Os 10 nós que a Nação vai ter de desatar até ao fim do ano
O Parlamento debate hoje o Estado da Nação, numa altura em que vários desafios se levantam ao país no horizonte. Da pandemia às contas públicas, estes são os dez nós que a Nação vai ter de desatar.
O debate anual do Estado da Nação é sempre um momento de balanços e de autoavaliação. O país é convidado a olhar “para dentro”, percebendo como chegou aqui e que desafios tem pela frente. Porém, num período marcado pela pandemia, os desafios são acrescidos. É preciso estabilizar a sociedade e as empresas e garantir mão firme nas contas públicas.
Para assinalar o debate que tem lugar esta sexta-feira no Parlamento, o ECO compilou os principais nós que Portugal vai ter de desatar até ao fim do ano. Não são apenas desafios políticos. Alguns são apelos à ação do setor privado. Outros dependem bem mais do comportamento dos portugueses. Conheça-os em mais detalhe.
Baixar os números da pandemia
É, provavelmente, o nó mais difícil de desatar e aquele que mais impacto tem em todos os outros. Resolver este imbróglio, que poderá tomar novas proporções quando começar a temporada da gripe, é responsabilidade do país como um todo. De um lado está o Governo, ao qual cabe a missão de desenhar as políticas públicas para garantir que a pandemia se mantém sob controlo e que são suficientes os meios disponíveis. Do outro, as autoridades de saúde, com a complicada tarefa de identificar e mitigar novos surtos, tão rápido quanto possível.
Mas tudo isto só é possível se cada português cumprir as ordens das autoridades competentes e mantiver o devido distanciamento social, o que nem sempre é fácil numa altura em que muitos já estão cansados do confinamento. As empresas também são chamadas e têm de implementar eficazmente as medidas de prevenção em vigor a cada momento. Ao setor social, cabe o dever de assegurar o máximo de ajuda possível às camadas vulneráveis da população, que são das mais prejudicadas pela crise.
Fechar um Orçamento do Estado para 2021
Os políticos da Nação terão de se entender em torno de um Orçamento do Estado para 2021 que puxe pela economia portuguesa, protegendo os rendimentos dos cidadãos, muitos deles sem emprego, mas que também garanta condições para as empresas funcionarem em plena pandemia.
O Governo terá de encontrar entendimentos com os vários partidos, ao mesmo tempo que a oposição já ameaça com um chumbo ao documento negociado à esquerda. Um deles é bem conhecido: a redução do IVA da eletricidade consoante escalões de consumo, que já mereceu “luz verde” do Comité do IVA da União Europeia e da própria Comissão.
Por tudo isto, negociar o próximo Orçamento do Estado, ainda mais em tempo de crise, é um nó bem apertado e que vai exigir “navegação à vista” neste contexto de grande incerteza. Isto se, antes disso, não houver um outro nó para desatar: no Ministério das Finanças não se exclui a hipótese de ser necessário um novo Orçamento Suplementar no outono.
Lançar o plano de retoma para 2030
O plano de retoma da economia, desenhado por António Costa Silva a pedido do Governo, pretende colocar a Nação numa senda de recuperação voltada para o futuro. Foi, aliás, apresentado esta terça-feira aos partidos vistos como “aliados” do executivo. Há ideias para os mais variados setores, desde a energia à saúde, passando pela tecnologia, pelos portos, pela alta velocidade ferroviária e pela expansão dos metros de Lisboa e Porto.
Mas ainda falta pensar em muitos projetos concretos e, sobretudo, onde ir buscar o financiamento necessário para os colocar em marcha. Estas foram algumas das críticas levantadas ao documento, cujo conteúdo foi noticiado em primeira mão no ECO. Há ainda outras dificuldades, como a ideia de Costa Silva de explorar recursos minerais nos Açores que não está a agradar às populações e associações ambientais.
Decidir como distribuir o dinheiro da Europa
O acordo foi arrancado a ferros. Depois de cinco dias de intensas negociações no Conselho Europeu, os líderes lá se entenderam em torno de um fundo de recuperação que abrangerá a emissão de dívida conjunta pela Comissão Europeia num montante total de 750 mil milhões de euros para ajudar os Estados-membros, dos quais 390 mil milhões em subsídios e 360 mil milhões em empréstimos, bem como um quadro financeiro plurianual no valor de 1,08 biliões de euros.
Portugal terá quase 58 mil milhões de euros para executar em dez anos, mais concretamente 15,266 mil milhões em subsídios a fundo perdido e 10,8 mil milhões de euros provenientes do fundo “Próxima Geração UE”, mais 300 milhões para o segundo pilar da Política Agrícola Comum e outros 300 milhões para a coesão, e ainda um aumento de 35 milhões no financiamento para as regiões autónomas dos Açores e Madeira.
Mas o país terá de definir onde e como aplicar estes fundos comunitários, assegurando que os recursos chegam onde são mais precisos e que promovem as transformações económicas que fazem parte da ambição de Bruxelas, desde logo, a descarbonização e a digitalização da economia. Esta urgência já foi sinalizada pelo Presidente da República, que apelou a que as verbas sejam usadas “com rigor e critério”.
Tapar o buraco nas contas públicas
A pandemia gerou necessidades de financiamento do Estado inéditas. As medidas de resposta ao vírus e ao respetivo impacto na economia lançaram as contas públicas de novo para o vermelho. O Governo estima um défice de 7%, mas admite ainda rever este montante. Para tapar este buraco, o país está a reforçar a emissão de nova dívida. Em maio, a dívida pública na ótica de Maastricht, a que conta para Bruxelas, subiu 2.333 milhões de euros, para 264.379 milhões de euros, o que representa o valor mais elevado de sempre, segundo os dados do Banco de Portugal.
