Governo admite que app StayAway Covid não funcionou em Portugal
O ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, um dos primeiros governantes a ver o protótipo da aplicação de rastreio de casos de Covid-19, admite que o "contact tracing" não funcionou no país.
O ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, considerou esta quarta-feira que se devem “tirar ilações sobre como sistemas como a StayAway Covid não funcionaram em Portugal, mas funcionaram em países” como a Suíça e a Alemanha. O governante referia-se às aplicações móveis de rastreio de potenciais contactos com pessoas infetadas com Covid-19, concretamente a aplicação portuguesa desenvolvida pelo INESC TEC e que veio a ser adotada pelo Estado.
Numa intervenção no 30.º congresso da Associação Portuguesa para o Desenvolvimento das Comunicações (APDC), colocando este fator na lista do que disse serem “lições da pandemia”, esta foi a primeira vez que um governante reconheceu publicamente que a aplicação portuguesa, apesar de funcionar tecnicamente, não registou a adesão esperada, tornando-a virtualmente ineficaz, como vinham a indiciar as estatísticas sobre a sua utilização.
No ano passado, o primeiro-ministro, António Costa, considerou tornar obrigatória a instalação da aplicação StayAway Covid, gerando uma onda de críticas que acabou por inviabilizar a medida. A instalação chegou mesmo a ser considerada pelo líder do Governo como um “dever cívico”. Mas, recentemente, os apelos à instalação da app passaram a estar ausentes das conferências de imprensa do Executivo para apresentação de medidas por causa da pandemia.
As palavras de Manuel Heitor são particularmente relevantes, na medida em que foi um dos primeiros governantes a ver o protótipo do INESC TEC no ano passado, tinha a pandemia chegado há pouco tempo ao país. O ministro reconheceu também que o instituto conseguiu desenvolver a StayAway Covid, uma “aplicação ao melhor nível do que se faz noutros países”, graças a “conhecimento acumulado ao longo dos anos”. Mas admitiu também a “complexidade da utilização das ferramentas do digital”.
“No caso da StayAway Covid, a sua relação com o dia-a-dia dos médicos e a operacionalização pelo próprio Serviço Nacional de Saúde é uma relação complexa. A espontaneidade e voluntarismo dos que se dedicaram ao desenvolvimento de uma app particularmente potente tem de ser cada vez mais compreendida num quadro complexo, sem as quais nunca estaremos aptos a ganhar as oportunidades da transição digital”, apontou.
Henrique Barros: “Temos de voltar à aplicação”
No mesmo congresso, o epidemiologista Henrique Barros, presidente do Conselho Nacional de Saúde apelou à necessidade de os portugueses voltarem a instalar e a usar a StayAway Covid: “Temos de voltar à aplicação. A aplicação tem de voltar”, apontou.
“A aplicação tem de ter um papel. Os profissionais de saúde não podem ser, eles próprios, indutores de dificuldades”, rematou o epidemiologista, que é também presidente do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), uma das entidades parceiras da StayAway Covid.
A aplicação recorre a um sistema por Bluetooth para avisar um utilizador, de forma totalmente anónima, se este tiver estado perto de uma pessoa entretanto diagnosticada com Covid-19. Mas a eficácia depende da emissão de um código que permite ao doente marcar-se como infetado e que é de utilização voluntária.
Não só muitos códigos gerados acabaram por expirar sem serem introduzidos na app como a grande maioria dos casos confirmados de Covid-19 nem sequer resultaram num código para a referida marcação. Aquando do lançamento da app ao público, houve inclusivamente queixas de doentes que não sabiam como obter o código junto das autoridades de saúde, bem como de médicos.
A 19 de janeiro de 2021, foi noticiado que, em quatro meses de funcionamento, foram gerados 12 mil códigos de casos positivos num universo de mais de meio milhão de infeções. Destes, apenas 2.804 tinham sido introduzidos na aplicação. Ainda assim, a ferramenta alcançou a ter perto de três milhões de downloads e emitiu vários avisos, podendo ter prevenido contágios, embora em dimensão difícil de estimar.
O desenvolvimento da app custou “perto de 400 mil euros”, inicialmente pagos com capitais próprios do INESC TEC, disse ao ECO, em setembro, o administrador do instituto, Rui Oliveira. Mais recentemente, o investimento foi reembolsado ao INESC TEC na totalidade pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), explicou o próprio.
(Notícia atualizada pela última vez às 14h47)
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