemão foi fundador) e o PS. “O país precisa de ter maior coesão. Precisa dos pactos de regime, que caíram em desuso, entre os principais partidos, que têm uma visão mais comum e mais uniforme para fazer face ao pode vir lá de fora que não controlamos“. Governo e PSD ainda chegaram a ensaiar dois acordos sobre matérias estruturais — fundos comunitários e regionalização –, mas apesar da disponibilidade de Rui Rio para prosseguir nessa senda, nomeadamente em termos de reformas estruturais, António Costa já fechou essa porta por não concordar com as posições dos social-democratas nesta matéria.
Num mundo globalizado, o líder do setor dos media considera que os partidos se devem unir para uniformizar a voz de Portugal na União Europeia, especialmente em questões como a emergência climática, digitalização ou a concorrência de gigantes tecnológicas como o Facebook ou a Google para as empresas portuguesas.
“O mundo está em profunda transformação”, concorda o CEO da Galp. “A estabilidade e a previsibilidade são as únicas formas de podermos levar essa transição de maneira entusiasta, inovadora e rápida. Se não tivermos essa estabilidade, penso que teremos, todos, mais dificuldades. O que fomos vivendo [nos últimos quatro anos] foi em convergência para o caminho da estabilidade. Agora é preciso consolidá-lo“, acrescentou.
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