Os pontos mais quentes (e os consensos) na votação da lei da Uber
O Parlamento vota esta quinta-feira, ponto por ponto, aquela que deverá ser a lei que regulamentará plataformas como a Uber, Cabify e Taxify. Conheça os fatores de discórdia. E os consensos.
É esta quinta-feira que os deputados da Comissão de Economia vão votar, ponto por ponto, a nova regulamentação para as plataformas eletrónicas de transporte privado. Há vários anos que a Uber opera em Portugal e, desde a chegada da empresa a Lisboa, várias alternativas se lançaram no mercado português. O problema foi sempre a falta de regulamentação desta atividade, pois concorre diretamente com o setor do táxi e é uma matéria sensível que esteve largos meses parada no Parlamento.
Os pontos mais polémicos:
- Contingentação: Enquanto a esquerda parlamentar exige que haja um contingente para limitar o número de automóveis ao serviço destas plataformas, o Governo e a direita não veem necessidade de haver essa limitação. Esta é uma das linhas vermelhas para os taxistas e promete ser dos pontos mais quentes em discussão.
- Formação: É outro artigo que promete fazer aquecer a votação. O CDS quer uma formação de 80 horas para os motoristas, enquanto o Governo e o PSD sugerem algo mais reduzido: apenas 50 horas. A esquerda quer que os motoristas tenham formação igual à dos taxistas, com o PCP a exigir mesmo que os motoristas tenham “certificado de motorista de táxi”.
- Identificação: As propostas do Governo e da direita pretendem que os automóveis ao serviço das plataformas não tenham qualquer tipo de identificação como tal. No entanto, PCP e BE querem criar um dístico para que estes veículos sejam facilmente identificáveis como tal.
- Pagamentos: Os pagamentos neste tipo de plataformas processam-se de forma digital. Mas enquanto a esquerda entende que o cidadão deve ter o direito de poder pagar o serviço em dinheiro, a direita prefere não mexer neste aspeto e quer pagamentos exclusivamente digitais.
- Tarifas dinâmicas: Ao contrário da generalidade das bancadas, os comunistas não querem que as aplicações possam subir preços em função da procura e pedem a fixação de preços numa tabela homologada por despacho. PSD, CDS, BE e Governo pretendem que as plataformas tenham liberdade para definir as tarifas.
Votação vai ser complexa
A reunião irá realizar-se após plenário e, em cima da mesa, estarão seis propostas. Uma é a proposta do Governo. Seguem-se-lhe as propostas de lei ou de alteração por parte do PS, PSD, CDS, PCP e BE. A votação é uma tarefa que se adivinha complexa, com as diferentes alas parlamentares a terem posturas relativamente diferentes e com linhas vermelhas de parte a parte.
Uma matéria que a esquerda não deixa cair é a questão da contingentação. BE e PCP não querem que as plataformas eletrónicas possam aceitar novos automóveis de forma ilimitada, algo que é também exigido pelos taxistas, sob pena de agendarem novas ações de protesto. Por exemplo, os comunistas pretendem que os automóveis ao serviço de aplicações como a Uber estejam “sujeitos a uma licença municipal, a qual é atribuída dentro do contingente fixado para o serviço de transporte de táxi, mediante concurso público aberto pela Câmara Municipal competente”. Já os bloquistas pretendem que estes veículos “estejam sujeitos a licença a emitir pelas câmaras municipais” e sejam “averbados” a um alvará emitido pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT).
O PCP quer ainda que os motoristas ao serviço das plataformas eletrónicas aceitem pagamentos em dinheiro. A avançar, seria uma alteração bastante significativa na forma como este tipo de atividade é feita atualmente, pois a generalidade dos pagamentos é feita com cartão de crédito. Em contrapartida, CDS e PSD querem pagamentos exclusivamente digitais, com os social-democratas a serem pragmáticos neste ponto: não é permitido o “pagamento em numerário”, lê-se num quadro comparativo das diferentes propostas, a que o ECO teve acesso.
O quadro inclui a proposta do CDS, que só recentemente foi conhecida. Entre as novidades trazidas pelos centristas para o debate está a intenção de obrigar as plataformas a permitirem que um cliente peça “um veículo capaz de transportar passageiros com mobilidade reduzida”. Estes veículos adaptados terão de estar disponíveis com um tempo de espera para o cliente nunca superior a 15 minutos.
Da parte do Governo surge a obrigação de os motoristas fazerem um “curso de formação” válido “pelo período de cinco anos” e que “deve ter uma carga horária de 50 horas”, integrando “módulos relativos a comunicação e relações interpessoais, normas legais de condução, técnicas de condução, regulamentação da atividade, situações de emergência e primeiros socorros”. O PSD concorda com o número de horas, enquanto o PS pede que a “carga horária” seja definida “por portaria do membro do Governo competente”. Uma novidade aqui é que o CDS entende que a formação “deve ter uma carga horária de 80 horas”, mais do que o que estava em cima da mesa até aqui. Para o PSD e CDS, todos os motoristas deverão ter, posteriormente, um “número único de motorista”, independentemente das plataformas para as quais trabalhe.
Mas a ala mais à esquerda tem uma ideia diferente para o acesso à profissão de motorista ao serviço de plataformas como a Uber. O BE propõe que os motoristas tenham um “título profissional de motorista de transporte individual de passageiros em veículos ligeiros tipo táxi ou descaracterizados, designado de certificado de motorista de transporte”. O PCP vai mais longe e nivela pela base: quer que todos tenham um “certificado de motorista de táxi”, como os taxistas. A esquerda parlamentar pretende ainda que os automóveis ao serviço de plataformas como a Uber tenham um dístico identificativo. Para os comunistas, esta identificação deve estar “no vidro traseiro e dianteiro, com uma dimensão mínima de 11 por 40 centímetros”.
As propostas versam ainda sobre os preços. É comum este tipo de serviços recorrer a algoritmos que aumentam os valores cobrados em momentos de grande procura. Particularmente, esta é uma matéria que afasta os comunistas dos bloquistas: PCP quer preços homologados por despacho, sem essas tarifas dinâmicas. Já o BE, PSD, CDS e Governo pretendem a livre fixação de preços e tarifas dinâmicas, enquanto o PSD antecipa também o limite de 25% na comissão cobrada pela plataforma. Um último ponto de discórdia afasta, desta vez, os social-democratas das outras bancadas: o PSD não quer o atual sistema de avaliação dos motoristas, enquanto os restantes partidos querem que as avaliações continuem a ser feitas.
Apesar de tudo, há pontos que geram consenso entre os partidos. Um deles é que os automóveis usados só poderão ter até nove lugares e deverão ter menos de sete anos. Deverão ainda ter seguro de responsabilidade civil que abranja também os “passageiros transportados e respetivos prejuízos”. Se os deputados conseguirem fechar a votação na especialidade esta quinta-feira, fica aberto o caminho para que a lei das plataformas como a Uber, a Cabify e a Taxify seja finalmente votada na generalidade. Pode acontecer já na semana que vem, a 2 de março, como avançou o ECO esta semana.
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