Francisco Lacerda enfrenta “troika” em dia de reunião magna dos CTT
Uma "troika" composta por sindicatos, pequenos acionistas e analistas promete agitar a assembleia geral dos CTT. Instabilidade ressente-se na bolsa com ações dos correios a baterem no fundo.
Uma “troika” promete aquecer a assembleia geral de acionistas dos CTT CTT 0,89% que acontece esta quarta-feira em Lisboa, a partir das 10h00. À porta do Museu das Comunicações, onde se realiza o encontro, vão estar sindicatos e trabalhadores em protesto contra a degradação da empresa, exigindo a renacionalização. E não se espera que Francisco Lacerda vá ter a vida descansada dentro do edifício: é que os pequenos acionistas também não estão satisfeitos com o rumo das coisas, temem pelo futuro e vão dizer das boas à administração. Um futuro que não se avizinhará fácil, dizem os analistas, que têm esmagado as avaliações da ação. Tudo somado, a instabilidade deixa os CTT a tocar mínimos históricos na bolsa… quase todos os dias.
Quem passou no Edifício Báltico, no Parque das Nações, nos últimos dias, já pôde observar um pouco daquilo que será o protesto dos vários sindicatos do setor. Os sindicalistas montaram uma pequena tenda à porta da sede do grupo e desde o início da semana que estão a entregar panfletos a quem por lá passa, sensibilizando a população para aquilo que consideram ser a deterioração do serviço e das condições do operador postal português.
Mas o ponto alto será mesmo esta quarta-feira, quando os acionistas se reunirem na Museu das Telecomunicações, no Cais do Sodré, para aprovarem uma queda histórica do lucro, metade daquilo que os CTT vão dar em dividendos. Aí o protesto vai subir de tom.
“As razões desta ação são aquelas que temos vindo a dizer: contestamos a privatização e a vergonha que é a empresa estar a oferecer migalhas aos trabalhadores e estar a oferecer mais do que os lucros que teve aos acionistas”, diz ao ECO Eduardo Rito, do Sindicato Nacional dos Trabalhadores dos Correios e Telecomunicações (SNTCT).
E nem os representantes dos trabalhadores vão faltar à manifestação conjunta do SNTCT, SINDELTELCO, SINCOR e SINTAV. A comissão de trabalhadores partilha algumas das reivindicações dos sindicatos: uma desajustada partilha de lucros com os acionistas, condições de trabalho em degradação, a falta de trabalhadores e o fecho de lojas, tudo fatores que estão a contribuir para a queda na qualidade do serviço prestado aos clientes.
As razões desta ação são aquelas que temos vindo a dizer: contestamos a privatização e a vergonha que é a empresa estar a oferecer migalhas aos trabalhadores e estar a oferecer mais do que os lucros que teve aos acionistas.
Pequenos acionistas ganham músculo
Lá dentro, os pequenos acionistas também se vão fazer ouvir. E têm várias reprimendas a dar a Francisco Lacerda, que justificou a quebra de 56% dos resultados dos CTT em 2017 com o abrandamento da atividade postal.
“Os acionistas não podem admitir que os resultados dependam dos bons ventos ou dos maus ventos que assolam o negócio dos serviços postais, o negócio dos serviços financeiros ou o negócio do expresso e encomendas”, reclama Gonçalo Sequeira Braga, um dos promotores do grupo de pequenos investidores dos CTT que se formou nos últimos meses para contestar a gestão da empresa.
Sequeira Braga será um dos pequenos acionistas que vai querer tomar a palavra na assembleia geral. “Vai ser a oportunidade de mostrar aos investidores institucionais que os pequenos investidores também têm uma visão estratégica para o desenvolvimento dos CTT. Se os acionistas aprovam ou não aquilo que temos para propor, logo veremos”, adianta, antevendo um encontro histórico “porque vai permitir tomar decisões de mudanças históricas”. Quais decisões?
“Os acionistas serão os primeiros a saber”, diz Sequeira Braga, sem abrir o jogo.
A assembleia geral de acionistas vai ser a oportunidade de mostrar aos investidores institucionais que os pequenos investidores também têm uma visão estratégica para o desenvolvimento dos CTT. Se os acionistas aprovam ou não aquilo que temos para propor, logo veremos.
“Uma missão difícil”, dizem analistas
Se os pequenos têm coisas a dizer, mesmo entre os grandes acionistas há enorme desconforto com os últimos acontecimentos na empresa. É o caso de Manuel Champalimaud, fundador da Gestmin e maior acionista dos CTT com 12%: “Ou os CTT se modificam ou desaparecem”, disse Champalimaud, que vai acompanhar de perto o plano de reestruturação para contornar a situação de emergência na empresa.
É, de resto, neste estado de emergência que as ações dos CTT têm protagonizado o pior desempenho na bolsa de Lisboa este ano: afundam 14% em 2018 para mínimos desde que foram para a bolsa, em dezembro de 2013. Ainda esta terça-feira voltou a bater no fundo.
Cientes das dificuldades que ainda estão por vir, foram vários os bancos de investimento e analistas que cortaram o preço alvo dos títulos dos CTT nos últimos meses. O último banco a fazê-lo foi o CaixaBI, na passada sexta-feira: esmagou a avaliação das ações em mais de um terço e o título da nota de research por demais elucidativo em relação aos desafios que o operador enfrenta: “Missão difícil pela frente”.
“Os números do quarto trimestre saíram melhor do que esperado (…) mas o cenário geral da empresa mantém-se: os CTT operam num ambiente difícil e estão sujeitos a vários riscos, nomeadamente em relação à evolução dos volumes de Correio e dos Serviços Financeiros“, frisou a equipa do banco de investimento.
E questionaram-se: “A história de investimento dos CTT costumava ser bastante claro até ao dia em que a empresa apresentou o Plano de Transformação Operacional. Mas, e agora?” Terão hoje a palavra Lacerda e a “troika”.
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