Banca: Dos erros do passado à prudência do presente
A banca cometeu erros e respondeu a incentivos no financiamento às empresas. Agora, dizem os gestores, há prudência e a aposta nos bens transacionáveis.
Vários nomes de peso da banca nacional estiveram esta quarta-feira em Braga, num painel sobre investimento que contou com a participação do ex-ministro da Economia, Carlos Tavares, do presidente do BCP Capital, Pedro Reis, do administrador da CGD, Francisco Cary, e de Vítor Fernandes, administrador do Novo Banco. Entre as conclusões, a ideia de que a estrutura da economia portuguesa está a mudar, tal como o financiamento e a gestão de risco.
Carlos Tavares foi o primeiro a intervir, tendo traçado um perfil da economia portuguesa e do crédito ao longo dos últimos anos. Relembrou como a rede bancária nacional evoluiu ao longo do tempo, tendo culminado em 2010 num dos “maiores rácios da Europa de balcões por habitante e ATMs por habitante”. Que crescimento foi este? Que crédito foi este? “Vemos que, entre 1998 e 2015, o crédito expandiu-se nos setores não transacionáveis. São bens necessários mas que, numa economia aberta como a portuguesa, não a sustentam por si só”, indicou.
"Vemos que, entre 1998 e 2015, o crédito expandiu-se nos setores não transacionáveis. São bens necessários mas que, numa economia aberta como a portuguesa, não a sustentam por si só.”
Sobre isso, Carlos Tavares acrescentou ainda: “Temos de entender que a procura do investimento se tenha dirigido para os setores que tinham maiores margens no curto prazo, que eram os não transacionáveis, dirigidos ao mercado interno.” Mais à frente, sublinhou que isso também se deveu a fatores de política regulatória e económica, esta última a virar “muitos recursos para o setor não transacionável da economia”. E terminou a apresentação com um alerta: “É preciso que [os bancos] ajudem as empresas a crescer por vias alternativas que não sejam a dívida. Mais capital, menos dívida. Caso contrário, teremos dificuldade em manter empresas no setor transacionável que sejam fortes.”
Fernando Alexandre, pró-reitor da Universidade do Minho, concordou que “houve muito investimento e mal direcionado” nos últimos anos. “Durante muitos anos, arranjámos desculpas para termos deixado de crescer depois de 2000. Procurámos lá fora um conjunto de razões para não crescermos, como se fizéssemos tudo bem, mas não crescíamos por estarmos no mundo errado”, rematou. Mas não deixou a plateia sem uma justificação: “Deixámos de crescer porque tínhamos uma estrutura setorial assente nos bens não transacionáveis que teve bons resultados durante muito tempo, mas que acabou no ano 2000.”
O académico recordou que, no início do milénio, houve “um conjunto de setores” que começou a cair — como o da construção –, produzindo em oito anos qualquer coisa como 300.000 desempregados. E falou de problemas de eleitoralismo: “O incentivo que quem tem eleições em dois anos tem para não deixar cair esse setor é enorme. Era quase impossível ganhar eleições pondo as políticas a apontarem para setores que ainda eram muito pequenos. Mas eram o futuro”, sublinhou.
Depois, foi a vez de Vitor Fernandes, do Novo Banco, reconhecer que “a banca cometeu muitos erros”. Disse que Portugal é um país que “não cresce” desde 2000. Mas deu outra perspetiva, referindo que “a generalidade da banca portuguesa financia, neste momento, bens transacionáveis”. “Do ponto de vista do risco, a banca hoje é muito mais prudente ao nível da gestão”, rematou.
Do ponto de vista do risco, a banca hoje é muito mais prudente ao nível da gestão.
Pedro Reis, do BCP Capital, falou do caso do banco liderado por Nuno Amado para indicar que “o BCP reencontrou a sua estabilidade”. “Tem uma base portuguesa, mas quer sobretudo apoiar as empresas exportadoras e a internacionalização da economia”, disse. Acrescentou ainda: “Se acreditarmos que a chave da internacionalização é a dimensão, e que a dimensão/escala implica capital”, é necessário que a banca assegure “o apoio do financiamento e o apoio na sua capitalização”.
O banqueiro indicou ainda que “é sempre mais fácil recorrer ao financiamento do que ao capital”. “Temos de ser frontais nisso: há todo um caminho a percorrer. Quando se fala em capital de risco, temos visto, a perceção é que o capital de risco é visto como um equity loan. Eu não estou a limitar sequer ao papel dos bancos. Há outros players até ao nível de private equity no mercado. Mas não tenho muitas dúvidas de que se queremos apoiar o crescimento sustentável das empresas, temos de nos focar na capitalização. O financiamento não pode ser tudo. Os bancos devem estar à altura dos desafios que se impõem as empresas”, defendeu Pedro Reis.
"Não tenho muitas dúvidas de que se queremos apoiar o crescimento sustentável das empresas, temos de nos focar na capitalização. O financiamento não pode ser tudo.”
Em representação da CGD esteve Francisco Cary. Confrontado com as declarações de Paulo Macedo, em que o gestor do banco público indicava que a banca tem excesso de liquidez, o administrador discordou: “Correndo o risco de contrariar o meu presidente, acho que nunca há excesso de liquidez num banco.” Mais à frente no painel, e falando do setor empresarial, indicou que este é “um período circunstancial” em que as empresas se transformam, acumulam liquidez e até capacidade de investimento. “Se calhar [até] há oferta de crédito a mais. [Mas] está na altura de os empresários aproveitarem estas circunstâncias. Não é garantido que tudo vá correr bem, mas a tendência é essa”, concluiu Francisco Cury.
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