Agravado pelo efeito da recessão económica, o rácio de dívida face ao Produto Interno Bruto (PIB) já se situa em 120,3% e poderá atingir o recorde de 134,4%. Lidar com o forte impacto que a pandemia vai ter nas contas públicas é outro dos nós a desatar pela Nação, numa altura em que o Governo já veio descartar a hipótese de avançar com mais austeridade.
Desenhar um plano de reestruturação para a TAP
Uma coisa é haver dinheiro, outra coisa é garantir o máximo de retorno desse investimento. O Estado vai injetar até 1.200 milhões de euros na TAP, uma soma avultada, mas essencial para garantir a sobrevivência da companhia aérea portuguesa, cuja operação está significativamente reduzida devido às medidas implementadas para travar a pandemia.
Agora que David Neeleman saiu do capital da empresa, e que a Nação tem mais controlo sobre a forma como a TAP é gerida, é essencial encontrar uma nova equipa de gestão, desenhar e implementar um ambicioso plano de reestruturação. Miguel Frasquilho, chairman da empresa, já avisou que o mesmo não será “isento de dor”. Certo é que estará, também ele, dependente do ritmo da retoma que aí vier — se vier. O setor da aviação poderá não voltar a ser o mesmo e a destruição de valor que já teve lugar é permanente.
Relançar o mercado do turismo
Um estudo do Banco Central Europeu conhecido em junho concluiu que Portugal é dos países da Zona Euro mais expostos à redução das exportações no turismo devido à pandemia. O número não é despiciente: há cerca de 400 mil trabalhadores dependentes deste setor, segundo números avançados no ano passado pela ministra Ana Mendes Godinho. Mês após mês, o Instituto Nacional de Estatística vem comprovar a quase paralisação total do setor, com prejuízos avultados para serviços como o alojamento e a restauração, entre muitos outros.
Dependendo da evolução da pandemia, será necessário fomentar o relançamento de Portugal como destino turístico. Espera-se, desde já, uma tarefa hercúlea. Para já, o país está de fora da lista de corredores aéreos com o Reino Unido, retirando o Algarve dos planos de milhões de britânicos que, anualmente, lá passam as férias de verão. Agora que muitos destes cidadãos se preparam para descobrir outros destinos para além de Portugal, não é garantido que voltem quando a pandemia aliviar, pelo que é necessário um plano para voltar a pôr o destino “Portugal” no mapa.
Encontrar quem fique com a Efacec
Vista como uma joia da coroa da Nação no que toca a excelência na engenharia, o Governo decidiu não deixar cair a Efacec por causa das dificuldades judiciais atravessadas pela até aqui acionista Isabel dos Santos. A posição da empresária angolana foi nacionalizada numa altura em que a companhia estava sem acesso a financiamento, com trabalhadores em lay-off e severas dificuldades em movimentar as contas bancárias devido a um arresto.
Agora, a empresa é do Estado. Foi nacionalizada para ser vendida e Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República, quer que isso seja feito depressa. O Governo está encarregue de encontrar quem queira ficar com a Efacec, promovendo e negociando, rapidamente, a venda da empresa a um investidor que garanta a sua continuidade.
Concluir a instrução da Operação Marquês
Seis anos depois do arranque da investigação, a Operação Marquês está em fase final de instrução. É um dos vários megaprocessos nas mãos da justiça, abrangendo graves suspeitas em torno do ex-primeiro-ministro José Sócrates. Porém, no início de julho, o juiz Ivo Rosa concluiu o debate instrutório sem avançar com uma data para a leitura da decisão, pelo que não se sabe quando será anunciada a decisão do juiz de levar ou não levar Sócrates a julgamento por indícios de corrupção.
“É manifesta e humanamente impossível proferir uma decisão justa, motivada, livre e independente num prazo tão curto como é o prazo previsto na lei de dez dias”, justificou então o juiz de instrução. O dossiê tem tanto de sensível e mediático, envolvendo alegados crimes cometidos num período em que Portugal acabou por ter de pedir ajuda externa ao Fundo Monetário Internacional (FMI). A Nação exige saber se o ex-primeiro-ministro vai ou não a julgamento, uma decisão que deverá suscitar polémica, qualquer que venha a ser ela.
Leiloar as frequências para o 5G
Na era pré-Covid, 2020 era visto como o “ano do 5G”. Agora que o coronavírus trocou as voltas a tudo, o processo está manifestamente atrasado e a meta de ter duas cidades com cobertura e ofertas comerciais de quinta geração até ao fim do ano é, muito provavelmente, impossível de cumprir. Ora, depois da suspensão em março, o processo foi já retomado pela Anacom, que também já divulgou o novo calendário: começar o leilão em outubro, concluí-lo em dezembro e finalizar a atribuição dos direitos de utilização aos vencedores em janeiro ou fevereiro de 2021.
Mas se já havia discórdia entre regulador e operadoras antes da pandemia, o contexto no setor das telecomunicações é agora bem mais complexo, com a Meo a insistir que as atuais redes 4G absorveram a totalidade do aumento do tráfego provocado pelo teletrabalho. Há ainda discórdia quanto aos preços de reserva e, geralmente, em relação ao regulamento do leilão: a diferença de expectativas era já na ordem das dezenas de milhões de euros, um “gap” que, agora, será certamente superior.
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